segunda-feira, 10 de setembro de 2018

ROSACRUZ - FALA-SE MUITO, CONHECE-SE POUCO...



         Rosacruz é um movimento filosófico que se popularizou na Europa do século XVII após a publicação de vários textos que pretendiam anunciar a existência de uma ordem esotérica até então desconhecida para o mundo.
        
Rosacruz é um nome atribuído com base no lendário personagem Christian Rosenkreutz que é o ponto de partida para várias organizações rosacruzes. A misteriosa doutrina da ordem é supostamente “construída sobre verdades esotéricas do passado antigo”, que “oculta ao homem comum, fornece uma visão da natureza, do universo físico e do domínio espiritual”.
        
Seus manifestos não falavam extensivamente sobre o assunto, mas mencionavam a Kabbalah, o Hermetismo e o Cristianismo. O movimento era então tido em conta como um “Colégio de Invisíveis” nos mundos internos, formado por grandes adeptos, com o intuito de prestar auxílio à evolução espiritual da humanidade.
         
Alguns metafísicos consideram que o rosacrucianismo pode ser compreendido, de um ponto de vista mais amplo, como parte, ou mesmo como fonte, do hermetismo cristão, patente no período dos tratados ocidentais de alquimia que se segue à publicação da Divina Comédia de Dante. Alguns historiadores, no entanto, sugerem a sua origem num grupo de protestantes alemães, entre os anos 1607 e 1616, quando três manifestos anônimos foram elaborados e lançados na Europa: Fama Fraternitatis R.C., Confessio Fraternitatis e Núpcias Alquímicas de Christian Rozekreuz. A influência desses textos foi tão grande que a historiadora Frances Yates denominou este período do século XVII como um movimento de reforma em Tubinga dentro do protestantismo alemão.
        
Os manifestos foram publicados num momento em que o domínio científico e tecnológico da natureza levou a um distanciamento entre ciência e cultura cristã. O principal objetivo e meta dos três escritos era contrariar esta tendência, por meio de um contínua reforma da ciência, ética e religião. Sua autoimagem é baseada em uma difusão livre de preconceito e uso do conhecimento de outras culturas ainda não difundidos. Nesta época ainda não havia grupos de Rosacruzes organizados. Somente após 140 anos da publicação dos manifestos, a primeira organização Rosacruz foi fundada como ordem paramaçônica, em 1760, a Ordem Dourada dos Rosacruzes, como um polo oposto às forças racionais e modernistas. Viriam mais tarde a ser perseguidos na Prússia, sob os auspício do reinado de Guilherme II. Após o fim da Ordem Dourada, o rosacrucianismo manteve-se vivo graças à Societas Rosicruciana in Anglia (S.R.i.A), de 1865. Além disso, grupos teosóficos e herméticos, formados no fim do século XIX, também referidos como “novos rosacrucianistas”, ajudaram na difusão do rosacrucianismo.
        
Os Manifestos Rosacruzes anunciaram uma “reforma universal da humanidade”, através de uma ciência supostamente mantida secreta por décadas até que o clima intelectual possa recebe-la. As controvérsias surgiram sobre se eram um engano, se a “ordem da Rosacruz” existia como descrito nos manifestos, ou se todo era uma metáfora disfarçando um movimento que realmente existia, mas de um forma diferente. Em 1616, Johann Valentin Andreae designou-o como um “ludibrium”. Ao prometer uma transformação espiritual num momento de grande turbulência, levaram muitas pessoas a iniciar-se na busca do conhecimento esotérico e místico. Filósofos ocultistas do século XVII, como Michael Maier, Robert Fludd, e Thomas Vaughan (filósofo) se interessaram pela visão do Rosacruz do mundo.
        

De acordo com o historiador David Stevenson, influenciou a Maçonaria quando emergia na Escócia. Em séculos posteriores, muitas sociedades esotéricas alegaram derivar do movimento Rosacruz primordial.
        
Existem toda uma série de ordens que foram fundadas no século XIX e XX, que procuravam restabelecer as bases do rosacrucianismo, como é o caso da ordem hermética da aurora dourada, fundada pro maçons membros da Sociedade Rosacruciania da Inglaterra, assim como o AMORC, a Rosacruz Áurea e a Fraternidade Rosacruz. Contudo, estas ordens estão para o rosacrucianismo, como o martinismo criado por Gerard Encausse está para Louis Claude de Saint-Martin, não no sentido em que não tinham existido ordens previamente, nesses mesmos preâmbulos, mas sim pelo fato de que são reconstituições históricas de algo que tinha previamente existido, e portanto, nunca 100% fiéis ao movimento original.

LENDA E HISTÓRIA
        

Segundo a lenda constante nos referidos manifestos, a ordem teria sido fundada por Christian Rosenkreuz, peregrino do século XV. No entanto, essa datação é discutível devido ao simbolismo e hermetismo do conteúdo dos manifestos, principalmente nos aspectos numéricos e nas concepções geométricas apresentadas.
         De acordo com a narrativa exposta no documento “Fama Fraternitatis” (1614), Christian Rosenkreuz (de início apenas designado por “irmão C.R.C.”), nasceu em 1378 na Alemanha, junto ao rio Reno. Os seus pais teriam sido pessoas ilustres, mas sem grandes posses materiais. Sua educação começou aos quatro anos numa abadia onde aprendeu grego, latim, hebraico e magia. Em 1393, acompanhado de um monge, visitou Damasco, o Egito e o Marrocos onde estudou com mestres do ocultismo, depois do falecimento do seu mestre, em Chipre.
        
Após seu retorno à Alemanha, em 1407, teria fundado a Ordem Rosa Cruz (constituída por um pequeno grupo de não mais que oito pessoas), de acordo com os ensinamentos obtidos com os mestres árabes, que o teriam curado de uma doença, iniciando-o também no conhecimento das práticas do ocultismo. Teria passado, ainda, cinco anos na Espanha, onde três discípulos redigiram os textos iniciadores da sociedade. Depois, teriam formado a “Casa Sancti Spiritus” (Casa do Espírito Santo), onde, através da cura de doenças e do amparo daqueles que necessitavam de ajuda, foram desenvolvendo a confraria, que pretendia, no futuro, orientar os monarcas na boa condução dos destinos da humanidade. Segundo o texto “Fama Fraternitatis”, C.R.C. morreu em 1484. Após sua morte, a ordem se extinguiu. A localização da sua tumba permaneceu desconhecida durante 120 anos até 1604, quando foi descoberta, e então a ordem renasceu. Observe-se que “Christian Rosenkreuz” seria apenas um nome simbólico: Christian, de Cristo ou Christos ou, ainda Khrestos; Rosen ou Rosa, e Kreuz ou cruz.
        
Uma outra lenda menos conhecida, foi veiculada pelo historiador maçônico E.J.Marconis de Negre – que, juntamente com seu pai, Gabriel M. Marconis é considerado o fundador do Rito de Memphis-Misraim da maçonaria. Com base em conjecturas anteriores (1784) de um estudioso Rosacruz, o barão de Westerode, a Rosacruz teria como origem uma sociedade secreta e altamente hierarquizada (ao contrário dos ideais da fraternidade, expostos nos manifestos) do século XVIII da Europa Central ou oriental, denominada “Gold und Rosenkreuzer” (Rosacruz de Ouro), que teria tentado, sem sucesso, submeter a maçonaria ao seu poder. A Ordem Rosacruz teria sido criada no ano 46, quando um sábio gnóstico de Alexandria, de nome Ormo, e seis discípulos seus foram convertidos por Marcos, o evangelista. Seu símbolo, dizia-se, era uma cruz vermelha encimada por uma rosa, daí a designação de Rosacruz. A ordem teria nascido, portanto, da fusão do cristianismo primitivo com a mitologia egípcia. Rosenkreuz teria sido, segundo essa versão, apenas um iniciado e, depois Grande Mestre, e não o fundador.
        
Mapa da Alemanha onde a
Turíngia aparece em cor laranja
De acordo com Maurice Magre (1877-1941), no seu livro Magicians, Seers and Mystics, Rosenkreuz teria sido o último descendente da família Germelschausen, uma família alemã do século XIII. O seu castelã encontrava-se na Floresta da Turíngia, na fronteira de Hesse, e eles abraçavam as doutrinas Albigenses. Toda a família teria sido condenada à morte pelo Landgrave Conrad da Turíngia, exceto o filho mais novo, com cinco anos de idade. Ele teria sido levado secretamente por um monge, um adepto albigense do Languedoc, e colocado num mosteiro sob influência dos albigenses. Lá teria sido educado e viria a conhecer os quatro irmãos que mais tarde estariam a ele associados na fundação da irmandade Rosacruz. A história de Magre deriva supostamente da tradição oral local.
        
A existência real de Christian Rosenkreuz divide certos grupos de Rosacricianos. Alguns o aceitam, outros consideram Christian Rosenkreuz como um pseudônimo usado por personagens realmente históricos (Francis Bacon, por exemplo).

         A primeira informação conhecida publicamente, acerca desta irmandade, encontra-se nos três documentos denominados “Manifestos Rosacruz”, o primeiro dos quais (Fama Fraternitatis R.C.,, ou “Chamado da Fraternidade Rosacruz) foi publicado em Kassel, na Alemanha, em 1614, ainda que cópias manuscritas do mesmo já circulassem desde 1611. Outros dois documentos foram: Confessio Fraternitatis (Confissões da Fraternidade Rosacruz), 1615, publicado também em Kassel, e Chymische Hockeit Christiani RosenKreuz (Núpcias Alquímicas de Christian Rosenkreuz), 1616, publicado na então cidade independente de Estrasburgo (anexada à França em 1681).
        
Deve-se notar que no segundo manifesto de 1615, é feita a defesa da irmandade, exposta no primeiro manifesto de 1614, contra vozes que se levantavam da sociedade, colocando em causa a autenticidade e os reais motivos da Ordem Rosacruz. Nesse manifesto, podem-se encontrar as seguintes passagens que demonstram a linha condutora do pensamento da irmandade: que o requisito fundamental para alcançar o conhecimentos secreto, de que a ordem se faz conhecer como possuidora, é que “sejamos honestos para obter a compreensão e conhecimento da filosofia”; descrevendo-se simultaneamente como cristãos, “que pensam vocês, queridas pessoas, e como parecem afetados, vendo que agora compreendem e sabem, que nós nos reconhecemos como professando verdadeira e sinceramente Cristo”, não de um modo exotérico, “condenamos o Papa”, e sim no verdadeiro sentido esotérico do cristianismo: “viciamo-nos na verdadeira filosofia, levamos uma vida cristã. O modo como são expostos os temas nos manifestos originais e a descrição dos mesmos aponta para grande similaridade com o que é conhecido atualmente acerca da filosofia Pitagórica, principalmente na transmissão de conhecimentos e ideias através de aspectos numéricos e concepções geométricas.
        
A publicação dos manifestos provocou imensa excitação por toda a Europa. Foram feitas inúmeras reedições e circularam diversos panfletos relacionados com os textos, embora os divulgadores de tais panfletos pouco ou nada soubessem sobre as reais intenções do(s) autor(es) original(ais) dos textos, cuja identidade permaneceu desconhecida por muito tempo.
         Em sua autobiografia, o teólogo Johannes Valentinus Andreae ou Johann Valentin Andreae (1586 -1654), declarou que o terceiro manifesto Rosacruz, “Núpcias Químicas”, publicado anonimamente, era de sua autoria e posteriormente descreveu o texto como um Ludibrium. É convicção de alguns autores que Andreae o teria escrito como se fosse o contraponto da Companhia de Jesus. No entanto, esta teoria foi posteriormente contestada por historiadores, principalmente católicos, que consideravam os documentos, com simples propaganda ocultista, de inspiração protestante, contra a influência do Bispo de Roma.
        
Os manifestos mostravam a necessidade de reforma da sociedade humana, do ponto de vista cultural e religioso, e a forma de atingir esse objetivo através de uma sociedade secreta que promoveria essa mudança no mundo. O texto “Núpcias Químicas de Christian Rosenkreuz”, contudo foi escrito em forma de um romance pleno de simbolismos e descreve um episódio iniciático na vida de Christian Rosenkreuz, quando já tinha 81 anos.
         Em Paris, em 1622 ou 1623, foram colocados cartazes misteriosos nas pareces, mas não se sabe ao certo que foram os responsáveis por esse feito. Estes cartazes incluíam o texto: “Nós, os Deputados do Alto Colégio da Rosacruz, fazemos a nossa estada, visível e invisível, nesta cidade (...)” e “Os pensamentos ligados ao desejo real daquele que busca irá guiar-nos a ele e ele a nós”.



         A sociedade europeia da época, dilacerada por guerras, tantas vezes originadas por causa da religião, favoreceu a propagação destas ideias que chegaram, em pouco tempo, até a Inglaterra e a Itália.

TRADIÇÕES E INFLUÊNCIAS
        
Os primeiros seguidores são geralmente identificados como médicos, alquimistas, naturalistas, boticários, adivinhos, filósofos e homens das artes, acusados muitas vezes de charlatanismo e heresia pelos seus opositores.
         Aparentemente sem um corpo dirigente central, assumem-se como um grupo de “irmãos” (confraria).
         Tradicionalmente, os Rosacruzes se dizem herdeiros de tradições antigas que remontam à alquimia medieval, ao gnoticismo, ao ocultismo, ao hermetismo no antigo Egito, à cabala e ao neoplatonismo.
         Em The Muses’Threnodies, de H. Adamson (Perth, 1638) encontra-se o seguinte:
         “Pois o que pressagiamos não está em grande,
         Pois somo irmãos da Rosacruz;
         Temos a Palavra Maçônica e a segunda visão,
         Coisas por acontecer nós podemos prever acertadamente.”

        

O rosacrucianismo pode ser compreendido, de um ponto de vista mais amplo, como parte da corrente de pensamento hermético-cristã. Neste contexto, é clara a influência do Corpus Hemeticum, que, após 1.000 anos de esquecimento foi traduzido em 1460 por Marcílio Ficino, a figura centra da Academia Platônica de Florença, para atender a uma encomenda de Cosme de Médici. Nas Núpcias Alquímicas de Cristian Rosenkreuz, é dito que “Hermes é a fonte primordial”.
         

Verifica-se também a influência do pensamento de Paracelsus, citado na Fama Fraternitatis R.C. “Teofrasto (Paracelso), por vocação, foi também um desses heróis. Apesar de não haver entrado em nossa Fraternidade, não obstante, ele leu diligentemente o Livro M.”
         A grande maioria dos personagens relacionados com o lançamento dos “Manifestos Rosacruzes” se originaram do meio luterano alemão. É de se notar que o próprio Lutero foi um dos primeiros a utilizar uma “rosa-cruz” (o “selo de Lutero”, ou “rosa de Lutero”) como símbolo de sua teologia. Abaixo de muitas rosas de Lutero está a frase: “O coração do cristão permanece em rosas, quando ele permanece sob a cruz.”
        
É amplamente discutível se os chamados “reformadores radicais” teriam exercido uma forte influência sobre os Rosacruzes, ou, como algumas evidências parecem sugerir, se teriam sido os Rosacruzes a influenciar esses reformadores. Esses pensadores e teólogos luteranos acreditavam que a Reforma de Lutero deveria ser ampliada, que a doutrina ortodoxa não era suficiente e que o cristão devia realizar a comunhão mística com deus. Entre outros, é possível citar os nomes de Caspar Schwenckfeld, Sebastian Franck e Valentin Weigel. Johann Arndt, teólogo luterano alemão cujos escritos místicos circularam amplamente na Europa no século XVII, amigo e mentor espiritual de Johann Valentinus Andreae e amigo muito próximo de Christoph Besold, também é uma influência conhecida. Arndt foi muito influenciado pelas ideias de Valentin Weigel, e é considerado o “pai” do movimento pietista alemão.
        

O místico e teósofo luterano alemão Jacob Boehme e o educador Jan Amos Comenius foram contemporâneos do movimento Rosacruz original do século XVII e também davam testemunho de uma mesma sabedoria. Comenius chegou a denominar a Unidade dos Irmãos da Boêmia-Morávia, da qual ele foi um dos líderes principais antes de seu desaparecimento, como “Fraternitas Rosae Crucis”. Além disso, ele tinha em Johann Valentin Andreae sua primeira fonte de inspiração, considerando-o “um homem de espírito ígneo e de inteligência pura”, tendo-o contatado e recebido deste o archote para dar continuidade à tarefa iniciada. Muitos dos que responderam ao chamado dos manifestos rosacrucianista, como Michael Meier e Robert Fludd, também se ligavam a mesma fonte de força espiritual.
        
O historiador francês Paul Arnold foi o primeiro a considerar os três manifestos como a obra comum do “Círculo de Tubinga”, ou seja, o grupo que se reuniu ao redor do (futuro) teólogo Valentinus Andreae e dos juristas Tobias Hess e Christoph Besold, na Universidade de Tubinga (Alemanha). Frances Yats, no entanto, relacionou o rosacrucianismo “clássico” do século XVII unicamente a Frederico do Palatinado e sua corte inglesa em Heidelberg.
        
Apesar do sucesso da tese de Yates, os historiadores Richard vand Dülmen, Martin Brecht e Rolando Edighoffer reconstituíam os fatos graças a uma pesquisa histórica aprofundada, que aconteceu a partir de 1977. Brecht e Edighoffer estudaram, ao mesmo tempo e independentemente um do outro, e finalmente provaram a autoria dos manifestos. Andreae se fez conhecer como o autor dos textos (sua “obra pessoal”) e Tobias Hess, defensor do milenarismo e partidário de Paracelso (que, como afirma o historiador Carlos Gilly, “Andreae honrou e defendeu após sua morte, como, pai, irmão, mestre, amigo e companheiro”) teria sido o mestre e iniciador do grupo de onde saíram os manifestos da Rosacruz.
         Muitos procuraram responder ao “chamado” emitido pelos rosacruzes no século XVII, não apenas naquele século, mas também nos seguintes, quando várias organizações com o nome Rosacruz surgiram. Também no século XX surgiram muitas organizações com este nome, todas elas de certa forma coerdeiras do tesouro espiritual da Rosacruz do século XVII.

PRINCÍPIOS E OBJETIVOS
        
De um modo geral os rosacrucianos defendem a fraternidade universal entre todos os homens. Para os rosacrucianos, os homens podem desenvolver suas potencialidades para tornarem-se melhores, mais sadios e felizes. O rosacrucianismo tem por objetivo primordial levar o homem ao autoconhecimento e à manifestação de sua real natureza espiritual, a fim de contribuir para a evolução de toda a humanidade.
        
Estes objetivos, segundo os rosacrucianos, podem ser atingidos por meio de uma mudança pessoal, de hábitos, pensamentos e sentimentos. Segundo eles, isto só é possível ao dissipar o véu de ignorância que cobre os olhos dos homens.
        
A recompensa daqueles que atingem este objetivo, que é de natureza espiritual, é uma paz profunda consigo próprio; estado este que se irradia do indivíduo e atinge todos em volta, produzindo em todos um reflexo positivo.
         O que os Rosacruzes querem de fato é a libertação da humanidade do mundo onde hoje ela se encontra, onde pode ser de fato apontado o gnosticismo que significa a crença em outra natureza. O Rosacruz tem a consciência de que o homem tem outra proveniência, por isso é necessário que tenhamos fraternidade como base, pois a humanidade faz parte da mesma coisa, no pensamento Rosacruz.

         O processo em si, creem os Rosacruzes, que passa pelas etapas internas às externas, se resume em uma mudança de hábitos e é regido pela trindade sentir, pensar e agir. O processo é considerado de faculdades internas pois começa, segundo os Rosacruzes, no coração ao contrário de qualquer outro movimento.

SIMBOLISMO
        
O emblema Rosacruz, embora com variações, apresenta-se como uma cruz envolvida por uma coroa de rosas, ou com uma rosa no centro da cruz. A rosa representa a espiritualidade, enquanto a cruz representa a matéria.

         Outra faceta da Rosacruz mais conhecida é o 18.º Grau (representado simbolicamente a 9.ª Iniciação Menor), o grau de “Cavaleiro Rosacruz”, do “Capítulo da Rosacruz” do “Rito Escocês Antigo e Aceito” da Franco-Maçonaria que tem como símbolos principais o Pelicano, a Rosa e a Cruz.
        
Diversos livres pensadores defende que o Rosacrucianismo não é uma Ordem constituída mas, uma corrente de pensamento, cuja filiação ocorre pela adoção de certas posturas de vida.


ILUMINISMO ROSACRUZ

         No início do século XVII, os manifestos causaram entusiasmo por toda a Europa, ao declararem a existência de uma irmandade secreta de alquimista e magos que se preparavam para transformar as artes, as ciências, a religião e o panorama intelectual da Europa. Guerras entre política e religião pululavam, então, o continente. Os trabalhos eram reeditados várias vezes, seguidos de numerosos panfletos favoráveis. Entre 1614 e 1620, cerca de 400 manuscritos e livros eram publicados e eram então discutidos os documentos Rosa cruzes.

         O pico do furor Rosacruz foi alcançado quando dois pôsteres misteriosos apareceram nas ruas de Paris em 1622 com o espaçamento de alguns dias entre um e outro. O primeiro dizia, “Nós, os Deputados do Colégio principal da Rosacruz, demoramo-nos visível e invisivelmente nesta cidade pela graça do Altíssimo (...)”, e o segundo acabava com as palavras “Os pensamentos anexados ao real deseja de procurar irão conduzir-nos a ele e dele a nós.”
        
O lendário primeiro manifesto, Fama fraternitatis Rosae Crucis (1614), era inspirado no trabalho de Michael Maier (1568 – 1622) da Alemanha; Robert Fludd (1574 – 1647) da Inglaterra; Teophilus Schweighardt Constantiens, Gothardus Arthusius, Julius Sperber, Henricus Madathanus, Gabriel Naudé, Thomas Vaughan e outros.
         Em Theatrum Chimicum Britannicum de Elias Ashmole (1650) este defende os Rosacruzes. Alguns trabalhos posteriores que impactaram o Rosacrucianismo foram o “Opus magocabalisticum et theosophicum” por George von Welling (1719) – da inspiração alquímica e paracelsiana e do “Aureum Vellus ou Goldenes Vliess” por Hermann Fictuld em 1749.
        
Michael Maier foi nomeado Pfalzgraf (Conde Palatino por Rodolfo II do Sacro Império Romano-Germânico e Rei da Hungria e Rei da Boêmia. Ele também foi um dos defensores mais proeminentes dos Rosacruzes, transmitindo claramente detalhes sobre a “Cruz dos Irmãos da Rosa” em seus escritos. Maier fez a declaração firme de que os Irmãos do R.C. Existem para avançar artes inspiradas e ciências, incluindo a alquimia. Os pesquisadores dos escritos de Maier salientam que ele nunca afirmou ter produzido ouro, nem Heinrich Khunrath nem nenhum dos outros Rosacrucianos. Suas escritas apontam para uma alquimia simbólica e espiritual, em vez de uma operativa. Em uma combinação de estilos diretos e velados, esses escritos transmitiram os nove estágios da transmutação involutiva-evolutiva do “corpo triplo” do ser humano, a “alma tripa” e o “espírito triplo” entre outros conhecimentos esotéricos relacionados ao “Caminho da Iniciação”.
        
Em seu panfleto de 1618, “Pia et Ultilissima Admontio de Fratribus Rosae Crucis”. Henrichus Neuhusius escreveu que os Rosacruzes partiram para o leste devido à instabilidade europeia causada pelo início da Guerra dos Trinta Anos. Em 1710, Sigmund Richter, fundador da sociedade secreta da Cruz Dourada e Rosada, também sugeriu que os Rosacruzes haviam migrado pra o leste. Na primeira metade do século XX, René Guénon, um pesquisador do oculto, apresentou a mesma ideia em algumas de suas obras. Um eminente autor do século XIX, Arthur Edward Waite apresentou argumentos que contradizem essa ideia. Foi neste campo fértil do discurso que surgiram muitas sociedade Rosacruzes. Eles foram baseados no oculto, inspirados pelo mistério deste “Colégio dos Invisíveis”.
        
Alguns estudiosos modernos por exemplo Adam McLean e Giordano Berti, assumem que, entre os primeiros seguidores da Cruz da Rosa, havia também o teólogo alemão Daniel Cramer, que em 1617 publicou um tratado bizarro intitulado “Societas Jesus et Rosae Crucis Vera”, que contém 40 figuras emblemáticas acompanhadas de citações bíblicas.
        
A ideia de tal ordem, exemplificada pela rede de astrônomos, professores, matemáticos e filósofos naturais na Europa do século XVI, promovida por homens como Johannes Kepler, Georg Joachim Rheticus, John Dee e Tycho Brahe, deu origem ao Colégio Invisível. Este foi precursor da Royal Society fundada em 1660. Foi constituído por um grupo de cientistas que começaram a realizar reuniões regulares para compartilhar e desenvolver o conhecimento adquirido por investigação experimental. Entre estes foram John Wilkins, John Wallis e Robert Boyle, que escreveu; “as pedras angulares do Colégio Invisível (ou como se denominam o Filosófico), de vez em quando honram a companhia deles...”

POÇO INICIÁTICO DA QUINTA DA REGALEIRA
        



É uma galeria subterrânea, em Sintra, Portugal, com uma escadaria em espiral, sustentada por colunas esculpidas, por onde se desce ao fundo do poço. A escadaria é constituída por nove patamares separados por lanços de 15 degraus cada um, invocando referências à Divina Comédia de Dante e que podem representar os 9 círculos do Inferno, do Paraíso, ou do Purgatório. Segundo os conceituados ocultista Albert Pike, René Guénon e Manly Palmer Hall é na obra Divina Comédia que se encontra pela primeira vez exposta a Ordem Rosacruz. No fundo do poço está embutida, em mármore, uma rosa dos ventos sobre uma cruz templária, que é um emblema heráldico, representando, do topo para baixo, a lua, o sol, os elementos, e, simultaneamente, indicativo da Ordem Rosacruz.

        
O poço diz-se iniciático porque se acredita que era usado em rituais de iniciação à maçonaria e a explicação do simbolismo dos mesmos nove patamares diz-se que poderá ser encontrada na obra Conceito Rosacruz do Cosmos, em particular do simbolismo da monas hieroglífica, como símbolo de unidade entre os planos superiores e inferiores, tal como latente na máxima “as above, so below, as within, so without, as the universe, so the soul” – tradução: “como acima, tão abaixo, como dentro, tão sem, como universo, então a alma” (Hermes Trimegisto).
        
A simbologia do local está relacionada com a crença que a terra é o útero materno de onde provém a vida, mas também a sepultura para onde esta voltará. Muitos ritos de iniciação aludem a aspectos do nascimento e morte ligados à terra, ou renascimento. A existência de 23 nichos localizados por debaixo dos degraus do poço iniciático representava um dos muitos mistérios da referida construção. No dia 29 de dezembro de 2010, o professor Gabriel Fernández Calvo da Escola Técnica Superior de Engenheiros de Caminhos, Canais e Portos da Universidad de Castilla – La Mancha em Ciudad Real, quando visitava o poço acompanhado de outros professores da UCLM, observou que os 23 nichos não estão colocados por acaso, pois encontram-se agrupados em três conjuntos de 17, 1 e 5 nichos separados entre si à medida que se desce ao fundo do poço. Esta organização não é aleatória e provavelmente refere-se ao ano de 1715 em que Francisco Albertino Guimarães de Castro comprou a propriedade (conhecida como Quinta da Torre ou do Castro) em hasta pública.
        
O poço está ligado por várias galerias ou túneis a outros pontos da Quinta, a Entrada dos Guardiães, o Lago da Cascata e o Poço Imperfeito. Estes túneis, outrora habitados por morcegos afastados pelos muitos turistas que visitam o local, estão cobertos com pedra importada da orla marítima da região de Peniche, pedra que dá a sugestão de um mundo submerso.

FERNANDO PESSOA – NO TÚMULO DE CHRISTIAN ROSENKREUZ
        
Fernando Pessoa, no seu poema “No túmulo de Christian Rosenkreuz”, traça toda uma série de jogos de linguagem, que remetem para o domínio da gnose cristã, e, consequentemente, de correntes como o Rosacrucianismo.

I



Quando, despertos deste sono, a vida,
Soubermos o que somos, e o que foi
Essa queda até corpo, essa descida
Até á noite que nos a Alma obstrui,


Conheceremos pois toda a escondida

Verdade do que é tudo que há ou flui?
Não: nem na Alma livre é conhecida...
Nem Deus, que nos criou, em Si a inclui


Deus é o Homem de outro Deus maior:

Adam Supremo, também teve Queda;
Também, como foi nosso Criador,


Foi criado, e a Verdade lhe morreu...

De além o Abismo, Espírito Seu, Lha veda;
Aquém não há no Mundo, Corpo Seu.

II



Mas antes era o Verbo, aqui perdido
Quando a Infinita Luz, já apagada,
Do Caos, chão do Ser, foi levantada
Em Sombra, e o Verbo ausente escurecido.


Mas se a Alma sente a sua forma errada,

Em si que é Sombra, vê enfim luzido
O Verbo deste Mundo, humano e ungido,
Rosa Perfeita, em Deus crucificada.


Então, senhores do limiar dos Céus,

Podemos ir buscar além de Deus
O Segredo do Mestre e o Bem profundo;


Não só de aqui, mas já de nós, despertos,

No sangue atual de Cristo enfim libertos
Do a Deus que morre a geração do Mundo.





III



Ah, mas aqui, onde irreais erramos,
Dormimos o que somos, e a verdade,
Inda que enfim em sonhos a vejamos,
Vemo-la, porque em sonho, em falsidade.


Sombras buscando corpos, se os achamos

Como sentir a sua realidade?
Com mãos de sombra, Sombras, que tocamos?
Nosso toque é ausência e vacuidade.


Quem desta Alma fechada nos liberta?

Sem ver, ouvimos para além da sala
De ser: mas como, aqui, a porta aberta?


Calmo na falsa morte a nós exposto,

O Livro ocluso contra o peito posto,
Nosso Pai Rosaecruz conhece e cala.


ORGANIZAÇÕES MODERNAS
        

Entre o final do século XIX e o início do século XX surgiram várias organizações inspiradas na Tradição da Rosacruz. Existem atualmente diversas e distintas ramificações Rosacrucianas. Apresenta-se em seguida uma breve descrição acerca das mais divulgadas:
        
A FRATERNIDADE ROSACRUZ, no Brasil e em Portugal (inglês The Rosicrucian Fellowship), foi fundada por Max Heindel entre 1909 e 1911, nos Estados Unidos, Não reivindica o título de “Ordem Rosacruz”, considerando-se apenas uma escola de exposição de suas doutrinas e de preparação para o indivíduo para ingresso em caminhos mais profundos na Ordem espiritual. Segundo eles, a verdadeira Ordem Rosacruz funciona apenas nos planos espirituais. Ao contrário da maioria das demais organizações Rosacruzes, as escolas de Max Heindel se consideram indissociáveis do Cristianismo. Outras organizações Rosacruzes também consideram cristãs, mas não com esta ênfase;
        
ANTIGA E MÍSTICA ORDEM ROSAE CRUCIS (AMORC), com sede mundial em São José na Califórnia, EUA, foi fundada em 1915, por Harvey Spencer Lewis, nos Estados Unidos. Tem influência do Antigo Egito, de organizações fundadas pelo Faraó Amenófis IV (também conhecido como Aquenáton) por volta de 1.500 a.C. Tal como está expresso no site oficial da Ordem: “A Ordem Rosacruz, AMORC é uma organização internacional de caráter místico-filosófico, que tem por missão despertar o potencial interior do ser humano, auxiliando-o em seu desenvolvimento, em espírito de fraternidade, respeitando a liberdade individual, dentro da Tradição e da Cultura Rosacruz”. A Antiga e Mística Ordem Rosae Crucis é hoje a maior confraria Rosacruz no mundo, abrangendo dezenas de países, em diversos idiomas, além de acolher a Tradicional Ordem Martinista (T.O.M.), uma ordem martinista fundada pelo renomado médico e ocultista francês Papus (Dr. Gerard Anaclet Vicent Encausse). A sede para os falantes da língua portuguesa localiza-se na cidade de Curitiba-PR;

        FRATERNITAS ROSAE CRUCIS (FRC), também com sede mundial nos EUA, que se reivindica a autêntica Ordem Rosacruz fundada em 1614 na Alemanha, mas na verdade foi fundada por Reuben Swinburne Clymer por volta de 1920 e se diz representante de um movimento originalmente fundado por Pascal Beverly Randolph em 1856;

         
FRATERNITAS ROSICRUCIANA ANTIQUE (FRA), foi fundada pelo esoterista alemão Arnolde Krumm-Heller por volta de 1927, e tem sede no Rio de Janeiro (está presente também nos países de língua hispânica);
         
LECTORIUM ROSICURCIANUM (ou Escola Espiritual da Rosacruz Áurea) é uma organização Rosacruz que começou a se estruturar em Haarlem, Holanda, em 1924, através do trabalho de J. Van Rijckeborgh (pseudônimo de Jan Leene) e Z.W.Leene, qudno esses dois irmãos entraram para a Sociedade Rosacruz (Het Rozekruisers Genootschap), divisão holandesa do grupo americano Rosicrucian Fellowship. Este grupo se tornaria independente da Roscrucian Fellowship em 1935 e, com o final da guerra em 1945 (quando seu trabalho foi proibido pelas forças de ocupação nazista), o trabalho exterior foi retomado e passou a adotar o nome Lectorium Rosicrucianum, ou Escola Internacional da Rosacruz Áurea, apresentando-se cada vez mais como uma escola gnóstica, “Gnosis” significando aqui o conhecimento direto de deus, resultado de um caminho de desenvolvimento espiritual. Desde 1945, o grupo expandiu por vários países da Europa, América, Oceania e África, além de publicar inúmeros livros, muitos dos quais com comentários sobre antigos textos da sabedoria universal, como os Manifestos Rosacruzes do século XVII, o Corpus Hermeticum (textos atribuídos a Hermis Trismegisto), o Evangelho Gnóstico da Pistis Sophia, o Tao Te Ching, entre outros;
        
CONFRATERNIDADE DA ROSA+CRUZ (CR+C) preserva e perpetua a Tradição Rosacruz sob a linhagem e autoridade espiritual do Imperator Gary L. Stewart, oferecendo os Ensinamentos Rosacruzes originais preparados nas décadas de 1920 e 1930 por Harvey Spencer Lewis. Preservando a tradição conforme especificamente estabelecida no início do século XX e também conforme o Movimento Rosacruz em geral dos séculos passados. Para executar essa tarefa com êxito, há necessidade de se manter sempre o equilíbrio entre a Tradição e o Movimento com adesão estrita às leis que governam a sua operação e a sua existência. A manutenção desse equilíbrio é confiada a um imperator do Movimento, que, sobe muitos aspectos, serve como um guardião do mesmo;
        
OKRC (Ordem Kabbalística da Rosacruz) – a OKRC foi fundada em 1888, pelo Marquês Stanislas de Guaita (seu primeiro Grão-Mestre). Ela agrega em si de uma forma equilibrada a herança do Martinismo da Rosacruz, da Kabbala e do Hermetismo. Ela tem uma estrutura internacional mista. Longe de não ser apenas uma escola filosófica ou simbólica, ela tem por objetivo desde sua criação formar e iniciar os Seres de Desejo. Presente hoje como outrora, a sua herança conservou este vigor e esta riqueza, que sempre permitiu adaptar-se à sua época, fazendo irradiar a chama da sua iniciação. Tendo ressurgido no século XIX, as correntes Rosacruzes do Sudoeste da França permitiram o reencontro entre a tradição mística e simbólica alemã e suas correntes herméticas mediterrâneas. Por este intercâmbio, a Rosacruz da qual falamos concentro seus trabalhos sob o ritual, a alquimia, a astrologia e uma certa forma de teurgia.

sábado, 8 de setembro de 2018

EPICURO E SEU PARADOXO AGNÓSTICO!




EPICURO

         Epicuro de Samos em grego significa “aliado, camarada”, nasceu em 341 a.C., em Samos e morreu em 271 ou 270 a.C. em Atenas, foi um filósofo grego do período helenístico. Seu pensamento foi muito difundido e numerosos centros epicuristas que se desenvolveram na Jônia, no Egito e, a partir do século I, em Roma, onde Lucrécio foi seu maior divulgador.





VIDA
         Epicuro nasceu na ilha de Samos, em 341 a.C., mas ainda muito jovem partiu para Téos na costa da Ásia Menor. Quando criança estudou com o platonista Pânfilo por quatro anos e era considerado um dos melhores alunos. Certa vez, ao ouvir a frase de Hesíodo “todas as coisas vieram do caos”, e perguntou: “E o caos veio de que?”. Retornou para a terra natal em 323 a.C. Sofria de cálculo renal, o que contribuiu para que tivesse uma vida marcada pela dor.
         Epicuro ouviu o filósofo acadêmico Pânfilo em Samos, que não lhe foi de muito agrado. Por isso foi mandado para Téos pelo seu pai. Com Nausífanes de Téos, discípulo de Demócrito de Abdera, Epicuro teria entrado em contato com a teoria atomista – da qual reformulou alguns pontos. Epicuro ensinou filosofia em Lâmpsaco, Mitilene e Cólofon até que em 306 a.C. fundou sua própria escola filosófica, chamada O Jardim, onde residia com alguns amigos, na cidade de Atenas. Lecionou em sua escola até a morte, em 270 a.C., cercado de amigos e discípulos e tendo sua vida marcada pelo ascetismo, serenidade e doçura.

FILOSOFIA E OBRA
        
O propósito da filosofia para Epicuro era atingir a felicidade, estado caracterizado pela aponia, a ausência de dor (física) e ataraxia ou impertubabilidade da alma. Ele buscou na natureza as balizas para o seu pensamento: o homem, a exemplo dos animais, busca afastar-se da dor e aproximar-se do prazer. Estas referências seriam as melhores maneiras de medir o que é bom ou ruim. Utilizou-se da teoria atômica de Demócrito para justificar a constituição de tudo o que há. Das estrelas à alma, tudo é formado de átomos, sendo, porém de diferentes naturezas. Dizia que os átomos são de qualidades finitas, de quantidades infinitas e sujeitos a infinitas combinações.




        
A morte física seria o fim do corpo (e do indivíduo), que era entendido como somatório de carne e alma, pela desintegração completa dos átomos que o constituem. Desta forma, os átomos, eternos e indestrutíveis, estaria livres para constituir outros corpos. Essa teoria, exaustivamente trabalhada, tinha a finalidade de explicar todos os fenômenos naturais conhecidos ou ainda não e principalmente extirpar os maiores medos humanos: o medo da morte e o medo dos deuses.

        
Naqueles tempos, Epicuro percebeu que as pessoas eram muito supersticiosas e haviam se afastado da verdadeira função das religiões e dos deuses. Os deuses, segundo ele, viviam em perfeita harmonia, desfrutando da bem-aventurança (felicidade) divina. Não seria preocupação divina atormentar o homem de qualquer forma. Os deuses deveriam ser tomados como foram em tempos remotos, modelos de bem-aventuranças que servem como paradigma para os homens e não seres instáveis, com paixões humanas, que devem ser temidos.

        

Desta forma, procurou tranquilizar as pessoas quanto aos tormentos futuros ou após a morte. Não há por que temer os deuses nem em vida e nem após a vida. E, além disso, depois de mortos, como não estaremos mais de posse de nossos sentidos, será impossível sentir alguma coisa. Então, não haveria nada a temer com a morte.

         No entanto, a caminho da busca da felicidade, ainda estão as dores e os prazeres. Quanto às dores físicas, nem sempre seria possível evita-las. Mas Epicuro faz questão de frisar que elas não são duradouras e podem ser suportadas com lembranças de bons momentos que o indivíduo tenha vivido. Piores e mais difíceis de lidar são as dores que perturbam a alma. Essas podem continuar a doer mesmo muito tempo depois de terem sido despertadas pela primeira vez. Para essas, Epicuro recomenda a reflexão. As dores da alma estão frequentemente associadas às frustrações. Em geral, oriunda de um desejo não satisfeito.

         Encontra-se, aqui, um dos pontos fundamentais para o entendimento dessa curiosa doutrina, que também foi tomada por seus seguidores e discípulos como um evangelho ou boa nova, o equacionamento entre dores e prazeres. Das 300 obras escritas pelo filósofo, restaram apenas três cartas que versam sobre a natureza, sobre os meteoros e sobre a moral, e uma coleção de pensamentos, fragmentos de outras obras perdidas. Estas cartas, com os fragmentos, foram coligidos por Hermann Usener sob o título de Epicurea em 1887, mas, mais tarde, Hermann Diels descobriu que os fragmentos eram, na verdade de Leucipo.
Leucipo


A CERTEZA
        
Segundo Epicuro, para atingir a certeza é necessário confiar naquilo que foi recebido passivamente na sensação pura e, por consequência, nas ideias gerais que se formam no espírito (como resultado dos dados sensíveis recebidos pela faculdade sensitiva).




O ATOMISMO

        
Epicuro defendia ardorosamente a liberdade humana e a tranquilidade do espírito. O atomismo, acreditava o filósofo, poderia garantir ambas as coisas desde que modificado. A representação vulgar do mundo com seus deuses, o medo dos quais fez com que se cometessem os piores atos, é obstáculo à serenidade. Todas as doutrinas filosóficas, salvo o atomismo, participam dessas superstições, segundo Epicuro.

        
No sistema epicurista, os átomos se encontram fortuitamente por uma leve inclinação em sua trajetória, que os fariam chocar-se com outros átomos para constituir a matéria. Esta é a grande modificação em relação ao atomismo de Demócrito, onde o encontro os átomos é necessário. A inclinação a que o átomo se desvia poderia ser por uma vontade, um desejo ou por afinidade com outro átomo. Precisamente este é o ponto fosco na teoria atômica de Epicuro. Provavelmente Epicuro o explicou melhor em alguma de suas obras perdidas. Certo é que este encontro fortuito dos átomos garante a liberdade (se assim não fosse, tudo estaria sobe o jugo da natureza) e a explicação dos fenômenos, fazendo com que possam ser explicados racionalmente. Assim, ao compreender como opera a natureza, o homem pode livrar-se do medo e das superstições que afligem o espírito.


O PRAZER
        
A doutrina de Epicuro entende que o bem reside no prazer, e, por isso foi uma doutrina muitas vezes confundida com o hedonismo. O prazer de que fala Epicuro é o prazer do sábio, entendido como quietude da mente e o domínio sobre as emoções e, portanto, sobre si mesmo. É o prazer da justa medida e não dos excessos. É a própria natureza que nos informa que o prazer é um bem. Este prazer, no entanto, apenas satisfaz uma necessidade ou aquieta a dor. A natureza conduz-nos a uma vida simples. O único prazer é o prazer do corpo e o que se chama de prazer do espírito é apenas lembrança dos prazeres do corpo. O mais alto prazer reside no que chamamos de saúde. Entre os prazeres, Epicuro elege a amizade. Por isso, o convívio entre os estudiosos de sua doutrina era tão importante a ponto de viverem em uma comunidade, o “Jardim”. Ali, os amigos poderiam se dedicar à filosofia, cuja função principal é libertar o homem para uma vida melhor.




  
O DESEJO

Classificação dos desejos para Epicuro

Desejos naturais


Desejos inúteis

Necessários
Simplesmente naturais

Artificiais

Irrealizáveis

Desejos Necessários

Para a felicidade
(eudaimonia)


Para a tranquilidade do corpo
(proteção)


Para a vida
(nutrição e sono)

Desejos Simplesmente Naturais

Variações de prazeres, busca do agradável


Desejos inúteis artificiais

Riqueza, glória, poder


Desejos inúteis irrealizáveis

Imoralidade



O PARADOXO DE EPICURO



         O paradoxo de Epicuro é um dilema lógico sobre o problema do mal atribuído ao filósofo grego Epicuro que argumenta contra a existência de um deus que seja ao mesmo tempo onisciente, onipotente e benevolente.

O PARADOXO
        
A lógica do paradoxo proposto por Epicuro toma três características do deus judaico, onipotência, onisciência e onibenevolência como, caso verdadeira aos pares, excludente de uma terceira, isto é, se duas delas forem verdade, excluem automaticamente a outra. Trata-se, portanto, de um trilema. Isto tem relevância pois, caso seja ilógico que uma destas características seja verdadeira, então não pode ser o caso que um deus com as três exista.


·                 Enquanto onisciente e onipotente, tem conhecimento de todo o mal e poder para acabar com ele. Mas não o faz. Então não é onibenevolente;

·                 Enquanto onipotente e onibenevolente, então tem poder para extinguir o mal e quer fazê-lo, pois é bom. Mas não o faz, pois não sabe o quanto mal existe e onde o mal está. Então ele não é onisciente;

·                 Enquanto onisciente e onibenevolente, então sabe de todo o mal que existe e quer mudá-lo. Mas não o faz, pois não é capaz. Então ele não é onipotente.


DEUS NO EPICURISMO 

Epicuro não era ateu, apenas rejeitava a ideia de um deus preocupado com os assuntos humanos. Tanto o mestre quanto os seguidores do Epicurismo negavam a ideia de que não  existia nenhum deus. Enquanto a concepção do deus supremo, feliz e abençoado era a mais popular, Epicuro rejeitava tal noção por considerar um fardo demasiado pesado de ter de preocupar-se com todos os problemas do mundo. Por isto, os deuses não teriam nenhuma afeição especial pelos seres humanos, sequer saberiam de sua existência, servindo apenas como ideias morais dos quais a humanidade poderia tentar aproximar-se. Era justamente através da observação do problema do mal, ou seja, da presença do sofrimento na Terra que Epicuro chegava a conclusão de que os deuses não poderiam estar preocupados com o bem estar da humanidade.


ATRIBUIÇÃO E VARIAÇÕES

        
Sexto Empírico
Embora tenha caído no agrado da escola cética da filosofia grega, é possível que o paradoxo de Epicuro tenha sido erroneamente atribuído a ele por Lactâncio que, de sua perspectiva cristã, enquanto atacava o problema proposto pelo grego, o teria considerado como ateu. Há  sugestão de que tenha sido de fato obra de um filósofo cético que antecedia Epicuro, possivelmente Carnéades. De acordo com o estudioso alemão Reinhold F. Glei, está claro que o argumento teodiceico é de uma fonte acadêmica não epicurista, mas talvez até anti-epicurista. A versão mais antiga ainda preservada deste trilema aparece nos escritos do cético Sexto Empírico. Charles Bray, em seu livro A Filosofia da Necessidade de 1863, cita Epicuro sem mencionar a fonte como autor do seguinte trecho:

         “Seria Deus desejoso de prevenir o mal mas incapaz? Portanto, não é onipotente. Seria ele capaz, mas sem desejo? Então é malévolo. Seria ele tanto capaz quanto desejoso? Então por que há mal?”

        
De Ira Dei” de Lactântio
N.A.Nicholson, em seu Philosophical Papers de 1864, atribui “as famosas indagações” a Epicuro, utilizando as palavras anteriormente fraseadas por Hume. A frase de Hume ocorre no livro décimo de seu aclamado Diálogos sobre a Religião Natural, publicado postumamente em 1778. A personagem Philo começa sua fala dizendo – “As antigas perguntas de Epicuro continuam sem resposta”. A citação que Hume faz, provém do influente Dictionnaire Historique et Critique de Pierre Bayle, que cita Lactâncio atribuindo as perguntas a Epicuro. Esta atribuição ocorre no capítulo 13 de “De Ira Dei” de Lactântio, que não fornece fontes.

         Hume postula:
        
“O poder [de Deus] é infinito: o que quer que ele deseja é executado. Mas nem homem nem qualquer outro animal é feliz. Portanto ele não deseja sua felicidade. Sua sabedoria é infinita: ele nunca erra em escolher os meios para qualquer fim: mas o curso da natureza tende a ser contrário a qualquer felicidade humana ou animal: portanto não é estabelecido para tal propósito. Através de toda a história do conhecimento humano, não há inferências mais certas e infalíveis do que estas. Em que ponto, portanto, sua benevolência e misericórdia lembram a benevolência e misericórdia dos homens?”




Veja também:

ARQUEOLOGIA E PALEONTOLOGIA: DOIS MUNDOS, UM MESMO FASCÍNIO PELO PASSADO

Quando falamos em escavar o solo em busca de vestígios do passado, muitas pessoas imediatamente pensam em fósseis de dinossauros e utensílio...

Não deixem de visitar, Blog do Maffei recomenda: