sábado, 8 de setembro de 2018

EPICURO E SEU PARADOXO AGNÓSTICO!




EPICURO

         Epicuro de Samos em grego significa “aliado, camarada”, nasceu em 341 a.C., em Samos e morreu em 271 ou 270 a.C. em Atenas, foi um filósofo grego do período helenístico. Seu pensamento foi muito difundido e numerosos centros epicuristas que se desenvolveram na Jônia, no Egito e, a partir do século I, em Roma, onde Lucrécio foi seu maior divulgador.





VIDA
         Epicuro nasceu na ilha de Samos, em 341 a.C., mas ainda muito jovem partiu para Téos na costa da Ásia Menor. Quando criança estudou com o platonista Pânfilo por quatro anos e era considerado um dos melhores alunos. Certa vez, ao ouvir a frase de Hesíodo “todas as coisas vieram do caos”, e perguntou: “E o caos veio de que?”. Retornou para a terra natal em 323 a.C. Sofria de cálculo renal, o que contribuiu para que tivesse uma vida marcada pela dor.
         Epicuro ouviu o filósofo acadêmico Pânfilo em Samos, que não lhe foi de muito agrado. Por isso foi mandado para Téos pelo seu pai. Com Nausífanes de Téos, discípulo de Demócrito de Abdera, Epicuro teria entrado em contato com a teoria atomista – da qual reformulou alguns pontos. Epicuro ensinou filosofia em Lâmpsaco, Mitilene e Cólofon até que em 306 a.C. fundou sua própria escola filosófica, chamada O Jardim, onde residia com alguns amigos, na cidade de Atenas. Lecionou em sua escola até a morte, em 270 a.C., cercado de amigos e discípulos e tendo sua vida marcada pelo ascetismo, serenidade e doçura.

FILOSOFIA E OBRA
        
O propósito da filosofia para Epicuro era atingir a felicidade, estado caracterizado pela aponia, a ausência de dor (física) e ataraxia ou impertubabilidade da alma. Ele buscou na natureza as balizas para o seu pensamento: o homem, a exemplo dos animais, busca afastar-se da dor e aproximar-se do prazer. Estas referências seriam as melhores maneiras de medir o que é bom ou ruim. Utilizou-se da teoria atômica de Demócrito para justificar a constituição de tudo o que há. Das estrelas à alma, tudo é formado de átomos, sendo, porém de diferentes naturezas. Dizia que os átomos são de qualidades finitas, de quantidades infinitas e sujeitos a infinitas combinações.




        
A morte física seria o fim do corpo (e do indivíduo), que era entendido como somatório de carne e alma, pela desintegração completa dos átomos que o constituem. Desta forma, os átomos, eternos e indestrutíveis, estaria livres para constituir outros corpos. Essa teoria, exaustivamente trabalhada, tinha a finalidade de explicar todos os fenômenos naturais conhecidos ou ainda não e principalmente extirpar os maiores medos humanos: o medo da morte e o medo dos deuses.

        
Naqueles tempos, Epicuro percebeu que as pessoas eram muito supersticiosas e haviam se afastado da verdadeira função das religiões e dos deuses. Os deuses, segundo ele, viviam em perfeita harmonia, desfrutando da bem-aventurança (felicidade) divina. Não seria preocupação divina atormentar o homem de qualquer forma. Os deuses deveriam ser tomados como foram em tempos remotos, modelos de bem-aventuranças que servem como paradigma para os homens e não seres instáveis, com paixões humanas, que devem ser temidos.

        

Desta forma, procurou tranquilizar as pessoas quanto aos tormentos futuros ou após a morte. Não há por que temer os deuses nem em vida e nem após a vida. E, além disso, depois de mortos, como não estaremos mais de posse de nossos sentidos, será impossível sentir alguma coisa. Então, não haveria nada a temer com a morte.

         No entanto, a caminho da busca da felicidade, ainda estão as dores e os prazeres. Quanto às dores físicas, nem sempre seria possível evita-las. Mas Epicuro faz questão de frisar que elas não são duradouras e podem ser suportadas com lembranças de bons momentos que o indivíduo tenha vivido. Piores e mais difíceis de lidar são as dores que perturbam a alma. Essas podem continuar a doer mesmo muito tempo depois de terem sido despertadas pela primeira vez. Para essas, Epicuro recomenda a reflexão. As dores da alma estão frequentemente associadas às frustrações. Em geral, oriunda de um desejo não satisfeito.

         Encontra-se, aqui, um dos pontos fundamentais para o entendimento dessa curiosa doutrina, que também foi tomada por seus seguidores e discípulos como um evangelho ou boa nova, o equacionamento entre dores e prazeres. Das 300 obras escritas pelo filósofo, restaram apenas três cartas que versam sobre a natureza, sobre os meteoros e sobre a moral, e uma coleção de pensamentos, fragmentos de outras obras perdidas. Estas cartas, com os fragmentos, foram coligidos por Hermann Usener sob o título de Epicurea em 1887, mas, mais tarde, Hermann Diels descobriu que os fragmentos eram, na verdade de Leucipo.
Leucipo


A CERTEZA
        
Segundo Epicuro, para atingir a certeza é necessário confiar naquilo que foi recebido passivamente na sensação pura e, por consequência, nas ideias gerais que se formam no espírito (como resultado dos dados sensíveis recebidos pela faculdade sensitiva).




O ATOMISMO

        
Epicuro defendia ardorosamente a liberdade humana e a tranquilidade do espírito. O atomismo, acreditava o filósofo, poderia garantir ambas as coisas desde que modificado. A representação vulgar do mundo com seus deuses, o medo dos quais fez com que se cometessem os piores atos, é obstáculo à serenidade. Todas as doutrinas filosóficas, salvo o atomismo, participam dessas superstições, segundo Epicuro.

        
No sistema epicurista, os átomos se encontram fortuitamente por uma leve inclinação em sua trajetória, que os fariam chocar-se com outros átomos para constituir a matéria. Esta é a grande modificação em relação ao atomismo de Demócrito, onde o encontro os átomos é necessário. A inclinação a que o átomo se desvia poderia ser por uma vontade, um desejo ou por afinidade com outro átomo. Precisamente este é o ponto fosco na teoria atômica de Epicuro. Provavelmente Epicuro o explicou melhor em alguma de suas obras perdidas. Certo é que este encontro fortuito dos átomos garante a liberdade (se assim não fosse, tudo estaria sobe o jugo da natureza) e a explicação dos fenômenos, fazendo com que possam ser explicados racionalmente. Assim, ao compreender como opera a natureza, o homem pode livrar-se do medo e das superstições que afligem o espírito.


O PRAZER
        
A doutrina de Epicuro entende que o bem reside no prazer, e, por isso foi uma doutrina muitas vezes confundida com o hedonismo. O prazer de que fala Epicuro é o prazer do sábio, entendido como quietude da mente e o domínio sobre as emoções e, portanto, sobre si mesmo. É o prazer da justa medida e não dos excessos. É a própria natureza que nos informa que o prazer é um bem. Este prazer, no entanto, apenas satisfaz uma necessidade ou aquieta a dor. A natureza conduz-nos a uma vida simples. O único prazer é o prazer do corpo e o que se chama de prazer do espírito é apenas lembrança dos prazeres do corpo. O mais alto prazer reside no que chamamos de saúde. Entre os prazeres, Epicuro elege a amizade. Por isso, o convívio entre os estudiosos de sua doutrina era tão importante a ponto de viverem em uma comunidade, o “Jardim”. Ali, os amigos poderiam se dedicar à filosofia, cuja função principal é libertar o homem para uma vida melhor.




  
O DESEJO

Classificação dos desejos para Epicuro

Desejos naturais


Desejos inúteis

Necessários
Simplesmente naturais

Artificiais

Irrealizáveis

Desejos Necessários

Para a felicidade
(eudaimonia)


Para a tranquilidade do corpo
(proteção)


Para a vida
(nutrição e sono)

Desejos Simplesmente Naturais

Variações de prazeres, busca do agradável


Desejos inúteis artificiais

Riqueza, glória, poder


Desejos inúteis irrealizáveis

Imoralidade



O PARADOXO DE EPICURO



         O paradoxo de Epicuro é um dilema lógico sobre o problema do mal atribuído ao filósofo grego Epicuro que argumenta contra a existência de um deus que seja ao mesmo tempo onisciente, onipotente e benevolente.

O PARADOXO
        
A lógica do paradoxo proposto por Epicuro toma três características do deus judaico, onipotência, onisciência e onibenevolência como, caso verdadeira aos pares, excludente de uma terceira, isto é, se duas delas forem verdade, excluem automaticamente a outra. Trata-se, portanto, de um trilema. Isto tem relevância pois, caso seja ilógico que uma destas características seja verdadeira, então não pode ser o caso que um deus com as três exista.


·                 Enquanto onisciente e onipotente, tem conhecimento de todo o mal e poder para acabar com ele. Mas não o faz. Então não é onibenevolente;

·                 Enquanto onipotente e onibenevolente, então tem poder para extinguir o mal e quer fazê-lo, pois é bom. Mas não o faz, pois não sabe o quanto mal existe e onde o mal está. Então ele não é onisciente;

·                 Enquanto onisciente e onibenevolente, então sabe de todo o mal que existe e quer mudá-lo. Mas não o faz, pois não é capaz. Então ele não é onipotente.


DEUS NO EPICURISMO 

Epicuro não era ateu, apenas rejeitava a ideia de um deus preocupado com os assuntos humanos. Tanto o mestre quanto os seguidores do Epicurismo negavam a ideia de que não  existia nenhum deus. Enquanto a concepção do deus supremo, feliz e abençoado era a mais popular, Epicuro rejeitava tal noção por considerar um fardo demasiado pesado de ter de preocupar-se com todos os problemas do mundo. Por isto, os deuses não teriam nenhuma afeição especial pelos seres humanos, sequer saberiam de sua existência, servindo apenas como ideias morais dos quais a humanidade poderia tentar aproximar-se. Era justamente através da observação do problema do mal, ou seja, da presença do sofrimento na Terra que Epicuro chegava a conclusão de que os deuses não poderiam estar preocupados com o bem estar da humanidade.


ATRIBUIÇÃO E VARIAÇÕES

        
Sexto Empírico
Embora tenha caído no agrado da escola cética da filosofia grega, é possível que o paradoxo de Epicuro tenha sido erroneamente atribuído a ele por Lactâncio que, de sua perspectiva cristã, enquanto atacava o problema proposto pelo grego, o teria considerado como ateu. Há  sugestão de que tenha sido de fato obra de um filósofo cético que antecedia Epicuro, possivelmente Carnéades. De acordo com o estudioso alemão Reinhold F. Glei, está claro que o argumento teodiceico é de uma fonte acadêmica não epicurista, mas talvez até anti-epicurista. A versão mais antiga ainda preservada deste trilema aparece nos escritos do cético Sexto Empírico. Charles Bray, em seu livro A Filosofia da Necessidade de 1863, cita Epicuro sem mencionar a fonte como autor do seguinte trecho:

         “Seria Deus desejoso de prevenir o mal mas incapaz? Portanto, não é onipotente. Seria ele capaz, mas sem desejo? Então é malévolo. Seria ele tanto capaz quanto desejoso? Então por que há mal?”

        
De Ira Dei” de Lactântio
N.A.Nicholson, em seu Philosophical Papers de 1864, atribui “as famosas indagações” a Epicuro, utilizando as palavras anteriormente fraseadas por Hume. A frase de Hume ocorre no livro décimo de seu aclamado Diálogos sobre a Religião Natural, publicado postumamente em 1778. A personagem Philo começa sua fala dizendo – “As antigas perguntas de Epicuro continuam sem resposta”. A citação que Hume faz, provém do influente Dictionnaire Historique et Critique de Pierre Bayle, que cita Lactâncio atribuindo as perguntas a Epicuro. Esta atribuição ocorre no capítulo 13 de “De Ira Dei” de Lactântio, que não fornece fontes.

         Hume postula:
        
“O poder [de Deus] é infinito: o que quer que ele deseja é executado. Mas nem homem nem qualquer outro animal é feliz. Portanto ele não deseja sua felicidade. Sua sabedoria é infinita: ele nunca erra em escolher os meios para qualquer fim: mas o curso da natureza tende a ser contrário a qualquer felicidade humana ou animal: portanto não é estabelecido para tal propósito. Através de toda a história do conhecimento humano, não há inferências mais certas e infalíveis do que estas. Em que ponto, portanto, sua benevolência e misericórdia lembram a benevolência e misericórdia dos homens?”




Um comentário:

  1. Ótimo artigo. Engraçado que antes de tê-lo lido eu já havia feito esse mesmo questionamento sobre Deus. E isso me levou a preferir o ateismo à conclusão de que existe um deus que não se importa com a felicidade dos entes que criou. É simplesmente uma questão de lógica!

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