domingo, 25 de junho de 2017

LEANDRO KARNAL CONTA A SUA EXPERIÊNCIA DO PRIMEIRO DIA DE AULA:

A AULA - 1 - INTRODUÇÃO AO JOGO E SUAS REGRAS
(Leandro Karnal – Conversas com um Jovem Professor, pp. 15 e 16)


         Vai começar. Você estudou anos para isto. Preparou aquela aula. Leu e debateu autores que tratam do tema. Porém, nada no planeta pode substituir a experiência de enfrentar uma turma pela primeira vez. Uso o verbo enfrentar porque é esta a sensação: dezenas de olhos colocados sobre você. Um pouco mais de silêncio se for uma turma que não se conhece ou... muito barulho se for uma turma que se reencontra depois das férias. E, finalmente, cadernos e livros na mão, ei-lo entrando para o local privilegiado da sua profissão: a sala de aula.
         A faculdade antecipa pouco essa experiência real. Onde eu enfio Piaget e Vigotsky quando vou fazer a chamada? Dúvidas banais substituem os grandes temas da psicopedagogia: coloco “P” ou “ponto” para a presença? E aqueles trabalhos imensos sobre a produção do conhecimento numa sociedade dependente periférica capitalista? Agora só ocorrem perguntas triviais e poucos nobres: é permitido rasurar o diário? Será que eu posso autorizar a ida ao banheiro daquele aluno que está de pé desde que eu entrei?

         Na verdade, o banho realístico veio antes da sua solene entrada na turma. Começou na sala dos professores. Colegas deram conselhos práticos: “Não mostre os dentes no primeiro dia”. Para quem não está acostumado a essa linguagem, significa não sorrir de imediato para não perder o controle da sala. Os mais experientes soltaram risadinhas: “Você vai ver aquela sétima B”! A advertência é quase uma praga, ou, talvez, um desejo velado de que você fracasse. Disseram-me há uns 30 anos: “Deus inventou o conhecimento e o diabo, invejoso, criou o colega...”. Na época, muito jovem, eu achava a frase amarga.
         Aqui, um conselho prático: antes de entrar em sala, ouça os colegas, desde os muito interessantes até os indiferentes. Alguns querem ajudar. Outros não toleram sua juventude ou entusiasmo. Ouça todos. Porém nunca esqueça: a fala do colega diz respeito, exclusivamente, à experiência dele e não a sua. O aluno-problema dele talvez seja apenas dele e a turma fácil talvez não flua tão bem com você.

         Ouça sempre. A experiência tem valor, mas esteja atento a essa verdade pétrea que vale até para este texto: bons conselhos podem ser úteis, mas seu caminho será construído exclusivamente por você.


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