domingo, 30 de janeiro de 2022

FRIEDRICH ENGELS - O SEGUNDO VIOLINO

 



“Eu sempre fui o segundo violino”, disse Engels em carta a um amigo (J. Becker), referindo-se à sua importância quanto à elaboração da teoria do socialismo científico. Assim era ele: modesto, simples, sempre disposto a reconhecer o mérito das outras pessoas e a fugir das homenagens.



Com o mesmo nome do pai, Friedrich Engels, filho de Elizabeth Franziska, nasceu no dia 28 de novembro de 1820, em Barmem, reino da Prússia, que depois comporia a Alemanha unificada. Dedicou-se aos estudos, e sempre foi um aluno brilhante, queria cursar Direito e Economia, mas o pai, empresário próspero, tinha outro plano – queria que ele lhe sucedesse nos negócios e, para isso, obrigou-o a deixar a escola.

Encaminhado para uma fábrica da família em Manchester, Inglaterra, Engels, que já se posicionava a favor da liberdade, contrário à tirania e à opressão, passou a conviver com a realidade dos operários. “Abandonei a sociedade, os banquetes e a champanha da burguesia e dediquei minhas horas livres ao contato com verdadeiros operários, tratando da vida real”. Essa convivência produziu “A Situação da Classe Operária na Inglaterra”, que “constitui uma terrível acusação contra o capitalismo e a burguesia; é a obra que melhor representa a situação do proletariado contemporâneo (…). Nem antes de 1845 nem depois se fez uma descrição tão brilhante e verdadeira dos sofrimentos da classe operária” (Lênin).



Na Inglaterra, Engels conheceu o movimento autogestionário, participou de reuniões com Robert Owen, seu maior expoente, e escreveu nos seus jornais, procurando mostrar sempre o posicionamento dos socialistas utópicos franceses, como Saint Simon e Charles Fourier, entre outros. Lia muito e simpatizava com os artigos de um jovem alemão, Karl Marx. Este também se entusiasmou ao conhecer um trabalho de Engels, escrito aos 20 anos, intitulado “Esboço de Uma Crítica da Economia Política”.



Em setembro de 1844, os dois se encontraram em Paris, nascendo uma parceria de importância inigualável para o proletariado de todo o planeta”. (…) o proletariado europeu tem o direito de afirmar que a sua teoria foi criada por dois cientistas e combatentes cujas relações mútuas superam todas as comoventes lendas antigas acerca da amizade entre os homens”.

O primeiro trabalho conjunto foi “A Sagrada Família”, denominação irônica que deram a dois filósofos alemães, os irmãos Bauer e seus discípulos. Eles consideravam o proletariado como massa desprovida de espírito crítico. Engels e Marx responderam que o proletariado é que conduz em si o futuro e será o artífice da própria libertação e da libertação de toda a humanidade.



De 1845 a 1847, Engels viveu em Bruxelas e Paris, dedicando-se ao estudo e à militância. Ele e Marx entraram em contato com uma associação secreta denominada Liga dos Comunistas. Os componentes da Liga pediram para que os dois companheiros dessem uma concatenação às idéias esboçadas. Surgiu o célebre Manifesto Comunista, publicado em 1848.



Em 1848, estoura uma revolução popular na França, que se espalhou por toda a Europa Ocidental. Marx e Engels voltaram para a Alemanha, dispostos a pegar em armas. Marx foi logo preso e expulso e Engels se engajou, combatendo em quatro batalhas. “Todos que o viram sob o fogo falam de seu excepcional sangue frio e absoluto desprezo pelo perigo” (Eleanor Marx).

Com a derrota da insurreição, Engels voltou a trabalhar na fábrica do pai em Manchester, para ajudar os exilados, inclusive a família de Marx. “Foi o seu cativeiro egípcio”, dizia Marx, referindo-se à escravização do povo hebreu no Egito relatada pela Bíblia. No tempo livre, dedicava-se ao estudo das ciências da natureza e da sociedade, ao acompanhamento e análise da conjuntura internacional e escrevia para jornais democráticos e de esquerda de vários países.

Engels foi o primeiro teórico socialista a especializar-se em assuntos militares, convencido que era de que o domínio da estratégia e da tática militares seria de vital importância para o sucesso da revolução proletária. Trata do assunto em “A Guerra dos Camponeses na Alemanha”, “O Pó e o Reno” (sobre a luta pela unificação da Itália), “A Questão Militar na Prússia” e O “Partido Operário Alemão”, e “Notas sobre a Guerra”, em que analisa a experiência da Comuna de Paris.



Engels libertou-se do “cativeiro egípcio” no segundo semestre de 1870, quando se mudou para Londres e pouco após sua chegada, 4 de setembro, foi eleito para o Conselho Geral da Associação Internacional de Trabalhadores (I Internacional). A década seguinte foi de intensa luta ideológica. Primeiro, no combate ao anarquismo no interior da Internacional, que culminou com a expulsão dos bakuninistas; a seguir, contra o reformismo liderado por Lassalle no Partido Proletário alemão. No campo do reformismo, E.K.Dühring, professor da Universidade de Berlim lançou a proposta de “um novo comunismo”, que se construiria sem luta de classes. O “Anti-Dühring”, escrito com a colaboração de Marx, não se limita a responder ao professor. É uma exposição sistemática do materialismo histórico e dialético e apresenta um balanço da evolução das ciências da natureza. Mostra o funcionamento das leis da dialética na natureza e na sociedade.



Em março de 1871, o proletariado parisiense toma o poder e convoca a população para construir a nova sociedade, anunciando as primeiras medidas nesse caminho. Algumas províncias se levantam no interior, mas são logo sufocadas. O exército burguês se reorganiza e se alia com seu arquiinimigo até então, os invasores alemães, para retomar o domínio econômico e político. Em maio, depois de heróicos e sangrentos combates, a Comuna é derrotada. Desde o início da luta, Engels interveio no Conselho Geral da Internacional, no sentido de dar todo o apoio aos comuneiros dos quais, muitos, inclusive, eram filiados à organização. O apoio efetivamente aconteceu, tanto no período da luta como depois, com ajuda aos exilados e denúncia em todo o mundo da repressão feroz e do genocídio praticado contra os operários de Paris e suas famílias.



Engels deu uma contribuição própria à teoria do socialismo científico, que foi a de estender à natureza a concepção materialista da dialética, uma vez que Marx se dedicou ao ser social. A contribuição engelsiana conferiu ao marxismo o caráter de filosofia, dada a generalização metodológica e teórica, contendo uma concepção de mundo, não apenas da sociedade.

Os seus últimos 12 anos de vida, Engels dedicou-os à edição dos segundo e terceiro volumes de “O Capital”. Ao morrer, no dia 14 de março de 1883, Karl Marx tinha concluído apenas o I volume. Deixou anotações sem ordem, e Engels, o único capaz de empreendimento tão arrojado, dedicou-se a decifrar a letra do companheiro, apreender a essência do seu pensamento, concatenar as idéias e dar uma estrutura lógica, o mais próxima possível do modo de Marx expressá-las.



Mas não foi a única tarefa que o velho amigo deixou. Engels passou a orientar o movimento operário europeu, respondendo a consultas sobre método, problemas localizados, criticando e estimulando camaradas.

E nunca abandonou a condição de cientista social. A partir das pesquisas antropológicas de H. Morgan, lidas e anotadas por Marx, formulou a teoria marxista do Estado, na obra “A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado”, cujos pressupostos já estavam em sua obra anterior e na de Marx, mas não de forma sistêmica e embasada na história e na antropologia.



Seu último trabalho (1895) foi o prefácio à reedição de “As Lutas de Classe na França”, de Karl Marx .Nele, Engels faz considerações sobre o desenvolvimento da luta de classes e situa, pela primeira vez na teoria marxista, a distinção entre guerra de movimento e guerra de posições.



No dia 5 de agosto de 1895, vitimado por um câncer no esôfago, falece Engels. Nos seus funerais, Wilhelm Liebknecht, líder operário, discursou: “Nele, teoria e prática se fundiram num todo único”. Presentes, atendendo ao seu pedido, apenas alguns parentes e amigos. Um grupo menor ainda, no qual estava Eleanor, filha caçula de Marx, atendeu a outro desejo, lançando as cinzas do seu cadáver no mar de Eastbourne, a duas milhas da costa.



Segundo Lênin, Engels foi “depois de Marx, o mais notável sábio e mestre do proletariado contemporâneo”. Ele próprio se dizia o “segundo violino”. Na verdade, ambos foram fundadores, construtores do socialismo científico e mestres do proletariado. O seu maior mérito foi demonstrar que o socialismo não é uma invenção de sonhadores, mas “resultado inevitável do desenvolvimento das forças produtivas da sociedade atual”. Mas esse resultado não brota espontaneamente, advindo da luta das classes sociais – burguesia e proletariado – que estão em lados contrários ante as forças produtivas. Uma obra comum. Um só violino a enlevar a orquestra revolucionária do proletariado na senda da emancipação.



Alves, Luiz. Site Jornal A Verdade. Disponível em: https://averdade.org.br/2012/04/biografia-de-friedrich-engels-nele-teoria-e-pratica-se-fundiram-num-todo-unico/. Acesso em 30 de jan. 2020.


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