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terça-feira, 21 de junho de 2022

QUATRO CONCEITOS FILOSÓFICOS

 

INTELECTO

(do latim: intellectus, de intelligere: compreender)

         1. Na concepção clássica grega, a partir de Anaxágoras, o intelecto (nous) significa o princípio de ordenação do cosmo e, por extensão, a faculdade do pensamento humano, enquanto esta reflete a ordem cósmica. Distingue-se assim das sensações e dos desejos e apetites, sendo, pois, "a parte da alma com a qual esta conhece e pensa" (Aristóteles).


         2. A escolástica medieval, sobretudo com Tomás de Aquino. Desenvolve o conceito aristotélico de intelecto, definindo-o como faculdade do entendimento humano, do pensamento conceitual, de pensar por idéias gerais.


         3. Intelecto agente ou ativo (intellectus agens): segundo a tradição aristotélica e escolástica, trata-se do intelecto como agente, isto é, transformando as sensações em percepções e tornando-as abstratas, inteligíveis, como conceitos. Daí a fórmula "Nada está no intelecto que não tenha estado antes nos sentidos". Na tradição agostiniana, especificamente, o intelecto agente é interpretado corno a Luz Divina, a iluminação, que caracteriza nosso entendimento e torna possível o conhecimento humano.

         4. Intelecto paciente ou passivo (intellectus patiens): segundo a tradição aristotélica e escolástica, o intelecto passivo opõe-se ao ativo, sendo considerado como a capacidade de receber e ordenar os conceitos e idéias que resultam do processo de abstração realizado pelo intelecto agente.

         5. Os modernos preferem falar de entendimento.

 

REFLEXÃO CRÍTICA

Reflexão (do latim tardio: reflexivo)

         1. Em um sentido amplo, tomada de consciência, exame, análise dos fundamentos ou das razões de algo.

         2. Ação de introspecção pela qual o pensamento volta-se sobre si mesmo, que investiga a si mesmo, examinando a natureza de sua própria atividade e estabelecendo os princípios que a fundamentam. Caracteriza assim a consciência crítica, isto é, a consciência na medida em que examina sua própria constituição, seus próprios pressupostos. "A consciência reflexiva torna a consciência refletida como seu objeto" (Sartre). O argumento cartesiano do cogito (penso, logo existo) é o exemplo clássico de reflexão filosófica. 


Crítica ( do grego - kritiké: arte de julgar)

         1. Juízo apreciativo, seja do ponto de vista estético (obra de arte), seja do ponto de vista lógico (raciocino), seja do ponto de vista intelectual (filosófico ou científico), seja do ponto de vista de uma concepção, de uma teoria, de uma experiência ou de uma conduta.

         2. Atitude de espírito que não admite nenhuma afirmação sem reconhecer sua legitimidade racional. Difere do espirito crítico, ou seja, da atitude de espírito negativa que procura denegrir ostensivamente as opiniões ou as ações das outras pessoas.

         3. Na filosofia, a crítica possui o sentido de análise. Assim, a filosofia crítica designa o pensamento de Kant e de seus sucessores. Suas três obras principais se intitulam: Crítica da Razão Pura, Crítica da Razão Prática e Crítica do Juízo. Nessas obras, a palavra "crítica" tem o sentido de "exame de valor". Do uso kantiano da palavra “critica”, deriva o termo ‘‘criticismo” que designa a filosofia de Kant.

 

FILOSOFIA


         É difícil dar-se uma definição genérica de filosofia, já que esta varia não só quanto a cada filósofo ou corrente filosófica, mas também em relação a cada período histórico. Atribui-se a Pitágoras a distinção entre a sophia, o saber, e a philosophia, que seria a "amizade ao saber", a busca do saber. Com isso se estabeleceu, já desde sua origem, uma diferença de natureza entre a ciência, enquanto saber específico, conhecimento sobre um domínio do real, e a filosofia que teria um caráter mais geral, mais abstrato, mais reflexivo, no sentido da busca dos princípios que tornam possível o próprio saber. No entanto, no desenvolvimento da tradição filosófica, o termo "filosofia" foi frequentemente usado para designar a totalidade do saber, a ciência em geral, sendo a metafísica a ciência dos primeiros princípios, estabelecendo os fundamentos dos demais saberes. O período medieval foi marcado pelas sucessivas tentativas de conciliação entre razão e fé, entre a filosofia e os dogmas da religião revelada, passando a filosofia a ser considerada ancilla theologiae, a serva da teologia, na medida em que fornecia as bases racionais e argumentativas para a construção de um sistema teológico, sem, contudo, poder questionar a própria fé. O pensamento moderno recupera o sentido da filosofia como investigação dos primeiros princípios, tendo, portanto um papel de fundamento da ciência e de justificação da ação humana. A filosofia crítica, principalmente a partir do Iluminismo, vai atribuir à filosofia exatamente esse papel de investigação de pressupostos, de consciência de limites, de crítica da ciência e da cultura. Pode-se supor que essa concepção, mais contemporânea, tem raízes no ceticismo, que, ao duvidar da possibilidade da ciência e do conhecimento, atribuiu à filosofia um papel quase que exclusivamente questionados. Na filosofia contemporânea, encontramos assim, ainda que em diferentes correntes e perspectivas, um sentido de filosofia como investigação crítica, situando-se, portanto em um nível essencialmente distinto do da ciência, embora intimamente relacionado a esta, já que descobertas científicas muitas vezes suscitam  questões e reflexões filosóficas e frequentemente problematizam teorias científicas. Essa relação reflexiva entre a filosofia e os outros campos do saber fica clara, sobretudo nas chamadas "filosofia de": filosofia da ciência, filosofia da arte, filosofia da história, filosofia da educação, filosofia da matemática, filosofia do direito, etc.

 


CIDADANIA

         Cidadania é a prática dos direitos e deveres de um(a) indivíduo (pessoa) em um Estado. Os direitos e deveres de um cidadão devem andar sempre juntos, uma vez que o direito de um cidadão implica necessariamente numa obrigação de outro cidadão. Conjunto de direitos, meios, recursos e práticas que dá à pessoa a possibilidade de participar ativamente da vida e do governo de seu povo.



segunda-feira, 30 de maio de 2022

BURGUESIA X PROLETARIADO

 



Nota de Engels no Manifesto Comunista (1888)





Extraído de:

MARX, Karl & ENGELS, Friedrick. The Communist Manifesto. Ed. by Samuel H. Beer. Appleton-Century-Crofts, Inc. New York, 1955.


         No Manifesto Comunista, Marx & Engels, depois de demonstrar que o espectro do comunismo rondava pela Europa, iniciam a parte seguinte como tema Burguesia e Proletariado. E Engels de forma monumental em sua Introdução à Edição Inglesa de 1888, conceitua de forma definitiva o que é burguesia e o que é proletariado. Dando corretamente o nome aos bois: "Em francês, burguês significa citadino" - daí advindo cidadão, cidadania. e " Por 'burguesia' entende-se a classe dos capitalistas modernos, proprietários dos meios de produção social e empregadores do trabalho assalariado; logo em seguida "por 'proletariado', entende-se a classe dos trabalhadores assalariados modernos que, não tendo meios de produção próprios, são reduzidos a vender sua força de trabalho para viver."

¹ In French bourgeois means a town-dweller. “Proletarian” comes from the latin, proletarius, wich meant a person whose sole wealth was offspring (proles).

¹ Em francês, burguês significa citadino. “Proletário” vem do latim, proletarius, que significava uma pessoa cuja única riqueza era a prole (proles).

[Note by Engels] By “bourgeoisie” is meant the class of modern capitalist, owners of the means of social production and employers of wage-labor;

[Nota de Engels] Por “burguesia” entende-se a classe dos capitalistas modernos, proprietários dos meios de produção social e empregadores do trabalho assalariado;

by “proletariat”, the class of modern wage-labores Who, having no means of production of their own, are reduced to selling their labor power in order to live.

por “proletariado”, entende-se a classe dos trabalhadores assalariados modernos que, não tendo meios de produção próprios, são reduzidos a vender sua força de trabalho para viver.

          Essa conceituação nos demonstra que:

A BURGUESIA – é a classe social da sociedade capitalista (não de outra, mas só e somente só da sociedade capitalista). Capitalistas Modernos – reforça que o capitalismo surgiu nos tempos modernos da história (1453 – 1789) e desenvolveu-se pela história contemporânea, demonstra também que a burguesia embora anterior ao capitalismo é a classe que o implementa e por isso é inicialmente revolucionária e extremamente reacionária quando atinge seus objetivos.

A BURGUESIA – classe detentora (dona, proprietária) dos meios de produção, que nada mais é que as terras, ferramentas, máquinas, indústrias, comércios, bancos, enfim dona do capital.

A BURGUESIA – é a classe social que emprega, ou seja, compra a força de trabalho do proletariado, em horas de trabalho. Logo a relação de produção é assalariada. E é daí que advém o lucro, pois os trabalhadores proletarizados que vendem suas horas trabalhadas, ao colocar em andamento o processo de produção, sempre produzem mercadorias com um valor bem superior que do seu próprio salário, essa é a chamada mais-valia, que vai ser extremamente desenvolvida na obra fenomenal de Marx “O Capital”.

PROLETARIADO – classe social no capitalismo que não possuindo os meios de produção, são proprietários apenas da sua força de trabalho que vendem para os burgueses (capitalistas) em troca de um salário dentro de uma jornada horária estipulada. Produzem mais valor do que recebem como salário e por isso aumentam os lucros e o capital dos burgueses.

PROLETARIADO é considerado um trabalhador livre, livre de ter terra, livre de ter meios de produção, livre de ter suas ferramentas, (sua liberdade vem da condição de não ser proprietário, nem propriedade como no escravismo e, de certo modo no feudalismo) afinal o proletário só possui sua prole, que tem que manter viva e por isso vender sua única propriedade: a força de trabalho. E quem a compra é o burguês, onde a concorrência (desemprego) é favorável para que o mesmo compre-a por valores mais baixos, aumentando assim sua mais-valia.

sexta-feira, 13 de maio de 2022

HANNAH ARENDT: VIDA E OBRA – UMA GRANDE POLÊMICA

         Hannah Arendt – escritora e pensadora alemã de origem judaica, nascida na Alemanha e radicada nos EUA, nasceu como o nome de Johanna Arendt, na cidade de Linden-Limmer, Reino de Hanôver, Império Alemão em 14 de outubro de 1906, e faleceu em Nova Iorque, nos Estados Unidos em 4 de dezembro de 1975, com 69 anos. Foi também uma filosofa política, uma das mais influentes do século XX na área de Filosofia Política, Filosofia Continental e Fenomenologia, escrevendo em diversas áreas de seu interesse como: Teoria Política, Religião, Judaísmo, Ideias Notáveis, Banalidade do Mal, As Origens do Totalitarismo (livro de 1951), A Condição Humana (livro de 1958), Da Revolução (livro de 1963) e Eichmann em Jerusalém (livro de 1963).

        Foi influenciada por: Sócrates, Platão, Aristóteles, Paulo, Duns Escoto, Santo Agostinho, Maquiavel, Montesquieu, Edmund Burke, Kant, Tocqueville, Kierkegaard, Karl Marx, Friedrich Nietzsche, Heidegger, Russel, Jaspers e Walter Benjamin.

         E influenciou: Jügen Habermas, Maurice Merleau-Ponty, Giorgio Agamben, Seyla Benhabib, Cornelius Castoriadis, Claude Lefort, Elisabeth Young-Breuehl, Reinhart Koselleck, Hanna Pitkin, Michael Marrus, Quentin Skinner, J.G.A. Pocock, Phillip Pettit, Alain Finkielkraut, Juskia Kristeva, Richard Sennett, Charles Taylor e Robert Pogue  Harrison.

         Alma mater: Universidade de Berlin, Universidade de Marburgo, Universidade de Freiburg, Universidade de Heidelberg (PhD em 1929).

        A privação de direitos e a perseguição de pessoas de origem judaica ocorrida na Alemanha a partir de 1933, assim como um breve encarceramento neste ano, fizeram-na decidir por emigrar. O regime nazista retirou-lhe a nacionalidade em 1937, o que a tornou apátrida até conseguir a nacionalidade estado-unidense em 1951.


         Trabalhou, entre outras atividades, como jornalista e professora universitária e publicou obras importantes sobre filosofia política. Contudo, recusava a ser classificada como “filósofa” e também se distanciava do termo “filosofia política”, preferia que suas publicações fossem classificadas dentro da “teoria política”.

         Arendt defendia um conceito de “pluralismo” no âmbito político. Graças ao pluralismo, o potencial de uma liberdade e igualdade política seria gerado entre as pessoas. Importante é a perspectiva da inclusão do “Outro”. Em acordos políticos, convênios e leis, devem trabalhar em níveis práticos pessoas adequadas e dispostas. Como frutos desses pensamentos, Arendt situava de forma crítica ante a democracia representativa e preferia um sistema de conselhos ou formas de democracia direta. Entretanto, ela continua sendo estudada como filósofa, em grande parte devido a suas discussões críticas de filósofos como Sócrates, Platão, Aristóteles, Immanuel Kant, Martin Heidegger e Karl Jaspers, além de representantes importantes da filosofia moderna como Maquiavel e Montesquieu. Justamente graças ao seu pensamento independente, a Teoria do Totalitarismo (Theorie der Totalen Herrschaft) seus trabalhos sobre filosofia existencial e sua reivindicação da discussão política livre, Arendt tem um papel central nos debates contemporâneos.

 


        Como fontes de suas investigações Arendt usa, para além de documentos filosóficos, políticos e históricos, biografias e obras literárias. Esses textos são interpretados de forma literal e confrontados com seus pensamentos. Seu sistema de análise – parcialmente influenciado por Heidegger – a converte em uma pensadora original situa da entre diferentes campos de conhecimento e especialidades universitárias. O seu devenir pessoal e o de seu pensamento mostram um importante grau de coincidência.

 

Vida e Obra

Infância e Juventude

         Hannah Arendt nasceu em 1906 no seio de uma família de judeus secularizados em Linden, hoje bairro de Hanôver. Seus antepassados vieram de Königsberg, na Prússia (a cidade russa de Kaliningrado), para onde voltaram seu pai, o engenheiro Paul Arendt, que sofria de sífilis, sua mãe Martha (de nome de solteira Cohn) e ela, quando Hannah tinha somente três anos. Depois da morte de seu pai, em 1913, foi educada de forma bastante liberal por sua mãe, que tinha tendências social-democratas. Nos círculos intelectuais de Königsberg nos quais se criou a educação de meninas era comum. Através dos seus avós, conheceu o judaísmo reformista. Não pertencia a nenhuma comunidade religiosa, mas sempre se considerou judia, inclusive participando do movimento sionista.

        Aos quatorze anos, já havia lido a “Crítica da Razão Pura” de Kant e a “Psicologia das Concepções do Mundo” de Jaspers. Aos 17 anos é obrigada a abandonar a escola por problemas disciplinares, indo então, sozinha, para Berlim, onde, sem haver concluído sua formação, teve aulas de teologia cristã e estudou pela primeira vez a obra de Søren Kierkegaard. De volta a Königsberg em 1924, foi aprovada no exame de maturidade (Abitur). 

Vida Acadêmica e Atividade Política 

        Em 1924, começa seus estudos na Universidade de Marburg e durante um ano assiste aulas de filosofia de Martin Heidegger e de Nicolai Hartmann e as de teologia protestante de Rudolf Bultmann, além de estudar grego. 
        
Heidegger, pai de família de 35 anos, e Arendt, estudante, dezessete anos mais jovens que ele, foram amantes, ainda que tivessem de manter em segredo a relação. No começo de 1926, por não suportar mais tal situação, decidiu trocar de universidade, indo para Universidade Albert Ludwig de Freiburg para estudar sob a orientação de Edmund Husserl. Ela também estudou filosofia na Universidade de Heidelberg e se formou em 1928, sob a tutoria de Karl Jaspers, com a tese “O Conceito de Amor em Santo Agostinho”. A amizade com Jaspers duraria até a morte do filósofo.

         Arendt havia levado uma vida muito recatada em Marburg, como consequência do segredo de sua relação com Heidegger. Mantinha amizade apenas com outros alunos, como Hans Jonas, e com seus amigos de Königsberg. Em Heidelberg, ampliou seu círculo de amigos ao qual pertenceu Karl Frankestein, que em 1928, apresentou uma dissertação histórico-filosófica, Erich Neumann, seguidor de Jung, e Erwin Loewenson, um ensaísta expressionista. Nonas também se mudou para Heidelberg e realizou alguns trabalhos sobre Santo Agostinho.


     Em Berlim, no ano de 1929, Arendt reencontra Günther Stern (que se chamaria mais tarde Günther Anders), que conhecera em Marburg. Pouco mais tarde, mudou para viver com ele, algo que foi mal visto pela sociedade da época. Nesse mesmo ano, casaram-se. O casamento duraria até 1937. Depois de um curto tempo em Heidelberg, o casal passou um ano em Frankfurt. Arendt escrevia para o jornal Frankfurter Zeitung e participava de seminários de Paul Tilich e Karl Mannheim, de cujo livro “Ideologia e Utopia” elaborou uma resenha crítica. Ao mesmo tempo, estudava a obra de Rahel Varnhagen, uma intelectual judia assimilada, convertida ao cristianismo, que viveu entre os séculos XVIII e XIX.

         Quando ficou claro que a tese de Stern não seria aceita por Theodor Adorno, os dois voltaram para Berlim. Lá, Arendt começou a elaborar uma tese sobre a obra de Rahel Varnhagen. Depois de uma avaliação positiva de Jaspers, que também conseguiu outras de Heidegger e de Martin Dibelius, Arendt obteve uma bolsa de estudos na Notgemeinschaft der Deutschen Wissenschaft (Associação de Ajuda para a Ciência Alemã), Arendt começou a se interessar cada vez mais por questões políticas. Leu Marx e Trotsky e estabeleceu contatos na Hochschule für Politik (Escola Superior de Política). Analisou a exclusão social dos judeus, apesar da assimilação, com base no conceito de “pária”, empregado pela primeira vez por Max Weber para falar dos judeus. A este termo, ela opôs outro – “arrivista” –, inspirada pelos escritos de Bernard Lazare. Em 1932, publicou na revista Geschichte der Juden in Deutschland (História dos Judeus na Alemanha) o artigo “Aufklärung und Judenfrage” (“O Iluminismo e a Questão Judaica”), no qual expõe suas ideias sobre a independência do judaísmo, contrapondo-as com as dos iluministas Gotthold Ephraim Lessing e Moses Mendelssohn e o precursor do Romantismo, Johann Gottfried Herder. 

       Também em 1932, escreve uma crítica do livro “Das Frauenproblem in der Gegenwart” (“O Problema da Mulher na Atualidade”) de Alice Rühle-Gerstel no qual comenta a emancipação da mulher na vida pública, mas também discute suas limitações – sobretudo no casamento e na vida profissional. Constata o “menosprezo fático” que sofre a mulher na sociedade e critica os deveres que não são compatíveis com sua independência. Em troca, Arendt contempla o feminismo à distância. Por um lado, insiste que as frentes políticas são “frentes de homens” e, por outro, considera “questionáveis” os movimentos feministas, assim como os movimentos juvenis, porque ambos – com estruturas que trespassam as classes sociais – têm que fracassar em seu intento de criar partidos políticos influentes. 

       Pouco antes da ascensão de Hitler ao poder, Karl Jaspers tenta convencê-la em várias cartas de ela devia considerar-se alemã. Ela rebate, escrevendo: “Para mim, Alemanha é a língua materna, a filosofia e a poesia”. No mais, sentia-se distante. Em especial critica a expressão “o ser (Wesen) alemã” empregada por Jaspers. Este respondeu: “Estranho que você, como judia, queira diferenciar-se dos alemães”. Ambos também manteriam estas posições após a Guerra.

         Em 1932, Arendt já pensava na emigração, mas inicialmente ficou na Alemanha quando seu marido emigrou para Paris, em março de 1933, e começou sua atividade política. Por recomendação de Kurt Blumenfeld, trabalhou para uma organização sionista, estudando a perseguição dos judeus, que estava no começo na Alemanha Nazista. Sua casa serviu de estação de trânsito para refugiados. Em julho de 1933, ela foi detida durante oito dias pela Gestapo. A Günter Gaus comentou-se suas razões: “Se te atacam como judeu, deves defender-te como judeu”. 

       Já em 1933, Arendt defendia a postura de que se devia lutar ativamente contra o nacional-socialismo. Essa posição contrária à de muitos intelectuais alemães, inclusive alguns de origem judaica, que pretendiam se aproximar do nacional-socialismo, subestimando a ditadura e inclusive elogiando os novos donos do poder. Na entrevista com Gaus, ela expressa seu desprezo pela “Gleichschaltung” (“adaptação” ao novo governo) da maioria dos intelectuais. A questão repugnava Arendt e ela não queria ter nada em comum com esses eruditos de manada, oportunistas ou mesmo entusiastas.

         Desse pensamento surgiu sua disputa com Leo Strauss, cujo pensamento conservador rejeitava. O ingresso de Heidegger no NSDAP[1] causou o rompimento de sua relação com ele, a qual não foi retomada até 1950. Também finalizou a amizade com Benno Von Wiese quando este se aproximou do nazismo e ingressou no NSDAP, em 1933.

         Essa experiência de profundo afastamento de seus amigos é descrita várias vezes em suas obras e em sua correspondência. Ela partia da convicção de que se tratava de decisões voluntárias, pelas quais o indivíduo era responsável. Pouco antes de sua morte sustentou que muitos pensadores fracassaram frente ao nacional-socialismo quando se comprometeram com o regime. Arendt não exigia deles uma oposição ativa. Reconhecia já o silêncio como uma recusa ao totalitarismo.

         Outro círculo de amigos se abriu graças à sua amizade com Benno Von Wiese e seus estudos com Friedrich Gundolf, que lhe havia recomendado Jaspers. Sua amizade com Kurt Blumenfeld, diretor e porta-voz do movimento sionista alemão, cujos estudos tratavam da chamada questão judaica e da assimilação cultural também foi importante. Hannah Arendt agradeceu-lhe em uma carta de 1951 o seu próprio entendimento da situação dos judeus.

        Ainda em 1933 (ano da tomada do poder por Hitler) Arendt, por ser judia, foi proibida de defender uma segunda tese (sobre Rahel Varnhagen), que lhe daria o acesso à docência nas universidades alemãs. O seu crescente envolvimento com o sionismo levá-la-ia a colidir com o antissemitismo do Terceiro Reich – o que a conduziria, seguramente, à prisão. Deixou a Alemanha, passando por Praga e Genebra antes de chegar a Paris, onde trabalhou nos seis anos seguintes com crianças judias expatriadas e tornou-se amiga do crítico literário e filósofo marxista Walter Benjamin. Quando a França foi ocupada pelos alemães, Arendt foi presa juntamente com seu segundo marido, o filósofo “marxista crítico” Heinrich Blücher e ficou internada no campo de concentração de Gurs. Em 1941 conseguiu escapar e fugir para os Estados Unidos, através da Espanha e Portugal, com a ajuda do jornalista estado-unidense Varian Fry.

         Hannah Arendt chegou a Lisboa em janeiro de 1941, após ter casado pela segunda vez com o poeta Heinrich Blücher escapando in extremis da França ocupada pelos nazis com o seu marido e sua mãe. Conseguiu passar as fronteiras mediante documentos falsos obtidos pelo grande economista e historiador das ideias Albert Hirschman que tinha lutado pelos republicanos na Guerra Civil Espanhola.

         Hannah Arendt chegou a Lisboa devastada pela notícia da morte de seu amigo Walter Benjamin, que se suicidara uns meses antes ao não conseguir atravessar a fronteira entre França e Espanha com destino a Lisboa. Hannah e o marido transportavam o manuscrito das Teses sobre a Filosofia da História que Benjamin escrevera no início do ano anterior e que lhes enviara por segurança. Do pouco que se sabe que Hannah Arendt fez em Lisboa, além de lutar contra a depressão e esperar por papéis e passagens para Nova Iorque, foi ler o ensaio de Walter Benjamin, assumindo a responsabilidade de fazê-lo publicar nos EUA.

         Segundo Rui Tavares, a estada paralisante de Hannah Arendt em Lisboa, pelo seu peso emocional e pelo desespero surdo, reflete-se principalmente no seu extraordinário ensaio “Nós Refugiados” que publicou e que lhe permitiu entender, como pessoa refugiada e apátrida, que a cidadania é o primeiro dos direitos, “o direito a ter direitos” segundo ela, e que esteve na origem da sua relevante filosofia dos direitos humanos.

         Hannah trabalhou nos Estados Unidos em diversas editoras e organizações judaicas, tendo escrito para o Weekly Aufba.

         Depois da Guerra, Arendt ainda regressaria à Alemanha e reencontraria o seu antigo mentor Martin Heidegger, que estava afastado do ensino, devido as suas simpatias pelo nazismo. Envolver-se-ia, pessoalmente na reabilitação do filósofo alemão, o que lhe valeria severas críticas das associações judaicas americanas. Do relacionamento de ambos, ao longo de décadas (inclusive durante o exílio nos Estados Unidos), seria publicado um livro marcante “Lettres et Autres Documents, 1925 – 1975, Hannah Arendt, Martin Heidegger”, com edição alemã e tradução francesa da responsabilidade das édition Gallimard.

         Em 1963, Hannah Arendt é contratada como professora da Universidade de Chicago, onde ensina até 1967, ano em que se muda para Nova Iorque e passa a lecionar na New School for Social Research, instituição em que permanece até a sua morte em 1975.

         Hannah Arendt faleceu em 4 de dezembro de 1975, uma quinta-feira, e atualmente está sepultada em Bard College, Annandale-on-Hudson, Nova York, nos Estados Unidos.
 

Pensamento

Banalidade do Mal

         Um dos principais conceitos de Hannah Arendt é conhecido por ter sido estabelecido enquanto a autora cobria jornalisticamente os julgamentos de ex-oficiais nazistas, que tiveram início em 1961, na cidade de Jerusalém, quando escreveu sua importante obra “Eichmann em Jerusalém”. O conceito de “banalidade do mal” trata sobre o que ela chama de “desenraizamento” das experiências humanas em relação à realidade, da amoralidade, da subserviência à ordens, do acriticismo. Uma citação do libro “As Origens do Totalitarismo”, que fala sobre a estrutura do movimento totalitário, dá luz à ideia: “os membros fanatizados são intangíveis pela experiência e pelo argumento; a identificação com o movimento e o conformismo total parecem ter destruído a própria capacidade de sentir, mesmo que seja algo tão extremo como a tortura ou o medo da morte”.

         O conceito de banalidade do mal, postulado no fim da obra “Eichmann em Jerusalém”, causou certo mal estar e polêmica na comunidade intelectual da época, pois Arendt tratou de assuntos delicados como a participação e colaboração de judeus, através dos Conselhos Judaicos, com os nazistas para seu extermínio. Daí a ideia de que a banalidade do mal estaria ligada a um “colapso moral” tanto dos que perseguiam, quanto das vítimas.

        O alvoroço também girou em torno de seu postulado, com questiona Luciano Oliveira: “qualificar de banal um mal da dimensão do nazismo não seria diminuir sua enormidade?” O fato é que o termo banalidade surge em meio à sua interpretação da figura de Eichmann, que seria, nesse sentido, um “sujeito normal”. Arendt chega a dizer que “não se pode extrair profundidade diabólica ou demoníaca em Eichmann” e ainda coloca que ele não era um “monstro”. Daí o sentido de banalidade estar ligado com um indivíduo que apenas cumpria e executava ordens advindas de uma burocracia com hierarquias rigidamente estabelecidas. Ao mesmo tempo, aponta Oliveira, para Hannah Arendt o sujeito banal descrito teria de “sacrificar suas convicções, honra e dignidade humana” para que se pudesse aceitar o nazismo. Ao fim de sua obra, a autora coloca o que seria central para o entendimento do conceito, a saber, a incapacidade de reflexão e empatia, ou melhor, a “hipótese de que o mal talvez esteja intimamente relacionado com a ausência de pensamento naquele que o pratica”. 

Ideologia

         Na concepção de Arendt, a ideologia ou o pensamento ideológico possui três elementos fundantes:

Primeiro: A característica dos movimentos totalitários de sempre terem uma explicação total sobre a História, em termos de passado, presente e futuro. Ou seja, fala sobre o quanto as ideologias, seja a racista no hitlerianismo, ou a marxista no stalinismo, orientam-se pelo “devir”, pelo “movimento” não analisam o passado segundo “um conjunto de postulados acerca do que é, (...) mas de um processo que está em constante mudança”.

Segundo: Trata sobre a propaganda, conspirações e doutrinação. Arendt dá exemplos de doutrinação, como as escolas nazistas para formar exércitos, as Ordensburgen, e as escolas soviéticas do Comintern. Mas, mais importante para o conceito, fala sobre o quanto as ideologias têm a capacidade de “emancipar” as pessoas da realidade em que vivem.

Terceiro: Arendt explica através da filosofia, como são e quais são os métodos utilizados pelo totalitarismo para distanciar as pessoas da experiência empírica ou da realidade. Os processos de “movimento” e de “emancipação da realidade” descritos anteriormente se dão através da dedução, que parte de uma ou mais premissas axiomáticas. Seria o racionalismo prevalecendo completamente sobre o empirismo. E, a partir do momento que o sujeito adentra em tal “movimento”, tudo o que é anterior seria esquecido.

 

       Daí, a ideia de que a Ideologia estaria ligada com uma prática de esquecimento, descrita por ela em outras obras. Tal elemento conclui, trata tanto de uma prática persuasiva dos líderes e representantes do movimento, em seus discursos, quanto de seus slogans e propagandas. Ao mesmo tempo, Arendt propõe certa crítica e reconhece que há uma “substância” na base do marxismo que, com as ideologias, ficou esquecido, com é o caso da exploração do proletariado. Ou seja, até mesmo princípios importantes do marxismo foram deixados de lado em prol da “camisa de força da lógica”.

 Formas ou Tipos de Governo








Governo Tirânico

         Hannah Arendt explica cada tipo de governo através da organização política interna e as técnicas de administração. O que ela chama de Tirania remete aos tipos de governos fundados nas ideias trazidas por Platão, em “A República”, onde existia a política de “um contra todos” feita por um líder, ou seja, “os ‘todos’ que ele oprime são iguais, a saber, igualmente desprovidos de poder”. Este líder seria fonte da Lei e governaria de acordo com as suas próprias vontades. A metáfora por ela utilizada é a de uma pirâmide que possui baionetas que suspendem o topo apoiadas em sua base, onde na base se encontram indivíduos “cuidadosamente isolados, desintegrados e completamente iguais”.

Governo Autoritário

        No tipo de governo Autoritário, Arendt também utiliza a metáfora da pirâmide, mas esta é descrita de tal modo: “a sede do poder se localiza em seu topo, do qual a autoridade e o poder se filtram para a base de maneira tal que cada camada consecutiva possua alguma autoridade”. “(...) estes diferentes níveis se ‘interrelacionam como raios convergentes cujo ponto focal comum é o topo da pirâmide, bem como a fonte transcendente de autoridade acima dela”. Importante notar que a fonte de autoridade neste tipo específico são os códigos e leis, como a nossa constituição, “o direito natural os mandamentos divinos”.

Governo Totalitário

        Ao descrever o tipo de governo Totalitário, Arendt recorre à pouco conhecida metáfora da cebola: “cujo centro, em uma espécie de espaço vazio, está o líder; o que quer que ele faça – integre o organismo  político como em uma hierarquia autoritária, ou oprima seus súditos como um tirano – ele o faz de dentro, e não de fora ou de cima”. Cada nível hierárquico se interrelaciona, de um lado, montando uma fachada de uma realidade externa sem caos e, de outro, realizando o papel de um “extremismo radical”, no que a autora conclui que tal estrutura “torna o sistema organizacionalmente à prova de choque contra a factualidade do mundo real”. Ou seja, há a suspensão completa da realidade do mundo e dos fatos quando está em vigência no aparelho burocrático do Estado o regime totalitário. E, diferente do tipo tirânico no qual a fonte da Lei é o próprio líder, o ditador totalitário se coloca como executor de “leis mais altas”.

 

Autoridade

         Arendt fala sobre o conceito de autoridade se referindo às instituições, aos modos de vida e às tradições políticas do Ocidente. Ela explica que não existe autoridade se o Estado ou outro ator social qualquer usar a força, ou seja, de “meios externos de coerção” para conter ou controlar a população, por exemplo, o uso da força policial em manifestações públicas. Ao mesmo tempo, adverte que a autoridade também não existe se esta se valer de meios de convencimento ou “persuasão”, pois ela “pressupõe igualdade e argumentação”. 

    Nesse sentido, Arendt se refere ao aparelhamento da propaganda nazista ministrada por Joseph Goebbels, que através de várias técnicas discursivas, como a repetição incessante de mentiras e o uso do status científico como instrumento de poder, convenceram as massas alemãs à adesão aos pressupostos e projetos do nacional-socialismo. Ou seja, não houve confiança política da população, pois ela teve de ser convencida e fanatizada. A título de exemplo do que pode ser considerada autoridade em termos de tradição, Arendt diz que “o sintoma mais significativo da crise de autoridade, a indicar sua profundeza e seriedade, é ela ter se espalhado em áreas pré-políticas, tais como a criação dos filhos e a educação”.

         Deste modo, quer dizer que quando estes elementos se tornam um questionamento na sociedade, provavelmente isto significa dizer que a política perdeu seu poder de autoridade e, deste modo, de confiança.

Solidão e Isolamento

         A diferença entre solidão e isolamento é uma excelente fonte de explicação para a forma como a organização totalitária moldava e controlava a população e assim, se mantinha no poder. Uma citação em particular resume a ideia: “o que chamamos de isolamento na esfera política é chamado de solidão na esfera dos contatos sociais. (...) Posso estar isolado – numa situação em que não posso agir porque não há ninguém para agir comigo – sem estar solitário; e posso estar solitário – numa situação em que me sinto completamente abandonado da companhia humana – sem estar isolado” (“Origens do Totalitarismo”).

        Assim, o isolamento seria “impotência”, “incapacidade básica de agir”, ou seja, estaria ligada a uma incapacidade comum das pessoas de se unirem em prol de questões ou motivações políticas. O exemplo, situado na história do Brasil – a supressão e perseguição de sindicatos e partidos Comunistas pelo ditador Getúlio Vargas no Golpe de 1937 e o fechamento do Congresso Nacional pelo Estado Novo. Como diz Arendt, as características humanas da “ação e poder são frustradas” e, junto a isso, ela afirma que tais pressupostos estão atrelados à forma tirânica de governar. Não obstante, a ideia de solidão está conectada com a noção de vida privada ou de “vida humana como um todo”. A noção de solidão está ligada com o importante conceito de banalidade do mal, pois ele contempla as ideias de “superfluidade” e “desarraigamento”, no que ela identifica o segundo, a ausência de raiz, como “não ter no mundo um lugar garantido e reconhecido pelos outros” e o primeiro com a ideia de não pertencimento ao mundo, ou seja, ambos ligam-se à noção de direitos humanos, o primeiro sobre o direito de ter garantias ou o direito de ter direitos, e o segundo sobre o direito de pertencer a um país, nação, pátria. É fundamental ressaltar que em sua conceituação de totalitarismo, a noção de solidão seria novidade, ou seja, seria um paradigma novo na ciência política da época e que descreve o fenômeno totalitário. 

Crítica a Marx

    De acordo com Camargo, Hannah estabelece uma diferenciação que fica compreensível e entendível no conceito de Labor e Trabalho. Proporcionando um melhor entendimento acerca do tema e das condições do sujeito para o sujeito, seja para sobrevivência própria direta (labor) ou pra seu sustento no que tange a questão capitalista financeira. Com relação à crítica que exerce à Marx no conceito trabalho, Hannah entende haver a possibilidade de o trabalho ser produtivo ou improdutivo, ambos possibilitando o entendimento e produzindo objetos, matéria, pela simples ação do sujeito. Já Marx considera apenas o trabalho produtivo, como se apenas produzisse resultado quando o trabalho é convalido como “status” de concluído na fase que se encontra. Arendt também estabelece uma espécie de crítica à concepção marxista de violência em seu ensaio “Religião e Política”, dizendo que, para Karl Marx e o marxismo, todo o discurso e o debate existentes seriam de alguma forma “ideológicos” e por isso a única ação política genuína seria a não-discursiva, ou seja, a política seria “intrinsecamente violenta”. Ela também comenta, em outro ensaio chamado “Compreendendo o Comunismo”, de 1953, que trata, exatamente como o ensaio mencionado acima, sobre o assunto que estava em voga nas ciências sociais da época: a função e finalidade dos fenômenos sociais, ou seja, o que acontece em consequência a eles e não necessariamente o que e como eles são. Arendt fala sobre o quanto a crítica de Marx à religião como ideologia seria equivalente ao próprio marxismo, ou seja, coloca ambas como ideológicas e como ideias que preenchem “necessidades sociais básicas” dos seres humanos, ainda dentro do método sociológico vigente. 

Livros

         O trabalho filosófico de Hannah Arendt abarca temas como a política, a autoridade, o totalitarismo, a educação, a condição laboral, a violência e a condição feminina.

         Seu primeiro livro leva o título “O Conceito do Amor em Santo Agostinho: Ensaio de uma Interpretação Filosófica”. Trata-se de sua tese, editada em 1929 em Berlim, na qual ela enlaça elementos da filosofia de Martin Heidegger com os de Karl Jaspers e enfatiza a importância do nascimento, tanto para o indivíduo como para seu próximo. Com isso, ela se afasta de seu professor Heidegger, que entende a vida como um “avançar” para a morte. A obra foi resenhada em importantes publicações filosóficas e literárias. Criticou-se o fato de que Arendt considerasse Santo Agostinho como filósofo e não como sacerdote, além do fato de não ter citado a literatura teológica mais recente. 

    Em “As Origens do Totalitarismo” (1951) consolida o seu prestígio como uma das figuras maiores do pensamento político ocidental. Arendt assemelha de forma polêmica o nazismo e o stalinismo, como ideologias totalitárias, isto é, com uma explicação compreensiva da sociedade, mas também da vida individual, e mostra como a via totalitária depende da banalização do terror, da manipulação das massas, do acriticismo face à mensagem do poder. Hitler e Stalin seriam duas faces da mesma moeda, tendo alcançado o poder por terem explorado a solidão organizada das massas.

         Sete anos depois publica “A Condição Humana”, obra onde adota a clássica tripartição grega e enfatiza a importância da política como ação e com processo, dirigida à conquista da liberdade: “Com a expressão ‘vita activa’, pretendo designar três atividades humanas fundamentais: labor, trabalho e ação. (...) O labor é a atividade que corresponde ao processo biológico do corpo humano (...). A condição humana do labor é a própria vida. O trabalho é a atividade correspondente ao artificialismo da existência humana (...). O trabalho produz um mundo “artificial” de coisas, nitidamente diferente de qualquer ambiente natural. A condição humana do trabalho é a mundanidade. A ação, única atividade que se exerce diretamente entre os homens sem a mediação das coisas ou da matéria, corresponde à condição humana da pluralidade, ao fato de que os homens – e não o Homem – vivem na Terra e habitam o mundo. Todos os aspectos da condição humana têm alguma relação com a política; mas esta pluralidade é especificamente ‘a’ condição (...) de toda a vida política”.

         Publica depois “Sobre a Revolução” (1963), onde examina a Revolução Francesa e a Revolução Americana, mostrando o que têm de comum e de diferente, defendendo que a preservação da liberdade só é possível se as instituições pós-revolucionárias interiorizarem e mantiverem vivas as ideias revolucionárias. Lembraria aos seus concidadãos estado-unidense (entretanto adquirira a nacionalidade dos EUA) que se se distanciassem dos ideais que tinham inspirado a Revolução Americana perderiam o seu sentido de pertencer e de identidade.

         Ainda, em 1963, lançaria “Eichmann em Jerusalém”, que reúne os cinco artigos que escreveu sobre o julgamento de Eichmann, que cobriu para a The New Yorker. Nesse livro Eichmann não é retratado como um demônio (como o descreviam os ativistas judeus), mas alguém terrível e horrivelmente normal. Um típico burocrata que se limitara a cumprir ordens, com zelo, por amor ao dever, sem considerações acerca do bem e do mal. No livro, Arendt aponta ainda a cumplicidade das lideranças judaicas com os nazistas. Esta perspectiva valer-lhe-ia criticas virulentas das organizações judaicas, além da ameaça de ser excluída da universidade.




[1] NSDAP – Sigla do Partido Nazista, oficialmente Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães em alemão:Nationalsozialistsche Deutsche Arbeiterpartei – NSDAP). Fonte: Wikipedia. Disponível em: https://en.wikipedia.org/wiki/Nazi_Party. Acesso em 12 de maio 2022.


 

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