domingo, 1 de dezembro de 2013

Olá pessoal da Escola Flávio, parabéns para quem já passou e para quem ainda não conseguiu vamos tentar recuperar:


ALUNOS QUE FICARAM PARA RECUPERAÇÃO EM HISTÓRIA

PROFESSOR CLÁUDIO MAFFEI

 

SEXTAS SÉRIES       NÚMERO DOS ALUNOS

6.ª série A
4-6-9-21-25-28-29-30-31-33-34-37-39
6.ª série B
2-3-4-5-6-7-10-15-21-24-26-27-30-32-34-35-37
6.ª série C
2-3-5-7-14-16-17-24-27-30-31-36

 

TRABALHOS DE RECUPERAÇÃO ( para a semana de 02 a 05 de dezembro):

 

1)      O que é FEUDALISMO?

2)      Renascimento cultural;

3)      Ser índio no Brasil hoje!

4)      Astecas;

5)      Maias;

6)      Incas

 

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SÉTIMAS SÉRIES              NÚMERO DOS ALUNOS

7.ª série A
4-8-15-18-22-25-26-29-31-34-35-39
7.ª série B
1-2-3-4-5-9-11-14-15-19-20-27-36-37
7.ª série C
2-11-12-13-15-16-21-24-25-32-33-35-37-39

 

TRABALHOS DE RECUPERAÇÃO ( para a semana de 02 a 05 de dezembro):

 

1)      Revoluções Inglesas;

2)      Revolução Francesa;

3)      Revolução Americana (Independência dos EUA);

4)      Primeira Revolução Industrial;

5)      Segunda Revolução Industrial.

 

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OITAVAS SÉRIES             NÚMERO DOS ALUNOS

8.ª série A
1-5-9-17-19-21-25-28-29-34
8.ª série B
2-5-6-7-9-12-14-18-19-25-28-31-32
8.ª série C
1-3-4-8-9-11-12-14-16-19-22-26-27-29-32
8.ª série D
1-3-12-19-20-22-33

 

TRABALHOS DE RECUPERAÇÃO ( para a semana de 02 a 05 de dezembro):

 

1)      Tenentismo;

2)      A Semana de Arte Moderna de 1922;

3)      A Revolução de 1930;

4)      Governo Provisório de Getúlio Vargas;

5)      Governo Constitucional de Getúlio Vargas;

6)      Estado Novo

domingo, 10 de novembro de 2013

CAPITULO 3 DA HISTÓRIA DA RIQUEZA DO HOMEM DE LÉO HUBERMAN


CAPÍTULO III



RUMO À CIDADE

À medida que o riacho irregular do comércio se transformava em corrente caudalosa, todo pequeno broto da vida comercial agrícola e industrial recebia sustento, e florescia todos efeitos mais importantes do aumento no comércio foi o crescimento das cidades. Sem dúvida, havia certo tipo de cidades antes desse aumento no comércio, os centros militares e judiciais do país, onde se realizavam os julgamentos e onde havia bastante movimento. Eram realmente cidades rurais, sem privilégios especiais ou governo que as diferenciassem. Mas as novas cidades que se desenvolveram com a intensificação do comércio, ou as antigas cidades que adotaram uma vida nova sob tal estímulo, adquiriram um aspecto diferente.

Se é de fato que as cidades crescem em regiões onde o comércio tem uma expansão rápida, na Idade Média temos de procurar cidades em crescimento na Itália e Holanda. E é exatamente onde elas surgiram primeiro. À medida que o comércio continuava a se expandir, surgiam cidades nos locais em que duas estradas se encontravam, ou na embocadura de um rio, ou ainda onde a terra apresentava um declive adequado. Tais eram os lugares que os mercadores procuravam. Neles, além disso, havia geralmente uma igreja, ou uma zona fortificada chamada "burgo" que assegurava proteção em caso de ataque. Mercadores errantes descansando nos intervalos de suas longas viagens, esperando o degelo de um rio congelado, ou que uma estrada lamacenta se tornasse transitável outra vez, naturalmente se deteriam próximo aos muros de uma fortaleza, ou à sombra da catedral. E como um número cada vez maior de mercadores se reunia nesses locais, criou-se um "fauburg" ou "burgo extramural". E não demorou muito para que o arrabalde se tornasse mais importante do que o próprio burgo antigo. Logo, os mercadores dessa povoação, em seu desejo de proteção construíram à volta de sua cidade muros protetores que provavelmente se assemelhavam às paliçadas dos colonos americanos. Em conseqüência, os muros mais velhos se tornaram desnecessários e ruíram aos pedaços. O burgo mais antigo não se expandiu exteriormente, mas se viu absorvido pela povoação mais nova, onde os fatos se sucediam. O povo começou a deixar suas velhas cidades feudais para iniciar vida nova nessas ativas cidades em progresso. A expansão do comércio significava trabalho para maior número de pessoas e estas afluíam à cidade, a fim de obtê-lo. Atente bem o leitor, porém, que não sabemos se o relato acima é verdadeiro. Trata-se apenas de conjeturas de certos historiadores, em particular Henri Pirenne, cujo levantamento de indícios para demonstrar o modo pelo qual as cidades da Idade Media se devenvolveram é tão fascinante como qualquer história de detetive. Uma de suas provas de que o mercador e o habitante da cidade constituíam uma única e mesma pessoa é o fato de que, logo no início do século XII, a palavra "mercator", significando mercador, e "burgensis", significando aquele que vive na cidade, eram usadas alternadamente.

Ora, se recapitularmos o estabelecimento da sociedade feudal, veremos que a expansão do comércio, trazendo em conseqüência o crescimento das cidades, habitadas sobretudo por uma classe de mercadores que surgia, logicamente conduziria a um conflito. Toda a atmosfera do feudalismo era a da prisão, ao passo que a atmosfera total da atividade comercial na cidade era a da liberdade. As terras da cidade pertenciam aos senhores feudais, bispos, nobres, reis. Esses senhores feudais, a princípio, não viam diferença entre suas terras na cidade e as outras terras que possuíam. Esperavam arrecadar impostos, desfrutar os monopólios, criar taxas e serviços, e dirigir os tribunais de justiça, tal como faziam em suas propriedades feudais. Mas isso não poderia acontecer nas cidades. Todas essas práticas eram feudais, baseadas na propriedade do solo, e tinham de ser modificadas, no que se relacionasse às cidades. As leis e a justiça feudais se achavam fixadas pelo costume e eram difíceis de alterar. Mas o comércio, por sua própria natureza, é dinâmico, mutável e resistente às barreiras. Não se podia ajustar à estrutura feudal. A vida na cidade era diferente da vida no feudo e novos padrões tinham que ser criados.

Pelo menos, os mercadores assim julgaram. E o pensamento, com esses comerciantes audazes, foi logo traduzido em ação. Eles aprenderam a lição de que a união faz a força. Quando viajavam pelas estadas, juntavam-se para se proteger contra os salteadores; quando viajavam por mar, associavam-se para se proteger contra os piratas; quando comerciavam rios mercados e feiras. aliavam-se para concluir melhores negócios com seus recursos aumentados. Agora, face a face com as restrições feudais que os asfixiavam, mais uma vez se uniram, em associações chamadas "corporações" ou "ligas", a fim de conquistar para suas cidades a liberdade necessária a expansão contínua. Quando conseguiam o que queriam, sem luta, contentavam-se; quando tinham que lutar para alcançar o que desejavam, lutavam.

O que desejavam eles, especificamente? Quais as exigências desses mercadores nessas cidades em crescimento? Em que aspectos seu mundo em alteração se chocava frontalmente com o mundo feudal mais antigo?

A população das cidades queria liberdade. Queria ir e vir quando lhe aprouvesse. Um velho provérbio alemão, aplicável a toda a Europa ocidental, Stadtlujt macht frei ("O ar da cidade torna um homem livre"), prova que obtiveram o que almejavam. Tão real era esse provérbio que muitas constituições de cidades, dos séculos XII e XIII, continham uma cláusula, semelhante à que se segue, conferida à cidade de Lorris pelo Rei Luís VII, em 1155: "Quem residir um ano e um dia na paróquia de Lorris, sem que qualquer reclamação tenha sido feita contra ele, e sem que se tenha recusado a nos submeter sua causa, ou a nossa preboste, pode aí permanecer livremente e sem ser molestado." Se Lorris e as demais cidades possuíssem a técnica de anúncios de beira de estrada do século XX, poderiam ter usado um letreiro como este: Venha a Lorris e seja LIVRE.

As populações das cidades desejavam algo mais que a liberdade: desejavam a liberdade da terra. O hábito feudal de "arrendar" a terra de Fulano que, por sua vez, a arrendava de Beltrano, não era de seu agrado. O homem da cidade via a terra e a habitação sob um prisma diferente do senhor feudal. O homem da cidade poderia, de repente, precisar de algum dinheiro para inverter em negócios, e gostava de pensar que podia hipotecar ou vender sua propriedade para obtê-lo, sem pedir permissão a uma série de proprietários. A própria escritura pública de Lorris tratava do assunto, nestes termos: "Qualquer cidadão que desejar vender sua propriedade terá o privilégio de fazê-lo." Basta recordar o sistema de administração da terra descrito no primeiro capítulo para verificar quantas modificações se produziram com o comércio e as cidades.

As populações urbanas desejavam proceder a seus próprios julgamentos, em seus próprios tribunais. Eram contrárias às cortes feudais vagarosas, que se destinavam a tratar dos casos de uma comunidade estática, e totalmente inadequadas aos novos problemas que surgiam numa cidade comercial dinâmica. Que sabia, por exemplo, um senhor feudal sobre hipotecas, letras de crédito, ou jurisprudência de negócios em geral. Absolutamente nada. E, de qualquer modo, se soubesse tudo isso, é mais que certo que se utilizaria de seus conhecimentos e posição em benefício próprio, não em favor do homem da cidade. As populações urbanas queriam estabelecer seus próprios tribunais, devidamente capacitados a tratar de seus problemas, em seu Interesse. Queriam, também, elaborar sua própria legislação criminal.

Manter a paz nas pequenas aldeias feudais não se comparava ao problema de manter a paz na cidade em desenvolvimento, com maiores riquezas e população móvel. A população urbana conhecia o problema como o senhor feudal não conhecia. Queria sua própria "paz da cidade".

As populações das cidades desejavam fixar seus impostos, à sua maneira, e o fizeram. Opunham-se à municipalidade dos impostos feudais, pagamentos, ajudas e multas, que eram irritantes, e num mundo em evolução apenas servia para aborrecer. Desejavam empreender negócios e, assim, empenharam-se em abolir as taxas, de qualquer tipo, que as tolhessem. Se porém, falharam no objetivo de suprimir, totalmente, esses direitos, alcançaram o maior êxito em modificá-los, de uma forma ou de outra, para que se tornassem mais aceitáveis. A liberdade das cidades não era, normalmente, concedida de uma só vez, mas pouco a pouco. A princípio, o senhor vendia parte de seus direitos aos cidadãos, depois vendia mais uma parcela e assim sucessivamente, até que a cidade acabava por ficar praticamente independente de seu domínio. Isto, ao que parece, ocorreu na cidade alemã de Dortmund. Em 1241, o Conde de Dortmund vendeu aos cidadãos alguns de seus direitos feudais na cidade: "Eu, Conrad. Conde de Dortmund, e minha esposa, Giseltrude, e nossos legítimos herdeiros vendemos... ...aos cidadãos e cidade de Dortmund, nossa casa, situada ao lado da praça do mercado... ...que lhes deixamos completamente em perpetuidade, juntamente com os direitos, que conservamos do Sagrado Império Romano, de matadouros e oficinas de sapateiros remendões, de padaria e da casa sobre o tribunal, pelo preço de dois dinares pelo matadouro, e também dois dinares pelas oficinas dos sapateiros remendões e, pela casa do forno e casa sobre o tribunal, uma libra de pimenta, que serão pagos anualmente." Oitenta anos mais tarde outro Conde Conrad cedeu, por aluguel anual, "ao conselho e cidadãos de Dortmund, para seu poder exclusivo, metade do condado de Dortmund", que incluía os tribunais, direitos de portagem, impostos e rendimentos, e tudo dentro dos muros da cidade, à exceção da própria casa do conde, seus escravos pessoais e a Capela de São Martinho.

É de supor que os bispos e senhores feudais tenham percebido que ocorriam mudanças sociais de grande importância. É de supor que alguns tenham reconhecido ser impossível barrar o caminho dessas forças históricas. Alguns deles o fizeram, outros não. Alguns bastante espertos para sentir o que ocorria, procuraram tirar o melhor partido da situação e saíram-se bem. Isso porém nem sempre se fez praticamente. Parece fato, através da história, que os donos do poder, os abastados, se utilizarão sempre de quaisquer meios para manter o que possuem. O cão luta por seu osso. E, em muitos casos, os senhores feudais e bispos (particularmente os bispos) ferravam os dentes em seus ossos e não os largavam até que se vissem a isso forçados, pela violência das populações das cidades. Para alguns, não se tratava apenas de se agarrar a seus antigos privilégios, unicamente pelas vantagens que usufruíam. Como ocorre com freqüência na história, muitas dessas pessoas abastadas imaginavam sinceramente que, se as coisas não permanecessem como estavam, loco o sistema social desmoronaria. E como as populações das cidades não acreditavam nisso, muitas cidades só conquistaram sua liberdade depois que a violência irrompeu. Esse fato parece provar a veracidade da afirmação de Oliver Wendell Holmes, de que "quando as divergências são de grande alcance preferimos tentar matar o outro homem a deixá-lo praticar suas idéias". Na verdade, as populações das cidades em luta, dirigidas pelas associações de mercadores organizados, não eram revolucionárias, no sentido que emprestamos à palavra. Não lutavam para derrubar seus senhores, mas apenas para fazê-los abandonar algum as das práticas feudais já gastas pelo uso, que constituíram um estorvo decisivo à expansão do comércio. Não teriam escrito, como os revolucionários americanos, que "todos os homens foram criados livres e iguais". Nada disso. "A liberdade pessoal, por si só, não era exigida como direito natural. Era desejada apenas pelas vantagens que proporcionava. E tanto isso é verdade que em Arrás, por exemplo, os mercadores tentaram enquadrar-se na classe dos servos do Mosteiro de St. Vast, a fim de gozar da isenção das taxas de pedágio nos mercados, que havia sido concedida àqueles." As cidades desejavam libertar-se das interferências à sua expansão, e depois de alguns séculos o conseguiram. O grau de liberdade variava consideravelmente, de forma que é tão difícil apresentar um quadro geral dos direitos, liberdades e organização da cidade medieval quanto do feudo. Havia cidades totalmente independentes, como as cidades- repúblicas da Itália e Flandres; havia comunas livres com graus diversos de independência; e havia cidades que apenas superficialmente conseguiram arrebatar uns poucos privilégios de seus senhores feudais, mas na realidade permaneciam sob seu controle. Mas, fossem quais fossem os direitos da cidade, seus habitantes tinham o cuidado de obter uma carta que os confirmasse. Isso ajudava a evitar disputas, se alguma vez o senhor ou seus representantes por acaso se esquecessem desses direitos. Eis aqui o início de uma carta dada pelo Conde de Ponthieu à cidade de Abbeville, em 1184. Logo na primeira linha, o próprio conde apresenta uma, das razões por que os habitantes das cidades tanto prezavam as cartas e as guardavam cuidadosamente a sete chaves - por vezes chegando mesmo a transcrevê-las em letras de ouro, nos muros da cidade ou da igreja. "Como o que se deixa escrito fica mais bem guardado na memória humana, eu, Jean, Conde de Ponthieu, faço saber a todos os presentes, e aos que virão, que meu avô, Conde Guillaume Talvas, tendo vendido à cidade de Abbeville o direito de manter uma comuna, e não tendo a cidade uma cópia autenticada desse contrato de venda, concedeu-lhe... o direito de manter uma comuna e perpetuamente”.

Cento e oitenta e seis anos depois em 1370 os cidadãos de Abbeville passaram a ter um novo senhor, o próprio rei de França. Decerto, o movimento em prol da liberdade da cidade progredira rapidamente durante esse período, porque o rei, em ordem dada a seus funcionários, fora longe com suas promessas: "Concedemos e transmitimos certos privilégios, pelos quais fica patente, inter alia [entre outras coisas], que nunca, por qualquer motivo, ou ocasião que seja, fixaremos, manteremos, multaremos ou imporemos, nem seremos causa ou toleraremos que sejam fixados, mantidos, estabelecidos ou impostos na referida cidade de Abbeville, ou nas demais cidades do condado de Ponthieu, quaisquer imposições, ajudas, ou outros subsídios de qualquer natureza, se não se destinarem à renda das mencionadas cidades e a seu pedido... razão pela qual nós, considerando o amor e obediência sinceros a nós devotados pelos ditos suplicantes, ordenamos que permita a todos os burgueses, habitantes da referida cidade, comerciar, vender e comprar, e transportar através das cidades, países e limites do referido condado, sal e outras mercadorias de qualquer espécie, sem coagi-los a pagar-nos, ou a nossos homens ou empregados, quaisquer impostos de sal, reclamações, exigências imposições ou subsídios..." Essa isenção dos impostos concedida pelo rei de França no documento acima era apenas um dos privilégios pelos quais os mercadores se batiam. Na luta pela conquista da liberdade da cidade, os mercadores assumiram a liderança. Constituíam o grupo mais poderoso e lograram para suas associações e sociedades todos os tipos e privilégios. As associações de mercadores, com freqüência. exerciam um monopólio sobre o comércio por atacado das cidades. Quem não era um membro da liga de mercadores não fazia bons negócios. Em 1280, por exemplo, na cidade de Newcastle, na Inglaterra um homem chamado Richard queixou-se ao rei de que 10 tosquias de lã lhe foram tomadas por alguns mercadores. Queria sua lã de volta. O rei mandou chamar os tais mercadores e perguntou-lhes por que haviam tomado a lã de Richard. Estes alegaram em sua defesa, que o Rei Henrique III lhes concedera que "os cidadãos da referida cidade poderiam ter uma corporação  de Mercadores no dito burgo com todos os privilégios e isenções habituais. Indagados acerca dos privilégios que reivindicam como pertencentes à Corporação citada, declararam que ninguém, a menos que gozasse das imunidades da Corporação poderia cortar as peças de fazenda para vender na cidade, nem carne ou peixe nem comprar couros frescos, nem adquirir lã pela tosquia”... Richard, decerto, não era membro da sociedade, que desfrutava o direito exclusivo de comerciar com lã.

Em Southampton, ao que parece, os não-membros podiam adquirir mercadorias - mas à sociedade de mercadores cabiam os primeiros negócios e "nenhum habitante ou estrangeiro trocará ou comprará qualquer espécie de mercadoria que chegue à cidade, antes dos membros da Corporação dos Mercadores, e enquanto um membro da sociedade estiver presente e deseje trocá-la ou comprá-la; e se alguém o fizer e for considerado culpado, aquilo que comprar será confiscado pelo rei."

E exatamente como as associações de mercadores tentaram manter a distância os não-membros, foram igualmente bem sucedidas em conservar fora de seu comércio de província os mercadores estrangeiros. Seu objetivo único era possuir o controle total do mercado. Quaisquer mercadorias que entrassem ou saíssem da cidade tinham que passar por suas mãos. Devia ser eliminada a concorrência de fora. Os preços das mercadorias deviam ser determinados pelas associações. Em todas as fases do jogo, eram elas que desempenhariam o papel principal. O controle do mercado teria que ser seu monopólio exclusivo.

Claro está que, para exercer tal poder, a fim de conquistar esse monopólio do comércio nas diversas cidades, as associações de mercadores deviam ser influentes junto às autoridades. E eram. Como constituíam o grupo mais importante da cidade, os mercadores opinavam na escolha dos funcionários da cidade. Em algumas regiões, os funcionários estavam sob sua influência; em outras, eles próprios tornavam-se os funcionários; e ainda em umas poucas, a lei estipulava, expressamente, que apenas os membros das corporações podiam ocupar postos no governo da cidade. Era um caso raro, mas acontecia, como a prova o regulamento da cidade de Preston, na Inglaterra, redigido em 1328: "... nenhum dos cidadãos, feitos cidadãos por registro nos tribunais e fora da Corporação dos Mercadores, nunca será Alcaide, avalista ou funcionário, mas apenas os cidadãos cujos nomes estejam incluídos na Corporação dos Mercadores; porque o rei concede a liberdade aos cidadãos que integram a Corporação e a nenhum outro." As associações de mercadores, tão ávidas em obter privilégios monopolistas e tão observadoras de seus direitos, mantinham seus membros numa linha de conduta determinada por uma série de regulamentos que todos tinham de cumprir. O integrante da sociedade gozava de certas vantagens, mas só podia permanecer como membro se seguisse à risca as regras da associação. Estas eram muitas e rígidas. Rompê-las podia significar a expulsão total ou outras formas de punição. Um método particularmente interessante é o que adotava uma corporação em Chester, Inglaterra, há mais de 300 anos. Em 1614, a Companhia de Negociantes de Fazendas e Forrageiros, de Chester, ao descobrir que T. Aldersley violara suas normas, ordenou-lhe que fechasse a loja. Ele recusou. "Assim, todos os dias, dois outros [da companhia] caminhavam o dia todo diante da mencionada loja e impediam todos quantos se dirigiam à loja de aí comprar seus artigos e detinham os que iam comprar mercadorias." É lícito supor que o Senhor Aldersley não podia pôr termo a esses piquetes, obtendo um mandado contra eles, no estilo do século XX, porque a corporação era por demais poderosa. De fato, o poder das associações de mercadores não se limitava às suas próprias localidades, mas alcançava regiões distantes. A famosa Liga Hanseática da Alemanha é o exemplo vivo de uma aliança de sociedades numa poderosa organização. Possuía postos de comércio, que eram fortalezas, bem como armazéns, espalhados da Holanda à Rússia. Tão poderosa era essa liga que, no ápice do poder, contava com cerca de 100 cidades, que praticamente monopolizavam o comércio do Norte da Europa com o resto do mundo. Constituía um Estado em si, no qual estabelecia tratados comerciais, protegia sua frota mercante com navios de guerra próprios, limpava de piratas os mares do Norte e tinha suas assembléias de governo, que elaboravam suas próprias leis.

Os direitos que mercadores e cidades conquistaram refletem a importância crescente do comércio como fonte de riqueza. E a posição dos mercadores na cidade reflete a importância crescente da riqueza em capital em contraste com a riqueza em terras.

Nos primórdios do feudalismo, a terra, sozinha, constituía a medida da riqueza do homem. Com a expansão do comércio, surgiu um novo tipo de riqueza - a riqueza em dinheiro. No início da era feudal, o dinheiro era inativo, fixo, móvel; agora tornara-se ativo, vivo, fluido. No início da era feudal, os sacerdotes e guerreiros, proprietários de terras, se achavam num dos extremos da escala social, vivendo do trabalho dos servos, que se encontravam no outro extremo. Agora, um novo grupo surgia a classe média, vivendo de uma forma nova, da compra e da venda. No período feudal, a posse da terra, a única fonte de riqueza, implicava o poder de governar para o clero e a nobreza. Agora, a posse do dinheiro, uma nova fonte de riqueza, trouxera consigo a partilha no governo, para a nascente classe média.

A maioria dos negócios é hoje realizada com dinheiro emprestado, sobre o qual pagam juros. Se a United States Steel Company quiser comprar outra empresa de aço que lhe estiver fazendo concorrência, provavelmente tomará emprestado o dinheiro. Poderá conseguir isso emitindo ações que são simplesmente promessa de devolver, com juros, qualquer soma de dinheiro que o comprador de ações empreste. Quando o dono da loja da esquina pretende adquirir coisas novas para seu negócio, vai ao banco tomar emprestado o dinheiro. O banco empresta determinada importância, cobrando juros. O fazendeiro que quiser comprar uma terra adjacente à sua fazenda pode hipotecar sua propriedade para conseguir o dinheiro. A hipoteca é simplesmente um empréstimo ao fazendeiro sob juros anuais. Estamos tão acostumados a esse pagamento de juros pelo dinheiro emprestado que tendemos a considerá-lo "natural", como coisa que tenha existido sempre.

Mas não existiu. Houve época em que se considerava crime grave cobrar juros pelo uso do dinheiro. No principio da Idade Média o empréstimo de dinheiro a. juros era proibido por uma Potência, cuja palavra constituía a lei para toda a Cristandade. Essa potência era a Igreja. Emprestar a juros, dizia ela, era usura, e a usura era PECADO. A palavra vai em letras maiúsculas porque assim era considerado qualquer pronunciamento da Igreja naquela época. E um pronunciamento que ameaçasse com a danação eterna aqueles que o violavam, tinha particular importância. Na época feudal, a influência da Igreja sobre o espírito do povo era muito maior do que hoje. Mas não era apenas a Igreja que condenava a usura. Os governos municipais e mais tarde os governos dos Estados baixaram leis contra ela. Uma "lei contra a usura"' aprovada na Inglaterra dizia: "Sendo a usura pela palavra de Deus estritamente proibida, como vicio dos mais odiosos e detestáveis proibição essa que nenhum ensinamento ou persuasão pode fazer penetrar no coração de pessoas ambiciosas, sem caridade e avarentas deste Reino fica determinado que nenhuma pessoa ou pessoas de qualquer classe, estado, qualidade ou condição, por qualquer meio corrupto, artificioso ou disfarçado, ou outro, emprestem, dêem, entreguem ou passem qualquer soma ou somas de dinheiro para qualquer forma de usura, aumento, lucro, ganho ou juro a ser tido, recebido ou esperado, acima da soma ou somas dessa forma emprestadas sob pena de confisco da soma ou somas emprestadas bem como da usura e ainda da punição de prisão." Essa lei era um reflexo do que a maioria das pessoas na Idade Média pensava sobre a usura. Concordavam em que era um mal. Mas, por quê? Como surgira essa atitude para com o juro? Devemos procurar nas relações da sociedade feudal a resposta.

Naquela sociedade, onde o comércio era pequeno e a possibilidade de investir dinheiro com lucro praticamente não existia, se alguém desejava um empréstimo, certamente não tinha por objetivo o enriquecimento, mas precisava dele para viver. Tomava o empréstimo simplesmente porque alguma desgraça lhe ocorrera. Talvez lhe morresse a vaca, ou a seca lhe tivesse arruinado as colheitas. Estava em má situação e necessitava de ajuda. De acordo com o sentimento medieval, a pessoa que, nessas circunstâncias, o ajudasse, não deveria lucrar com sua desventura. O bom cristão ajudava o vizinho sem pensar em lucro. Se emprestava a alguém um saco de farinha, esperava receber de volta apenas um saco de farinha, e nada mais. Se recebesse mais, estaria explorando o companheiro - o que não se considerava

justo. O justo era receber apenas o que se emprestara, e nada mais nem menos. A Igreja ensinava que havia o certo e o errado em todas as atividades do homem. O padrão do que era certo ou errado na atividade religiosa não diferia das demais atividades sociais ou, mais importante ainda, do padrão das atividades econômicas.

As regras da Igreja sobre o bem e o mal aplicavam-se a todos os setores, igualmente.

Hoje em dia, é possível fazer,. num negócio comercial, a um estranho, o que não faríamos a um amigo ou vizinho. Temos padrões diferentes para os negócios, e que não se aplicam a outras atividades. Assim, o industrial fará tudo ao seu alcance para esmagar um concorrente. Venderá com prejuízo, se empenhará numa guerra comercial, conseguirá descontos especiais, tentará todos os recursos possíveis para encurralar seu rival. Essas atividades arruinarão o competidor. O industrial ou comerciante sabe disso, mas não obstante continua a realizá-las, porque "negócio é negócio". No entanto essa mesma pessoa não permitiria, nem pois um minuto, que um amigo ou vizinho passasse fome. Essa existência de um padrão para a atividade econômica e outra pura a atividade não-econômica era contrária aos ensinamentos da Igreja na Idade Média. E a maioria das pessoas acreditava geralmente nos ensinamentos da Igreja.

A Igreja ensinava que, se o lucro do bolso representava a ruína da alma, o bem-estar espiritual é que estava em primeiro lugar. "Que lucro terá o homem, se ganhar todo o mundo e perder sua alma?" Se alguém obtivesse numa transação mais do que o devido, estaria prejudicando a outrem, e isso estava errado. Santo Tomás de Aquino, o maior pensador religioso da Idade Média, condenou a "ambição do ganho". Embora se admitisse, com relutância, que o comércio era útil, os comerciantes não tinham o direito de obter numa transação mais do que o justo pelo seu trabalho.

Os homens da Igreja na Idade Média teriam condenado fortemente o intermediário que, alguns séculos mais tarde, se tornara, segundo a definição de Disraeli, "um homem que trapaceia de um lado e saqueia do outro". A moderna noção de que qualquer transação comercial é lícita desde que seja possível realizá-la não fazia parte do pensamento medieval. O homem de negócios bem sucedido de hoje, que compra pelo mínimo e vende pelo máximo, teria sido duas vezes excomungado na Idade Média. O comerciante, porque exercia um serviço público necessário, tinha direito a uma boa recompensa e a nada mais do que isso.

Também não se considerava ético acumular mais dinheiro do que o necessário para a manutenção própria. A Bíblia era clara quanto a isso: "Ë mais fácil um camelo passar pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no Reino dos Céus." Um autor da época assim se manifestou: "Quem tem o bastante para satisfazer suas necessidades, e não obstante trabalha incessantemente para adquirir riquezas, seja para conseguir uma posição social melhor, seja para viver mais tarde sem trabalhar, ou. para que seus filhos se tornem homens de riqueza e importância - todos esses estão dominados por uma avareza, sensualidade ou orgulho condenáveis." Os que estavam habituados aos padrões de uma economia natural simplesmente aplicaram tais padrões à nova economia monetária em que se viram. Assim, se alguém emprestava a outro cem libras, julgava-se que tinha o direito moral de exigir de volta apenas cem libras. Quem cobrasse juros pelo uso do dinheiro estaria vendendo tempo, e tempo não pertence a ninguém, para que possa ser vendido. O tempo pertence a Deus, e ninguém tinha o direito de vendê-lo.

Além disso, emprestar dinheiro e receber de volta não apenas o total emprestado, mas também um juro fixo, significava a possibilidade de viver sem trabalhar - o que estava errado. (Pelo pensamento medieval, os sacerdotes e guerreiros estavam "trabalhando" nas ocupações para as quais estavam habituados. Alegar que o dinheiro é quem trabalhava para seu dono seria apenas irritar os homens da Igreja. Teriam respondido que o dinheiro era estéril, não podia produzir nada. Cobrar juros era totalmente errado - dizia a Igreja).

Isso é o que ela dizia. O que dizia e o que fazia, porém, eram duas coisas totalmente diferentes. Embora os bispos e reis combatessem e fizessem leis contra os juros, estavam entre s primeiros a violar tais leis. Eles mesmos tomavam empréstimos, ou os faziam, a juros - exatamente quando combatiam outros usurários! Os judeus, que geralmente concediam pequenos empréstimos a juros enormes porque corriam grande risco, eram odiados e perseguidos, desprezados em toda parte como usurários. Os banqueiros italianos emprestavam dinheiro em grande escala, fazendo negócios enormes - e freqüentemente, quando seus juros não eram pagos, o próprio Papa ia cobrá-los, ameaçando com um castigo espiritual! Mas a despeito do fato de ser um dos maiores pecadores, a Igreja continuava a gritar contra os usurários.

Ë fácil ver que a doutrina do pecado da usura iria limitar os processos do novo grupo de comerciantes que desejava negociar numa Europa em expansão comercialmente. Tornou-se na verdade um obstáculo quando o dinheiro começou a ter um papel cada vez mais importante na vida econômica.

A nascente classe média não guardava seu dinheiro em caixas-fortes. (Esse hábito pertence ao período feudal, quando eram limitadas as oportunidades de investimento.) O novo grupo de mercadores podia empregar todo o dinheiro de que dispusesse e mais ainda. Para manter seu negócio, para ampliar o campo de suas operações e aumentar os lucros, o comerciante precisava de mais dinheiro. Onde obtê-lo? Podia recorrer aos que emprestavam, aos judeus, como Antônio, o Mercador de Veneza, recorreu a Shylock, o Judeu. Ou podia procurar comerciantes maiores - alguns dos quais haviam deixado de comerciar com mercadorias para comerciar com dinheiro - e que eram os grandes banqueiros do período. Não era fácil, porém. Essa lei da Igreja barrava o caminho, proibindo aos banqueiros ou usurários o empréstimo a juros.

Que aconteceu então, quando a doutrina da Igreja, destinada a uma economia antiga, chocou-se com a força histórica representada pelo aparecimento da classe de comerciantes? Foi a doutrina quem cedeu. Não de uma só vez, evidentemente. Lentamente, centímetro por centímetro, nas novas leis que diziam: "A usura é um pecado - mas, sob certas circunstâncias”..., ou então: "Embora seja pecado exercer a usura, não obstante em casos especiais”...

Os casos especiais que neutralizavam a doutrina da usura são esclarecedores. Se o banqueiro B emprestasse dinheiro ao comerciante M, não estava certo que cobrasse juros pelo empréstimo. Mas, dizia a Igreja, como o comerciante M ia usar o dinheiro que tomara emprestado do banqueiro B para uma aventura comercial na qual toda a importância poderia ser perdida, era então justo que M devolvesse a B não - só o que lhe tomara emprestado, mas também um pouquinho mais para compensar B do risco que correra.

Ou então, se o banqueiro B tivesse guardado o dinheiro, poderia tê-lo empregado para obter lucro, sendo por isso justo que o comerciante M ao devolver o empréstimo pagasse um pouco mais, para compensar ao banqueiro a não-utilização do dinheiro.

Dessa e de outras formas, a doutrina da usura foi medicada, para atender às novas condições. É bastante significativo que Charles Dumoulin, advogado francês que escreveu no século XVI, tenha alegado a "prática comercial diária como justificativa para a legalização de uma "usura moderada e aceitável". Eis aqui sua argumentação: "A prática comercial diária mostra que a utilidade do uso de uma soma considerável de dinheiro não é pequena nem permite dizer que o dinheiro por si não frutifica; pois nem mesmo os campos frutificam sozinhos, sem gastos, trabalho e indústria dos homens; o dinheiro, da mesma forma, mesmo quando deve ser devolvido dentro de um prazo, proporciona nesse período um produto considerável, pela indústria do homem. E por vezes priva a quem empresta de tudo aquilo que traz a quem o toma emprestado. Portanto, toda a condenação, todo o ódio à usura, deve ser compreendido como aplicável à usura excessiva e absurda, não à usura moderada e aceitável."“

Assim, aos poucos foi desaparecendo a doutrina da usura da Igreja, e a pratica comercial diária" passou a predominar. Crenças, leis, formas de vida em conjunto, relações pessoais tudo se modificou quando a sociedade ingressou em nova fase de desenvolvimento.


sábado, 12 de outubro de 2013

RESENHA DO LIVRO PEDAGOGIA DA AUTONOMIA DE PAULO FREIRE



FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à
prática docente. São Paulo: Paz e Terra, 2008.
Síntese elaborada por Carlos R. Paiva – publicada na Revista de
Educação nº 15

Capítulo l - NÃO HÁ DOCÊNCIA SEM DISCÊNCIA

Ensinar não é transferir conhecimentos e conteúdos, nem formar é a ação pela qual um sujeito
criador dá forma, estilo ou alma a um corpo indeciso e acomodado. Não
há docência sem discência, as duas se explicam, e seus sujeitos,
apesar das diferenças, não se reduzem à condição de objeto um do
outro. Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao
aprender. Ensinar exige rigorosidade metodológica Ensinar não se esgota
no tratamento do objeto ou do conteúdo, superficialmente feito, mas se
alonga à produção das condições em que aprender criticamente é
possível. E estas condições exigem a presença de educadores e de
educandos criadores, investigadores, inquietos, curiosos, humildes e
persistentes. Faz parte das condições em que aprender criticamente é
possível a pressuposição, por parte dos educandos, de que o educador
já teve ou continua tendo experiência da produção de saberes, e que
estes, não podem ser simplesmente transferidos a eles. Pelo contrário,
nas condições de verdadeira aprendizagem, tanto educandos quanto
educadores transformam-se em sujeitos do processo de aprendizagem. Só
assim podemos falar realmente de saber ensinado, em que o objeto
ensinado é aprendido na sua razão de ser. Percebe-se, assim, a
importância do papel do educador, com a certeza de que faz parte de
sua tarefa docente não apenas ensinar os conteúdos, mas também ensinar
a pensar certo - um professor desafiador, crítico. Ensinar exige
pesquisa Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Hoje se fala
muito no professor pesquisador, mas isto não é uma qualidade, pois faz
parte da natureza da prática docente a indagação, a busca, a pesquisa.
Precisamos que o professor se perceba e se assuma como pesquisador.
Pensar certo é uma exigência que os momentos do ciclo gnosiológico
impõem à curiosidade que, tornando-se mais e mais metodologicamente
rigorosa, transforma-se no que Paulo Freire chama de "curiosidade
epistemológica". Ensinar exige respeito aos saberes dos educandos A
escola deve respeitar os saberes dos educandos – socialmente
construídos na prática comunitária - discutindo, também, com os
alunos, a razão de ser de alguns deles em relação ao ensino dos
conteúdos. Por que não aproveitar a experiência dos alunos que vivem
em áreas descuidadas pelo poder público para discutir a poluição dos
riachos e dos córregos e os baixos níveis de bem-estar das populações,
os lixões e os riscos que oferecem à saúde? Por que não associar as
disciplinas estudadas à realidade concreta, em que a violência é a
constante e a convivência das pessoas com a morte é muito maior do que
com a vida? Ensinar exige criticidade A superação, ao invés da ruptura,
se dá na medida em que a curiosidade ingênua, associada ao saber
comum, se criticiza, aproximando-se de forma cada vez mais
metodologicamente rigorosa do objeto cognoscível, tornando-se
curiosidade epistemológica.
Muda de qualidade, mas não de essência, e essa mudança não se dá
automaticamente. Essa é uma das principais tarefas do educador
progressista - o desenvolvimento da curiosidade crítica, insatisfeita,
indócil. Ensinar exige estética e ética A necessária promoção da
ingenuidade à criticidade não pode ser feita sem uma rigorosa formação
ética e estética. Decência e boniteza andam de mãos dadas. Mulheres e
homens, seres histórico-sociais, tornamo-nos capazes de comparar, de
valorar, de intervir, de escolher, de decidir, de romper. Por tudo
isso nos fizemos seres éticos. Só somos porque estamos sendo. Estar
sendo é a condição, entre nós, para ser. Não é possível pensar os
seres humanos longe da ética. Quanto mais fora dela, maior a
transgressão. Ensinar exige a corporificação das palavras pelo
exemplo Quem pensa certo está cansado de saber que palavras sem exemplo
pouco ou nada valem. Pensar certo é fazer certo (agir de acordo com o
que pensa). Não há pensar certo fora de uma prática testemunhal, que o rediz em
lugar de desdizê-lo. Não é possível ao professor pensar que pensa
certo (de forma progressista), e, ao mesmo tempo, perguntar ao aluno
se "sabe com quem está falando". Ensinar exige risco, aceitação do novo
e rejeição a qualquer forma de discriminação. É próprio do pensar certo
a disponibilidade ao risco, a aceitação do novo que não pode ser
negado ou acolhido só porque é novo, assim como critério de recusa ao
velho não é o cronológico. O velho que preserva sua validade encarna
uma tradição ou marca uma presença no tempo continua novo. Faz parte
igualmente do pensar certo a rejeição mais decidida a qualquer forma
de discriminação. A prática preconceituosa de raças, de classes, de
gênero ofende a substantividade do ser humano e nega radicalmente a
democracia. Ensinar exige reflexão crítica sobre a prática A prática
docente crítica, implicante do pensar certo, envolve o movimento
dinâmico, dialético, entre o fazer e o pensar sobre o fazer. É
fundamental que, na prática da formação docente, o aprendiz de
educador assuma que o indispensável pensar certo não é presente dos
deuses nem se acha nos guias de professores que, iluminados
intelectuais, escrevem desde o centro do poder. Pelo contrário, o
pensar certo que supera o ingênuo tem de ser produzido pelo próprio
aprendiz, em comunhão com o professor formador. É preciso possibilitar
que a curiosidade ingênua, através da reflexão sobre a prática, vá
tornando-se crítica. Na formação permanente dos professores, o momento
fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática. É pensando
criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a
próxima prática. O discurso teórico, necessário à reflexão crítica,
tem de ser de tal modo concreto que quase se confunda com a
prática. Ensinar exige o reconhecimento e a assunção da identidade
cultural A questão da identidade cultural, com sua dimensão individual
e da classe dos educandos, cujo respeito é absolutamente fundamental
na prática educativa progressista, é problema que não pode ser
desprezado. Tem a ver diretamente com a assunção de nós por nós
mesmos. É isto que o puro treinamento do professor não faz, perdendo-
se na estreita e pragmática visão do processo.

Capítulo 2 - ENSINAR NÃO  É TRANSFERIR CONHECIMENTO

Ensinar não é transferir conhecimento, mas  criar as possibilidades para a sua própria construção. Quando o  educador entra em uma sala de aula, deve estar aberto a indagações,
curiosidade e inibições dos alunos: um ser crítico e inquiridor,
inquieto em face da tarefa que tem - a de ensinar e não a de
transferir conhecimento. Pensar certo é uma postura exigente, difícil,
às vezes penosa, que temos de assumir diante dos outros e com os
outros, em face do mundo e dos fatos, ante nós mesmos. É difícil,
entre outras coisas, pela vigilância constante que temos de exercer
sobre nós mesmos para evitar os simplismos, as facilidades, as
incoerências grosseiras. É difícil porque nem sempre temos o valor
indispensável para não permitir que a raiva que podemos ter de alguém
vire raivosidade, gerando um pensar errado e falso. É cansativo, por
exemplo, viver a humildade, condição sine qua non do pensar certo, que
nos faz proclamar o nosso próprio equívoco, que nos faz reconhecer e
anunciar a superação que sofremos. Sem rigorosidade metódica não há
pensar certo. Ensinar exige consciência do inacabamento Na verdade, a
inconclusão do ser é própria de sua experiência vital. Onde há vida,
há inconclusão, embora esta só seja consciente entre homens e
mulheres. A invenção da existência envolve necessariamente a
linguagem, a cultura, a comunicação em níveis mais profundos e
complexos do que ocorria e ocorre no domínio da vida, a
espiritualização do mundo, a possibilidade não só de embelezar, mas
também de enfear o mundo; tudo isso inscreveria mulheres e homens como
seres éticos. Só os seres que se tornaram éticos podem romper com a
ética. É necessário insistir na problematização do futuro e recusar
sua inexorabilidade. Ensinar exige o reconhecimento de ser condicionado
"Gosto de ser gente, inacabado, sei que sou um ser condicionado, mas,
consciente do inacabamento, sei que posso ir mais além dele. Esta é a
diferença profunda entre o ser condicionado e o ser determinado...
Afinal, minha presença no mundo não é a de quem se adapta, mas a de
quem nele se insere". E a posição de quem luta para não ser apenas
objeto, mas também sujeito da história. Histórico-sócio-culturais,
tornamo-nos seres em quem a curiosidade, ultrapassando os limites que
lhe são peculiares no domínio vital, torna-se fundante da produção do
conhecimento. Mais ainda, a curiosidade é já o conhecimento. Como a
linguagem que anima a curiosidade e com ela se anima, é também
conhecimento e não só expressão dele. Na verdade, seria uma
contradição se, inacabado e consciente do inacabamento, o ser humano
não se inserisse em tal movimento. É neste sentido que, para mulheres
e homens, estar no mundo necessariamente significa estar com o mundo e
com os outros. É na inconclusão do ser, que se sabe como tal, que se
funda a educação como processo permanente. Mulheres e homens se
tornaram educáveis na medida em que se reconheceram inacabados. O
ideal é que, na experiência educativa, educandos e educadores, juntos,
transformem este e outros saberes em sabedoria. Algo que não é
estranho a nós, educadores. Ensinar exige respeito à autonomia do ser
educando O professor, ao desrespeitar a curiosidade do educando, o seu
gosto estético, a sua inquietude, a sua linguagem, ao ironizar o
aluno, minimizá-lo, mandar que "ele se ponha em seu lugar" ao mais
tênue sinal de sua rebeldia legítima, ao se eximir do cumprimento de
seu dever de propor limites à liberdade do aluno, ao se furtar do
dever de ensinar, de estar respeitosamente presente à experiência
formadora do educando, transgride os princípios fundamentalmente
éticos de nossa existência. É neste sentido que o professor
autoritário afoga a liberdade do educando, amesquinhando o seu direito
de ser curioso e inquieto. Qualquer discriminação é imoral e lutar
contra ela é um dever, por mais que se reconheça a força dos
condicionamentos a enfrentar. A beleza de ser gente se acha, entre
outras coisas, nessa possibilidade e nesse dever de brigar. Saber que
devo respeito à autonomia e à identidade do educando exige de mim uma
prática em tudo coerente com este saber. Ensinar exige bom senso O
exercício do bom senso, com o qual só temos a ganhar, se faz no corpo
da curiosidade. Neste sentido, quanto mais colocamos em prática, de
forma metódica, a nossa capacidade de indagar, de comparar, de
duvidar, de aferir, tanto mais eficazmente curiosos nos podemos tornar
e mais crítico se torna o nosso bom senso. O exercício do bom senso
vai superando o que há nele de instintivo na avaliação que fazemos dos
fatos e dos acontecimentos em que nos envolvemos. O meu bom senso não
me diz o que é, mas deixa claro que há algo que precisa ser sabido. É
ele que, em primeiro lugar, me diz não ser possível o respeito aos
educandos, se não se levar em consideração as condições em que eles
vêm existindo, e os conhecimentos experienciais com que chegam à
escola. Isto exige de mim uma reflexão crítica permanente sobre minha
prática. O ideal é que se invente uma forma pela qual os educandos
possam participar da avaliação. E que o trabalho do professor deve ser
com os alunos e não consigo mesmo. O professor tem o dever de realizar
sua tarefa docente. Para isso, precisa de condições favoráveis, sem as
quais se move menos eficazmente no espaço pedagógico. O desrespeito a
este espaço é uma ofensa aos educandos, aos educadores e à prática
pedagógica. Ensinar exige humildade, tolerância e luta em defesa dos
direitos dos educadores Como ser educador sem aprender a conviver com
os diferentes? Como posso respeitar a curiosidade do educando se,
carente de humildade e da real compreensão do papel da ignorância na
busca do saber, temo revelar o meu desconhecimento? A luta dos
professores em defesa de seus direitos e de sua dignidade deve ser
entendida como um momento importante de sua prática docente, enquanto
prática ética. Ainda que a prática pedagógica seja tratada com
desprezo, não tenho por que desamá-la e aos educandos. Não tenho por
que exercê-la mal. Minha resposta à ofensa à educação é a luta
política consciente, crítica e organizada dos professores. Os órgãos
de classe deveriam priorizar o empenho de formação permanente dos
quadros do magistério como tarefa altamente política, e reinventar a
forma de lutar. Ensinar exige apreensão da realidade Como professor,
preciso conhecer as diferentes dimensões que caracterizam a essência
da minha prática. O melhor ponto de partida para estas reflexões é a
inconclusão do ser humano. Aí radica a nossa educabilidade, bem como a
nossa inserção num permanente movimento de busca. A nossa capacidade de
aprender, de que decorre a de ensinar, implica a nossa habilidade de
apreender a substantividade de um objeto. Somos os únicos seres que,
social e historicamente, nos tornamos capazes de aprender. Por isso
aprender é uma aventura criadora, muito mais rica do que meramente
repetir a lição dada. Aprender é construir, reconstruir, constatar
para mudar, o que não se faz sem abertura ao risco e à aventura do
espírito. Toda prática educativa demanda:- a existência de sujeitos -
um que, ensinando, aprende, e outro que, aprendendo, ensina (daí seu
cunho gnosiológico); - a existência de objetos, conteúdos a serem
ensinados e aprendidos;- o uso de métodos, de técnicas, de materiais.
Esta prática também implica, em função de seu caráter diretivo,
objetivos, sonhos, utopias, ideais. Daí sua politicidade, daí não ser
neutra, ser artística e moral. Exige uma competência geral, um saber
de sua natureza e saberes especiais, ligados à atividade docente. Como
professor, se a minha opção é progressista e sou coerente com ela, meu
papel é contribuir para que o educando seja o artífice de sua
formação. Devo estar atento à difícil caminhada da heteronomia para a
autonomia. "É assim que venho tentando ser professor, assumindo minhas
convicções, disponível ao saber, sensível à boniteza da prática
educativa, instigado por seus desafios..." Ensinar exige alegria e
esperança O meu envolvimento com a prática educativa jamais deixou de
ser feito com alegria, o que não significa dizer que tenha podido criá-la nos educandos. Parece-me uma contradição que uma pessoa que não
teme a novidade, que se sente mal com as injustiças, que se ofende com
as discriminações, que luta contra a impunidade, que recusa o
fatalismo cínico e imobilizante não seja criticamente esperançosa.
Ensinar exige a convicção de que a mudança é possível A realidade não
é inexoravelmente esta. E esta agora, e para que seja outra,
precisamos lutar, viver a história como tempo de possibilidade, e não
de determinação. O amanhã não é algo pré-dado, mas um desafio. Não
posso, por isso, cruzar os braços. Esse é, aliás, um dos saberes
primeiros, indispensáveis a quem pretende que sua presença se torne
convivência. O mundo não é. O mundo está sendo. O meu papel no mundo
não é só o de quem constata o que ocorre, mas também o de quem
intervém como sujeito de ocorrências. Constato, não para me adaptar,
mas para mudar. No fundo, as resistências orgânicas e culturais são
manhas necessárias à sobrevivência física e cultural dos oprimidos. É
preciso, porém, que tenhamos na resistência fundamentos para a nossa
rebeldia e não para a nossa resignação em face das ofensas. Não é na
resignação que nos afirmamos, mas na rebeldia em face das injustiças.
A rebeldia é ponto de partida, é deflagração da justa ira, mas não é
suficiente. A rebeldia, enquanto denúncia, precisa se alongar até uma
posição mais radical e crítica, a revolucionária, fundamentalmente
anunciadora. Mudar é difícil, mas é possível. Ensinar exige
curiosidade Como professor, devo saber que, sem a curiosidade que me
move, não aprendo nem ensino. A construção do conhecimento implica o
exercício da curiosidade, o estímulo à pergunta, a reflexão crítica
sobre a própria pergunta. O fundamental é que professor e alunos
saibam que a postura deles é dialógica, aberta, curiosa, indagadora e
não apassivada. A dialogicidade, no entanto, não nega a validade de
momentos explicativos, narrativos. O bom professor faz da aula um
desafio. Seus alunos cansam, não dormem. Um dos saberes fundamentais à
prática educativo-crítica é o que me adverte da necessária promoção da
curiosidade espontânea para a curiosidade epistemológica. Resultado do
equilíbrio entre autoridade e liberdade, a disciplina implica o
respeito de uma pela outra, expresso na assunção que ambas fazem de
limites que não podem ser transgredidos.

Capítulo 3 - ENSINAR É UMA ESPECIFICIDADE HUMANA
Creio que uma das qualidades essenciais que a
autoridade docente democrática deve revelar em suas relações com as
liberdades dos alunos é a segurança em si mesma. É a segurança que se
expressa na firmeza com que atua, com que decide, com que respeita as
liberdades, com que discute suas próprias posições, com que aceita
rever-se. Ensinar exige segurança, competência profissional e
generosidade - A segurança com que a autoridade docente se move
implica uma outra, fundada na sua competência profissional. Nenhuma
autoridade docente se exerce ausente desta competência. O professor
que não leva a sério sua formação, que não estuda, que não se esforça
para estar à altura de sua tarefa não tem força moral para coordenar
as atividades de sua classe. A incompetência profissional desqualifica
a autoridade do professor. Outra qualidade indispensável à autoridade,
em suas relações com a liberdade, é a generosidade. Não há nada que
inferiorize mais a tarefa formadora da autoridade do que a mesquinhez,
a arrogância ao julgar os outros e a indulgência ao se julgar, ou aos
seus. A arrogância que nega a generosidade nega também a humildade. O
clima de respeito que nasce de relações justas, sérias, humildes,
generosas, em que a autoridade docente e as liberdades dos alunos se
assumem eticamente, autentica o caráter formador do espaço pedagógico.
A autoridade, coerentemente democrática, está convicta de que a
disciplina verdadeira não existe na estagnação, no silêncio dos
silenciados, mas no alvoroço dos inquietos, na dúvida que instiga, na
esperança que desperta. Um esforço sempre presente à prática da
autoridade coerentemente democrática é o que a torna quase escrava de
um sonho fundamental - o de persuadir ou convencer a liberdade para a
construção da própria autonomia, ainda que reelaborando materiais
vindos de fora de si. É com a autonomia, penosamente construída e
fundada na responsabilidade, que a liberdade vai preenchendo o espaço
antes habitado pela dependência. O fundamental no aprendizado do
conteúdo é a construção da responsabilidade da liberdade que se
assume. O essencial nas relações entre autoridade e liberdade é a
reinvenção do ser humano no aprendizado de sua autonomia. Nunca me foi
possível separar dois momentos - o ensino dos conteúdos da formação
ética dos educandos. O saber desta impossibilidade é fundamental à
prática docente. Quanto mais penso sobre a prática educativa,
reconhecendo a responsabilidade que ela exige de nós, mais me convenço
do nosso dever de lutar para que ela seja realmente respeitada: Ensinar
exige comprometimento Não posso ser professor sem me pôr diante dos
alunos, sem revelar com facilidade ou relutância minha maneira de ser,
de pensar politicamente. Não posso escapar à apreciação dos alunos. E
a maneira como eles me percebem tem importância capital para o meu
desempenho. Daí, então, que uma de minhas preocupações centrais deva
ser a de procurar a aproximação cada vez maior entre o que digo e o
que faço, entre o que pareço ser e o que realmente estou sendo. Isto
aumenta em mim os cuidados com o meu desempenho. Se a minha opção é
democrática, progressista, não posso ter uma prática reacionária,
autoritária, elitista. Minha presença de professor é, em si, política.
Enquanto presença, não posso ser uma omissão, mas um sujeito de
opções. Devo revelar aos alunos a minha capacidade de analisar, de
decidir, de optar e de romper, minha capacidade de fazer justiça, de
não falhar à verdade. Ético, por isso mesmo, tem que ser o meu
testemunho. Ensinar exige compreender que a educação é uma forma de
intervenção no mundo Outro saber de que 'não posso duvidar na minha
prática educativo-crítica é que, como experiência especificamente
humana, a educação é uma forma de intervenção no mundo. Intervenção
esta que, além do conhecimento dos conteúdos, bem ou mal ensinados e/
ou aprendidos, implica tanto o esforço da reprodução da ideologia
dominante quanto o seu desmascaramento. Nem somos seres simplesmente
determinados nem tampouco livres de condicionamentos genéticos,
culturais, sociais, históricos, de classe, de gênero, que nos marcam e
a que nos achamos referidos. Continuo aberto à advertência de Marx, a
da necessária radicalidade, que me faz sempre desperto a tudo o que
diz respeito à defesa dos interesses humanos. Interesses superiores
aos de grupos ou de classes de pessoas. Não posso ser professor se não
percebo cada vez melhor que, por não poder ser neutra, minha prática
exige de mim uma definição, uma tomada de posição, uma ruptura. Exige
que eu escolha entre isto e aquilo. Não posso ser professor a favor de
quem quer que seja e a favor de não importa o quê. Não posso ser
professor a favor simplesmente da Humanidade, frase de uma vaguidade
demasiado contrastante com a concretude da prática educativa. Sou
professor a favor da decência contra o despudor, a favor da liberdade
contra o autoritarismo, da autoridade contra a licenciosidade, da
democracia contra a ditadura. Sou professor a favor da luta constante
contra qualquer forma de discriminação, contra a dominação econômica
dos indivíduos ou das classes sociais, contra a ordem vigente que
inventou a aberração da miséria na fartura. Sou professor a favor da
esperança que me anima, apesar de tudo. Contra o desengano que consome
e imobiliza e a favor da boniteza de minha própria prática. Tão
importante quanto o ensino dos conteúdos é a minha coerência na
classe. A coerência entre o que digo, o que escrevo e o que
faço. Ensinar exige liberdade e autoridade O problema que se coloca para
o educador democrático é como trabalhar no sentido de fazer possível
que a necessidade do limite seja assumida eticamente pela liberdade.
Sem os limites, a liberdade se perverte em licença e a autoridade em
autoritarismo. Por outro lado, faz parte do aprendizado a assunção das
conseqüências do ato de decidir. Não há decisão que não seja seguida
de efeitos esperados, pouco esperados ou inesperados. Por isso a
decisão é um processo responsável. É decidindo que se aprende a
decidir. Não posso aprender a ser eu mesmo se não decido nunca, porque
há sempre a sabedoria e a sensatez de meu pai e de minha mãe a decidir
por mim. Ninguém é autônomo primeiro para depois decidir. A autonomia
vai se construindo na experiência. Ninguém é sujeito da autonomia de
ninguém. Por outro lado, ninguém amadurece de repente. A gente vai
amadurecendo todo dia, ou não. A autonomia é um processo, não ocorre
em data marcada. É neste sentido que uma pedagogia da autonomia tem de
estar centrada em experiências estimuladoras da decisão e da
responsabilidade, ou seja, que respeitam a liberdade. Ensinar exige
tomada consciente de decisões Voltemos à questão central desta parte do
texto - a educação, especificidade humana, como um ato de intervenção
no mundo.
Quando falo em educação como intervenção me refiro tanto a que aspira
a mudanças radicais na sociedade, no campo da economia, das relações
humanas, da propriedade, do direito ao trabalho, à terra, à educação,
à saúde, quanto a que, reacionariamente, pretende imobilizar a
História e manter a ordem injusta. E que dizer de educadores que se
dizem progressistas, mas de prática pedagógica-política eminentemente
autoritária? A raiz mais profunda da politicidade da educação se acha
na educabilidade do ser humano, que se funda em sua natureza inacabada
e da qual se tornou consciente. Inacabado e consciente
disso, necessariamente o ser humano se faria um ser ético, um ser de
opção, de decisão. Um ser ligado a interesses e em relação aos quais
tanto pode manter-se fiel à ética quanto pode transgredi-la. Se a
educação não pode tudo, pode alguma coisa fundamental. Se a educação
não é a chave das mudanças, não é também simplesmente reprodutora da
ideologia dominante.
O que quero dizer é que a educação nem é uma força imbatível a serviço
da transformação da sociedade nem tampouco é a perpetuação do status
quo.
Ensinar exige saber escutar
Se, na verdade, o sonho que nos anima é democrático e solidário, não é
falando aos outros, de cima para baixo, sobretudo, como se fôssemos os
portadores da Verdade a ser transmitida aos demais, que aprendemos a
escutar, mas é escutando que aprendemos & falar com eles.Os sistemas
de avaliação pedagógica de alunos e de professores vêm se assumindo
cada vez mais como discursos verticais, de cima para baixo, mas
insistindo em passar por democráticos. A questão que se coloca a nós é
lutar em favor da compreensão e da prática da avaliação, enquanto
instrumento de apreciação do que fazer, de sujeitos críticos a
serviço, por isso mesmo, da libertação e não da domesticação.
Avaliação em que se estimule o falar a como caminho para o falar com.
Quem tem o que dizer, tem igualmente o direito e o dever de dizê-lo. É
preciso, porém, que o sujeito saiba não ser o único a ter algo a
dizer. Mais ainda, que esse algo, por mais importante que seja, não é
a verdade alvissareira por todos esperada.
Por isso é que acrescento, quem tem o que dizer deve assumir o dever
de motivar, de desafiar quem escuta, para que este diga, fale,
responda. É preciso enfatizar - ensinar não é transferir a
inteligência do objeto ao educando, mas instigá-lo no sentido de que,
como sujeito cognoscente, torne-se capaz de inteligir e comunicar o
inteligido. É neste sentido que se impõe a mim escutar o educando em
suas dúvidas, em seus receios, em sua incompetência provisória. E ao
escutá-lo, aprendo a falar com ele. Aceitar e respeitar a diferença é
uma das virtudes sem a qual a escuta não pode acontecer. Tarefa
essencial da escola, como centro de produção sistemática de
conhecimento, é trabalhar criticamente a i das coisas e dos fatos e a
sua comunicabilidade. Ensinar exige reconhecer que a educação é
ideológica Saber igualmente fundamental à prática educativa do
professor é o que diz respeito à força, às vezes, maior do que
pensamos da ideologia. É o que nos adverte de suas manhas, das
armadilhas em que nos faz cair.
A ideologia tem a ver diretamente com a ocultação da verdade dos
fatos, com o uso da linguagem para penumbrar ou opacizar a realidade,
ao mesmo tempo em que nos torna míopes. No exercício crítico de minha
resistência ao poder da ideologia, vou gerando certas qualidades que
vão virando sabedoria indispensável à minha prática docente. A
necessidade desta resistência crítica, por exemplo, me predispõe, de
um lado, a uma atitude sempre aberta aos demais, aos dados da
realidade; de outro, a uma desconfiança metódica que me defende de
tornar-me absolutamente certo das certezas. Para me resguardar das
artimanhas da ideologia não posso nem devo me fechar aos outros, nem
tampouco me enclausurar no ciclo de minha verdade. Pelo contrário, o
melhor caminho para guardar viva e desperta a minha capacidade de
pensar certo, de ver com acuidade, de ouvir com respeito, por isso de
forma exigente, é me deixar exposto às diferenças, é recusar posições
dogmáticas, em que me admita como dono da verdade.
Ensinar exige disponibilidade para o diálogo Nas minhas relações com
os outros, que não fizeram necessariamente as mesmas opções que fiz,
no nível da política, da ética, da estética, da pedagogia, nem posso
partir do pressuposto que devo conquistá-los, não importa a que custo,
nem tampouco temer que pretendam conquistar-me. É no respeito às
diferenças entre mim e eles, na coerência entre o que faço e o que
digo, que me encontro com eles. O sujeito que se abre ao mundo e aos
outros inaugura, com seu gesto, a relação dialógica em que se confirma
como inquietação e curiosidade, como inconclusão em permanente
movimento na história. Como ensinar, como formar sem estar aberto ao
contorno geográfico, social, dos educandos? Com relação a meus alunos,
diminuo a distância que me separa de suas condições negativas de vida
na medida em que os ajudo a aprender não importa que saber, o do
torneio ou do cirurgião, com vistas à mudança do mundo, à superação
das estruturas injustas, jamais com vistas à sua imobilização. Debater
o que se diz e o que se mostra e como se mostra na televisão me parece
algo cada vez mais importante.
Como educadores progressistas não apenas não podemos desconhecer a
televisão, mas devemos usá-la, sobretudo, discuti-la. Não podemos nos
pôr diante de um aparelho de televisão entregues ou disponíveis ao que
vier. Ensinar exige querer bem aos educandos O que dizer e o que
esperar de mim, se, como professor, não me acho tomado por este outro
saber, o de que preciso estar aberto ao gosto de querer bem, às vezes,
à coragem de querer bem aos educandos e à própria prática educativa de
que participo. Na verdade, preciso descartar como falsa a separação
radical entre seriedade docente e afetividade. A afetividade não se
acha excluída da cognoscibilidade.
O que não posso, obviamente, permitir é que minha afetividade
interfira no cumprimento ético de meu dever de professor no exercício
de minha autoridade. Não posso condicionar a avaliação do trabalho
escolar de um aluno ao maior ou menor bem querer que tenha por ele. É
preciso, por outro lado, reinsistir em que não se pense que a prática
educativa vivida com afetividade e alegria prescinda da formação
científica séria e da clareza política dos educadores. Nunca idealizei
a prática educativa. Em tempo algum a vi como algo que, pelo menos,
parecesse com um que-fazer de anjos. Jamais foi fraca em mim a certeza
de que vale a pena lutar contra os descaminhos que nos obstaculizam de
ser mais.
Como prática estritamente humana, jamais pude entender a educação como
uma experiência fria, sem alma, em que os sentimentos e as emoções, os
desejos e os sonhos devessem ser reprimidos por uma espécie de
ditadura reacionalista. Jamais compreendi a prática educativa como uma
experiência a que faltasse o rigor em que se gera a necessária
disciplina intelectual. Estou convencido de que a rigorosidade, a
séria disciplina intelectual, o exercício da curiosidade
epistemológica não me fazem necessariamente um ser mal-amado,
arrogante, cheio de mim mesmo. Nem a arrogância é sinal de competência
nem a competência é causa de arrogância. Certos arrogantes, pela
simplicidade, se fariam gente melhor.

domingo, 22 de setembro de 2013

1889

Hoje acabei de ler 1889, muito bom. Recomendo. Sem sombras de dúvidas o Laurentino é uma porta que se abre para estudarmos vários assuntos da História Brasileira.

Após a leitura aproveitei para ver a entrevista do autor no roda viva no seguinte endereço:
http://youtu.be/FFIXmVuWd9U

Notem que esse é o Bloco um, tem mais três.

domingo, 1 de setembro de 2013

1889 - E JÁ LI



Já comprei, estou lendo e de primeira mão, já estou recomendando. Muito bom!

Gostei do que o Laurentino escreveu nas paginas 26 e 27:

   "Durante décadas, o brasileiro relutou, com certa razão, a se identificar com a sua tortuosa história republicana, permeada de golpes militares, ditaduras, intervenções e mudanças bruscas nas instituições e brevíssimos períodos de exercício da democracia. A boa notícia é que essa história mal-amada talvez esteja finalmente mudando. O Brasil exibe hoje ao mundo quase três décadas de exercício continuado da democracia, sem rupturas. Isso nunca aconteceu antes. É a primeira vez que todos os brasileiros estão sendo, de fato, chamados a participar da construção nacional. Apesar das dificuldades óbvias do presente, as promessas republicanas começam a ser postas em prática na forma de mais educação, mais saúde, mais trabalho e mais oportunidades para todos.
   "É curioso observar que este momento de transformação coincide também com um outro fenômeno inteiramente novo na sociedade brasileira. É o interesse pelo estudo da História do Brasil. Ele pode ser observado no mercado editorial de livros, que nunca vendeu tantas obras sobre o tema, e no grande número de títulos de revistas, sites de internet e outras publicações dedicadas ao assunto. Por que História se tornou um tema popular nos últimos anos? Existem várias respostas possíveis, mas uma delas é seguramente que os brasileiros estão olhando o passado em busca de explicações para o país de hoje. Dessa maneira, procuram também se aparelhar mais adequadamente para a construção do futuro. Isso também é uma excelente notícia. Uma sociedade que não estuda História não consegue entender a si própria porque desconhece suas raízes e razões que a trouxeram aqui. E, se não consegue entender a si mesma, provavelmente também não estará preparada para construir o futuro de forma organizada. O estudo de história é hoje, talvez até mais do que qualquer outra disciplina, uma ferramenta fundamental na construção do Brasil dos nossos sonhos em um novo ambiente de democracia."

Concordo com o Laurentino e tenho convicção que suas obras, 1808, 1822 e, agora, este 1889, contribuíram e contribuirão muito para esse retorno as nossas raízes.



O SISTEMA OLIGÁRQUICO DA REPUBLICA VELHA





O regime republicano inaugurado a 15 de novembro de 1889 correspondeu à necessidade de prover-se hegemonia política ao grupo que, desde a segunda metade do século XIX, vinha se afirmando como economicamente dominante: os cafeicultores. O poder político, já na década de 1890, concentrou-se em suas mãos, dentro da dinâmica da ‘política dos governadores’ inaugurada por Campos Sales. Esse esquema de dominação, que alijava os demais grupos do centro decisório, pôde manter-se graças a um sistema eleitoral que permitia manipulações, desde a fraude à violência física.

O setor agroexportador engendrou uma fórmula política que refletia sua estrita dependência em relação ao sistema capitalista internacional. O liberalismo era o manancial ideológico desse poder. Os princípios de livre concorrência, de superioridade da economia de mercado justificavam a divisão internacional do trabalho — que nos reservara o papel ‘natural’ de produtores de matérias-primas — e a dominação do setor agroexportador sob o conjunto da economia nacional. Ao mesmo tempo, o liberalismo impedia qualquer forma de intervenção estatal, garantindo a autonomia dos Estados, que de certa forma se manifestava, juridicamente, na própria Federação. A descentralização administrativa legitimava a hegemonia dos grupos oligárquicos de maior expressão econômica, enquanto os de­mais grupos se articulavam a estes, unidos por uma identidade fundamental: a propriedade da terra. Mantinha-se, assim, o equilíbrio político a nível nacional, pois não havendo antagonismos profundos entre os proprietários de terra, a autonomia federativa garantia os interesses de cada oligarquia em seu âmbito específico. Os atritos e dissidências ocorridos no período apenas retrataram divergências imediatas, conflitos de ambições eleiçoeiras, ou, então, nos momentos de crise, prejuízos dos grupos não vinculados ao café, pelas medidas de defesa do produto.

A própria manutenção da hegemonia dos cafeicultores, entretanto, ao permitir lucros crescentes, implicou no desenvolvimento econômico, na urbanização, na acumulação de capital pelos excedentes da exportação e no incentivo à produção industrial. Surgiram, então, forças econômicas e sociais que iriam, gradualmente, reivindicar participação política e contestar o regime vigente.

O sistema político e econômico estruturado pela oligarquia cafeeira era, porém, muito rígido. Nele não cabiam canais de representação para os novos grupos, nem mecanismos que pudessem neutralizar os efeitos crescentes das flutuações econômicas internacionais. O sistema de defesa do café, primeiramente apoiado na desvalorização de nossa moeda e depois na compra e estocagem do produto, implicava em custo social geral. Em momentos de crise aguda, os grupos sociais não vinculados ao setor tornavam-se antagônicos e a insatisfação crescia nos setores urbanos.

Em geral, porém, até a década de 1920, as camadas médias urbanas, os operários e os trabalhadores urbanos foram mantidos à margem da expressão política. As camadas médias urbanas constituíam um aglomera­do heterogêneo, incapaz de articular contestações além das reivindicações de contenção do custo de vi­da, de melhores moradias ou de ‘verdade eleitoral’. Os trabalhadores rurais, mantidos na ignorância e dentro do rígido círculo do controle coronelístico, não ultra­passavam os limites da violência social expressa no banditismo ou no fanatismo religioso. O operariado urbano, pressionado por baixos salários, por castigos corporais, pela ausência de qualquer proteção, lentamente se articulava.

O desenvolvimento da urbanização e da industrialização, subjacentes ao progresso do setor cafeeiro, faziam, entretanto, avançar a diferenciação social. O aumento gradativo das camadas intermediárias urbanas e, conseqüentemente, seu maior peso político, ao lado do crescimento da capacidade de organização e de mobilização do operariado, evidenciaram as limitações do sistema oligárquico, nos anos vinte. Os setores urbanos, a partir de então, manifestaram-se ativamente, aliando-se às dissidências oligárquicas, apoiando o movimento tenentista e reivindicando efetiva participação política.

O movimento operário crescia e não era mais possível ignorar sua importância, por mais desarticuladas e descontínuas que fossem suas manifestações. A indústria, nascida à sombra dos cafezais, estimulada e nutri­da pelos capitais cafeeiros, organizava-se.

A hegemonia oligárquica entrava em crise. O que fora novo em velho se tornara, ultrapassado pelo desenvolvimento do setor que ele mesmo criara. Era preciso redefinir o pacto social e dissolver o acordo político que sustentava o regime. Era fundamental encontrar saídas para a economia agroexportadora, afogada pela superprodução e pelo desequilíbrio do mercado. Era inadiável atender à questão social e absorver suas reivindicações, regulamentando as relações entre capital e trabalho. A crise interna caminhava, assim, para a redefinição do papel do Estado e para a formulação de soluções que pudessem combater a crise econômica, que se delineava.

Apoiado pela manipulação do voto rural, o sistema oligárquico não podia adaptar-se à estrutura social e econômica do país, que caminhava para a industrialização. O poder dos cafeicultores estava ferido de morte. O sistema partidário que lhe garantira sustentação estava esgotado e as dissidências, agora, eram profundas.

A República oligárquica desabava. Velha, sentia-se sua incapacidade em assimilar as mudanças internas. Débil, era pressionada pela crise econômica mundial. Não era um fim violento, dramático. Era a destruição paulatina de um sistema político-econômico, desencadeada a partir de suas contradições internas e acelera­da pela crise mundial.

Desde 1922 o processo de contestação do regime tinha, em sua vanguarda, o movimento tenentista. Este, se não era, essencialmente, um movimento coeso e de ideologia precisa, representava, de qualquer forma, renovação. E suas manifestações em favor de um regime mais representativo foram endossadas pelas facções descontentes e pela maioria da população urbana.

A solução tenentista não era, porém, a única ver­tente revolucionária do fim da década de 20. Várias eram as propostas políticas que se articulavam para modificar a estrutura de dominação em vigor. Revolução era o tema principal do Partido Democrático de São Paulo e revolução era a aspiração dos setores operários em ascensão.

O processo que culminou com a deposição de Washington Luís, em 1930, foi a revolução vencedora, articulada pelas elites dissidentes. Cabia a estas o papel de reorganizar a sociedade, controlar a crise, neutralizar as forças sociais em conflito questões cruciais que marcarão indelevelmente o quadro histórico aberto com a Revolução de 1930”.


José Jobson de Andrade Arruda

Veja também:

ARQUEOLOGIA E PALEONTOLOGIA: DOIS MUNDOS, UM MESMO FASCÍNIO PELO PASSADO

Quando falamos em escavar o solo em busca de vestígios do passado, muitas pessoas imediatamente pensam em fósseis de dinossauros e utensílio...

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