sábado, 2 de março de 2013

CAPITULO XIII DA HISTÓRIA DA RIQUEZA DO HOMEM DE LÉO HUBERMAN, SOBRE A REVOLUÇÃO BURGUESA NA FRANÇA



(assunto: revolução francesa, revoluções burguesas)





CAPÍTULO XIII


"A Velha Ordem Mudou”...


QUE pensaria o leitor de um governo que taxasse os pobres, mas não os ricos? Totalmente louco, seria seu primeiro pensamento; refletindo, poderia ocorrer-lhe que, de certa forma, é o que o governo dos Estados Unidos está fazendo hoje. Haverá naturalmente muita gente para discordar disso - gente que procuraria provar que os ricos nos E. U. A. pagam uma proporção de impostos mais do que justa: Mas quanto ao fato de que o governo francês do século XVIII realmente cobrava impostos dos pobres, e não dos ricos, não pode haver discordância.

E não pode haver porque as próprias classes privilegiadas admitiam estarem isentas praticamente de todas as taxas da época. O clero e a nobreza julgavam que seria o fim do país se, como a gente comum, tivessem de pagar impostos. Quando o governo da França estava em má situação financeira, com as despesas se acumulando rapidamente e deixando muito longe a receita, ocorreu a alguns franceses que a única saída dessa dificuldade era cobrar impostos dos privilegiados. Turgot, Ministro das Finanças em 1776, tentou pôr em prática algumas reformas - muito necessárias - do sistema fiscal. Mas os privilegiados não queriam saber disso. Cerraram fileiras em torno do Parlamento de Paris, que assim definiu, claramente, sua posição: A primeira regra da justiça é preservar a alguém o que lhe pertence: essa regra consiste não apenas da preservação dos direitos de propriedade, mas ainda mais da preservação dos direitos da pessoa, oriundos de prerrogativas de nascimento e posição Dessa regra de lei e eqüidade segue-se que todo sistema que, sob a aparência de humanitário e beneficente, tenda a estabelecer uma igualdade de deveres e destruir as distinções necessárias levará dentro em pouco à desordem (resultado inevitável da igualdade) e provocará a derrubada da sociedade civil. A monarquia francesa, pela sua constituição, é formada de vários Estados distintos. O serviço pessoal do clero é atender às funções relacionadas com a instrução e o culto. Os nobres consagram seu sangue à defesa do Estado e ajudam o soberano com seus conselhos. A classe mais baixa da Nação, que não pode prestar ao rei serviços tão destacados, contribui com seus tributos, sua indústria e seu serviço corporal. Abolir essas distinções é derrubar toda a constituição francesa.

O clero e a nobreza eram as classes privilegiadas. Chamavam-se de Primeiro Estado e Segundo Estado, respectivamente. O clero tinha cerca de 130.000 membros, e a nobreza aproximadamente 140.000. Embora fossem as classes privilegiadas, nem sempre eram ricos ou viviam na ociosidade. Havia bispos muito ricos e nobres muito ricos. Havia sacerdotes que trabalhavam muito e nobres também. Como havia ociosos na Igreja e na nobreza. E, em meio destes, havia também outros grupos.

A classe sem privilégios era o povo, a gente comum, que tinha o nome de Terceiro Estado. Da população de 25 milhões de habitantes da França, representavam mais de 95%. E, tal como havia diferença de riqueza e modo de vida entre as classes privilegiadas, também havia diferença entre os sem privilégios. Cerca de 250.000 destes, constituindo a classe média superior, ou burguesa, estavam relativamente bem, em comparação com o restante dos membros do Terceiro Estado. Outro grupo consistia de artesãos vivendo em pequenas aldeias e cidades. Seu número se elevava a 2 milhões e meio. Todo o resto, cerca de 22 milhões, eram camponeses que trabalhavam na terra. Pagavam impostos aos Estados, dízimos ao clero e taxas feudais à nobreza.

Eu e o leitor organizamos nossa vida de modo que nossos gastos são determinados pela nossa renda. Os governos, de modo geral, procuram fazer o mesmo. Mas o governo da França no século XVIII agia de modo oposto. Gastava o dinheiro totalmente, extravagantemente, sem sistema, e corruptamente. Um exemplo mostrará isso. O Livre Rouge era um ,Livro Vermelho contendo a lista de todas as pessoas á quem o governo dava pensões. Entre elas estava o nome de Ducrest, um barbeiro. Por que tinha ele direito a uma pensão de 1.700 libras anuais? Porque havia sido o cabeleireiro da filha do Conde d'Artois. O fato de que essa filha tivesse morrido cedo, antes de ter cabelos para pentear, não tinha importância. Ducrest recebia sua pensão."

Esse é um exemplo da forma insensata pela qual as finanças francesas eram administradas. Há milhares de outros. Ao invés de regular a despesa pela receita, a receita era determinada pela despesa. Gastos ociosos, sem finalidades, significavam a necessidade de recolher maior quantidade de dinheiro com impostos. E como as classes privilegiadas não contribuíam com sua parte (pelo contrário, impunham aos plebeus taxas próprias), e como os membros mais ricos do Terceiro Estado conseguiam, por tortuosos caminhos, isentar-se dos impostos diretos, todo o peso recaía sobre os pobres. Era um peso difícil. Um quadro verdadeiro do período mostraria o camponês curvado carregando em suas costas o rei, o padre e o nobre.

Um francês famoso, De Tocqueville, mostrou o que representava esse peso dos impostos na vida diária do camponês: "Imagine o leitor um camponês francês do século XVIII... apaixonadamente enamorado da terra, ao ponto de gastar todas as suas economias para adquiri-la ... Para completar essa compra, ele tem primeiro de pagar um imposto... Finalmente, a terra é dele; seu coração nela está enterrado, com as sementes que semeia, mas novamente seus vizinhos o chamam do arado, obrigam-no a trabalhar para eles sem pagamento. Tenta defender sua nascente plantação contra as manobras dos senhores de terra; estes novamente o impedem. Quando ele cruza o rio, esperam-no para cobrar uma taxa. Encontra-os no mercado, onde lhe vendem o direito de vender seus produtos; e quando, de volta a casa, ele deseja usar o restante do trigo para sua própria alimentação não pode tocá-lo enquanto não o tiver moído no moinho e cozido no forno dos mesmos senhores de terras. Uma parte da renda de sua pequena propriedade é gasta em pagar taxas a esses senhores Tudo o que fizer, encontra sempre esses vizinhos em seu caminho.., e quando estes desaparecem, surgem outros com as negras vestes da Igreja, para levar o lucro líquido das colheitas... A destruição de parte das instituições da Idade Média tornou cem vezes mais odiosa a parte que ainda sobrevivia." 189 Isso parece a descrição do sistema feudal do século XI. Não houve, então, modificações nos sete séculos que se seguiram? Sim, houve. Dos 22 milhões de camponeses existentes na França na época de 1700, apenas 1 milhão era de servos, no sentido antigo. Os outros se haviam elevado na escala, desde a servidão até a liberdade completa. Mas isso não significava que as velhas taxas e serviços feudais tivessem desaparecido. Algumas foram-se, mas outras continuavam. Continuavam apesar de ter sido abolida há muito a causa de sua origem. Os nobres que recebiam taxas e serviços feudais pelo fato de darem proteção militar já não constituíam o exército real - sua função militar acabara. Não ajudavam o governo como um grupo - apenas individualmente - nem tinham qualquer função política ou administrativa. Não trabalhavam a terra, não se dedicavam aos negócios - não tinham função econômica. Recebiam sem dar. Na maioria dos casos, tornavam-se ociosos, parasitas, passando o tempo na corte, muito longe de suas propriedades. Não obstante, ainda exigiam e ainda recebiam pagamentos e serviços dos camponeses. Eram um peso morto que os camponeses carregavam. E como De Tocqueville mostra, na última frase da citação acima, o simples fato de que algumas das taxas existentes haviam desaparecido apenas tornava as remanescentes mais odiadas.

Qual, exatamente, a proporção de sua renda que o camponês pagava em impostos? A resposta surpreenderá. Calculou-se que nada menos de 80% dos seus ganhos eram pagos aos vários coletores de impostos! Dos 20% que restavam, ele tinha que alimentar, abrigar e vestir sua família. Não é de espantar que o camponês reclamasse. Não é de espantar que uma colheita má o deixasse à beira da fome. Nem que muitos de seus vizinhos vagassem pelas estradas como mendigos, famintos.

A Revolução Francesa estourou em 1789. Mas não se conclua com isso que os camponeses estivessem, no século XVIII, em pior situação do que no século XVII. Não estavam. Talvez estivessem até melhor. Na verdade, de uma forma ou de outra, os camponeses haviam poupado bastante de sua insignificante renda, depois de pagas as muitas taxas, para comprar a terra. Por cem anos ou mais antes da Revolução, os camponeses compraram propriedades, de forma que, quando o ano de 1789 chegou, cerca de um terço das terras da França estava em suas mãos. Isso, porém, apenas os deixou mais descontentes do que antes. Por quê?

Eram famintos de terra. Puderam satisfazer um pouco dessa fome. Que impedia seu avanço? O peso esmagador que lhes impunham o Estado e as classes privilegiadas. Passaram a ver, com maior clareza, que, se atirassem fora o fardo, poderiam ficar eretos - elevar-se da situação de animal para a de homem. O simples fato de ter sua posição melhorada um pouco abriu-lhes os olhos para o que poderiam ser, se... Isso não queria dizer que os camponeses da França (e de outros países da Europa ocidental) não tivessem pensado em acabar com os pagamentos e restrições feudais. Pensaram. Houve revoltas camponesas, antes. Embora não tivessem conseguido derrubar todas as regulamentações feudais, melhoraram a sorte dos camponeses. Mas para se libertarem totalmente, estes precisavam de auxílio e liderança.

Encontraram-nos na nascente classe média.

Foi essa classe média, a burguesia, que provocou a Revolução Francesa, e que mais lucrou com ela. A burguesia provocou a Revolução porque tinha de fazê-lo. Se não derrubasse seus opressores, teria sido por eles esmagada. Estava na mesma situação do pinto dentro do ovo que chega a um tamanho em que tem de romper a casca ou morrer. Para a crescente burguesia os regulamentos, restrições e contenções do comércio e indústria, a concessão de monopólios e privilégios a um pequeno grupo, os obstáculos ao progresso criados pelas obsoletas e retrógradas corporações, a distribuição desigual dos impostos, continuamente aumentados, a existência de leis antigas e a aprovação de novas sem que fosse ouvida, o grande enxame de funcionários governamentais bisbilhoteiros e o crescente volume da dívida governamental - toda essa sociedade feudal decadente e corrupta - era a casca que devia ser rompida. Não desejando ser asfixiada até morrer penosamente, a classe média burguesa que surgia tratou de fazer que a casca fosse rompida.

Quem era a burguesia? Eram os escritores, os doutores, os professores, os advogados, os juizes, os funcionários - as classes educadas; eram os mercadores, os fabricantes, os banqueiros - as classes abastadas, que já tinham direito e queriam mais. Acima de tudo, queriam - ou melhor, precisavam - lançar fora o jugo da lei feudal numa sociedade que realmente já não era feudal. Precisavam deitar fora o apertado gibão feudal e substituí-lo pelo folgado paletó capitalista. Encontraram a expressão de suas necessidades no campo econômico, nos escritos dos fisiocratas de Adam Smith; e a expressão de suas necessidades, no campo social, nos trabalhos de Voltaire, Diderot e dos enciclopedistas. Laissez-faire no comércio e indústria teve sua contrapartida no "domínio da razão" na religião e na ciência.

Nada mais enlouquecedor do que ver alguém que não dispõe de nossa capacidade de trabalho colher os frutos desse trabalho simplesmente porque teve um "impulso" qualquer. A burguesia estava mais ou menos nessa posição. Tinha o talento. Tinha a cultura. Tinha o dinheiro. Mas não tinha na sociedade a situação legal que tudo isso lhe devia conferir. "Bar-nave tornou-se revolucionário no dia em que sua mãe teve de deixar o camarote que ocupava no teatro em Grenoble para dar lugar a um nobre. Roland queixa-se de que ao ser convidada para jantar no Castelo de Fontenay com sua mãe, serviram-lhe a comida na mesa dos empregados. Quantos, se tornaram inimigos do velho regime por terem seu orgulho ferido"

A burguesia quase não possuía terras, mas tinha o capital. Emprestara dinheiro ao Estado. Queria-o, agora, de volta. Conhecia o bastante das questões do governo para ver que a estúpida e perdulária administração do dinheiro público poderia levar à bancarrota. Alarmava-se com a perspectiva de perder suas economias.

A burguesia desejava que seu poder político correspondesse ao poder econômico que já tinha. Era dona de propriedades - queria agora os privilégios. Queria ter certeza de que sua propriedade estaria livre das restrições aborrecidas a que estivera sujeita na decadente sociedade feudal. Queria ter certeza de que os empréstimos feitos ao governo seriam pagos. Para isso, tinha de conquistar não somente uma voz, mas a voz no governo. Sua oportunidade chegou - e ela soube aproveitá-la.

A oportunidade chegou porque a França estava em tamanho caos que já não era possível as coisas continuarem como antes. Com isso concordava até um membro da nobreza, o Conde de Calonne. Sua posição no importante posto de Ministro das Finanças permitia-lhe ver claramente a situação. "A França, é um reino composto de Estados e países separados com administrações mistas, cujas províncias nada sabem umas das outras, onde certos distritos estão completamente livres de fardos cujo peso total recai sobre outros, onde a classe mais rica é a que menos imposto paga, onde o privilégio perturbou todo o equilíbrio, onde é impossível ter um governo constante ou uma vontade unânime: necessariamente, é um reino muito imperfeito, cheio de abusos, e, na sua condição presente, impossível de governar." Observem-se particularmente as três últimas palavras. Um membro da classe dominante admite ser impossível continuar governando; acrescente-se a isso as massas descontentes, e ainda uma classe inteligente e em ascensão, ansiosa de tomar o poder, e teremos dessa mistura uma revolução, que rebentou em 1789. Seu nome: Revolução Francesa.

Uma descrição simples dos objetivos dos revolucionários foi feita por um de seus líderes, o Abbé Sieyès, num folheto popular intitulado O que é o Terceiro Estado?: "Devemos formular três perguntas:

Primeira: O que é o Terceiro Estado? Tudo.

Segunda: O que tem ele sido em nosso sistema político? Nada.

Terceira: O que pede ele? Ser alguma coisa.

Embora seja verdade que todos os membros do terceiro Estado, artesãos, camponeses e burguesia, estivessem tentando "ser alguma coisa", foi principalmente o último grupo que conseguiu 'o que queria. A burguesia forneceu a liderança, enquanto Os outros grupos realmente lutaram. E foi a burguesia quem mais lucrou. Durante o curso da revolução, teve várias oportunidades para enriquecer e fortalecer-se. Especulou nas terras tomadas da Igreja e da nobreza, e amontoou fortunas imensas através de contratos fraudulentos com o exército.

Marat, o porta-voz da classe trabalhadora mais pobre, descreveu o que ocorria durante a Revolução, com as seguintes palavras: "No momento da insurreição o povo abriu caminho por sobre todos os obstáculos pela força do número; mas, por muito poder que tenha conseguido inicialmente, foi por fim derrotado pelos conspiradores da classe superior, cheios de astúcia, artimanhas e habilidade. Os integrantes educados e sutis da classe superior a princípio se opuseram aos déspotas; mas isso apenas para voltar-se contra o povo, depois de se ter insinuado na confiança e usado seu poder, para se colocarem na posição privilegiada da qual os déspotas haviam sido expulsos. A revolução é feita e realizada por intermédio das camadas mais baixas da sociedade, pelos trabalhadores, artesãos, pequenos comerciantes, camponeses, pela plebe, pelos infelizes, a que os ricos desavergonhados chamam de canalha e a que os romanos desavergonhadamente chamavam de proletariado. Mas o que as classes superiores ocultam constantemente é o fato de que a Revolução acabou beneficiando somente os donos de terras, os advogados e os chicaneiros." É uma descrição exata do que ocorreu. Depois que a Revolução acabou, foi a burguesia quem ficou com o poder político na França. O privilégio de nascimento foi realmente derrubado, mas o privilégio do dinheiro tomou seu lugar. "Liberdade, igualdade, Fraternidade" foi uma frase popular gritada por todos os revolucionários, mas que coube principalmente à burguesia desfrutar.

O exame do Código Napoleônico deixa isso bem claro. Destinava-se evidentemente a proteger a propriedade - não a feudal, mas a burguesa. O Código tem cerca de 2.000 artigos, dos quais apenas 7 tratam do trabalho e cerca de 800 da propriedade privada. Os sindicatos e, as greves são proibidas, mas as associações de empregadores permitidas. Numa disputa judicial sobre salários, o Código determina que o depoimento do patrão, e não do empregado, é que deve ser levado em conta O Código foi feito pela burguesia e para a burguesia: foi feito pelos donos da propriedade para a proteção da propriedade.

Quando o fumo da batalha se dissipou, viu-se que a burguesia conquistara o direito de comprar e vender o que lhe agradasse, como, quando, e onde quisesse. O feudalismo estava morto.

E morto não só na França, mas em todos os países conquistados pelo exército de Napoleão. Este levou consigo o mercado livre (e os princípios do Código Napoleônico) em suas marchas vitoriosas. Não é de surpreender que fosse bem recebido pela burguesia das nações conquistadas! Nesses países, a servidão foi abolida, as obrigações e pagamentos feudais foram eliminados, e o direito dos camponeses proprietários, dos comerciantes e industriais, de comprar e vender sem restrições, regulamentos ou contenções, se estabeleceu definitivamente.

Um excelente sumário dessa fase da Revolução Francesa foi escrito por Karl Marx em 1852, no Dezoito de Brumário de Luis Bonaparte: "Desmoulins, Danton, Robespierre, Saint-Just, Napoleão, os heróis e os partidos e massas da grande Revolução Francesa terminaram a tarefa da época - que foi a libertação da burguesia e o estabelecimento da moderna sociedade burguesa. Os jacobinos revolveram o terreno no qual o feudalismo tinha raízes, e abalaram a estabilidade dos magnatas feudais que nelas se apoiavam. Napoleão estabeleceu por toda a França as condições que tornaram possível o desenvolvimento da livre concorrência, a exploração das terras depois da divisão das grandes propriedades, e a plena utilização da capacidade de produção industrial do país. Através das fronteiras, por toda parte, fez uma derrubada das instituições feudais.. ."

As revoluções são geralmente sangrentas. Muita gente se choca com a violência e o terror do modelo francês. É interessante que os mais fortes adversários da Revolução Francesa fossem os ingleses. O fato é especialmente notável porque a luta da burguesia inglesa para conquistar o poder político correspondente ao seu poder econômico ocorrera um século antes da Revolução Francesa, e a violência que a acompanhara já fora esquecida. Houve, porém, uma diferença. Enquanto na França o Comércio teve de dar no Nascimento um violento golpe, do qual este jamais se recobrou, na Inglaterra a vitória foi conquistada por uma decisão, e não com luta. Parece que na Inglaterra, Comércio e Nascimento se conheciam bem e se entendiam melhor do que nos outros países. A burguesia inglesa pode tornar-se uma aristocracia rural, e a aristocracia rural dedicou-se aos Negócios sem se preocupar muito com o preconceito de "estar acima dessas coisas. Não obstante, os anos de 1640-1688 marcam, na história inglesa, um período de luta - que se cessou quando a burguesia conquistou o direito de participar do governo.

O leitor se lembrará do nome de Edmund Burke, o grande estadista britânico que tão habilidosamente defendeu os colonos americanos na questão da "taxação sem representação". Quando escreveu uma série de artigos condenando amargamente os revolucionários franceses, outro inglês lembrou-lhe a "Gloriosa Revolução" da própria Inglaterra, cem anos antes: "Em nome da humanidade, em nome do homem, em nome do bom, qual a ofensa irremediável, o crime imperdoável, que o povo da França cometeu contra este país? Terá sido pela modificação feita em seu governo pela Revolução de 1789? Ele difere de nós nessa questão apenas pelo fato de estar com um século de atraso. Será por sujeitarem o monarca ao controle? A nação britânica deu o exemplo.”

Na Inglaterra, em 1689, e na França, em 1789, a luta pela liberdade do mercado resultou numa vitória da classe média. O ano de 1789 bem pode ser considerado como o fim da Idade Média, pois foi nele que a Revolução Francesa deu o golpe mortal no feudalismo. Dentro da estrutura da sociedade feudal de sacerdotes, guerreiros e trabalhadores, surgira um grupo da classe média. Através dos anos, ela foi ganhando força. Havia empreendido uma luta longa e dura contra o feudalismo, marcada particularmente por três batalhas decisivas. A primeira foi a Reforma Protestante; a segunda foi a Gloriosa Revolução na Inglaterra, e a terceira, a Revolução Francesa. No fim do século XVIII era pelo menos bastante forte para destruir a velha ordem feudal. Em lugar do feudalismo, um sistema social diferente, baseado na livre troca de mercadorias com o objetivo primordial de obter lucro, foi introduzido pela burguesia.

A esse sistema chamamos - capitalismo.

domingo, 24 de fevereiro de 2013

O LEMA MAIS FAMOSO DA REVOLUÇÃO FRANCESA.




            Liberté, Egalité, Fraternité foi o lema da Revolução Francesa. O slogan sobreviveu à revolução, tornando-se o grito de ativistas em prol da democracia liberal ou constitucional e da derrubada de governos opressores à sua realização. O slogan é citado na Constituição francesa de 1946 e 1958.


            Embora seja impossível apontar um autor, um dia, uma hora, e termos de apontar o seu aparecimento como sendo sobretudo criação coletiva dessa conturbada época, quem na verdade se refere a esta trilogia primeiro parece fora desse contexto revolucionário. Ela pertence ao humanista cristão Étienne de La Boétie, amigo de Montaigne e colaborador de Michel de l´Hôpital, que a escrevera, já por volta de 1550, no seu "Discours de la servitude volontaire" ("Discurso da servidão voluntária").

            Em seguida, encontramos os três princípios nas obras de alguns autores católicos do século XVII com igual propósito, nomeadamente em Antoine Arnauld que propõe, em 1644, uma tradução do "De moribus ecclesiæ catholicæ", de Santo Agostinho no qual se lê que: a Igreja reúne os homens em fraternidade, que os religiosos vivem a igualdade por não terem propriedades, que os fiéis “vivem na caridade, na santidade e na liberdade cristã”.

            Só muito mais tarde, em Maio de 1791, vê-mos-lo num discurso inflamado de René Louis de Girardin, marquês de Vauvray, dirigido aos membros do Clube dos Cordeliers, no qual, pela primeira vez, foi proposta o lema “Liberdade, igualdade, fraternidade” que a partir daí se tornaria a da República Francesa e por "simpatia" ou "incorporação" o da francomaçonaria que a apoiava.

            Liberdade, igualdade, fraternidade ou a morte!



            A sua fidelização. enquanto divisa simbólica, surgirá reforçada logo em 1793 com o hebertista Antoine-François Momoro ordenando aos seus cidadãos, de Paris, a pendurarem nas suas casas, em grandes caracteres, as seguintes palavras: "Unidade, Indivisibilidade da República, Liberdade, Igualdade, Fraternidade, ou a Morte” e que estava dentro do seu espírito ateu e grande divulgador do Culto da Razão.
            Durante a ocupação alemã na França durante a II Guerra Mundial o lema foi substituído na área do governo de Vichy com a frase Travail, famille, patrie (trabalho, família e pátria) para evitar possíveis interpretações subversivas e desordenadas.


Lady Gaga contribui para seu conhecimento de Revolução Francesa:


DOIS ESQUEMAS SOBRE A REVOLUÇÃO FRANCESA

Como era a sociedade francesa anterior a revolução?


Como suas classes sociais estavam divididas?



A sociedade francesa estava dividida em 3 estamentos:


  •   CLERO -  1.º estado
  •   NOBREZA - 2.º estado
  •   POVO - (burguesia, operários e camponeses) - 3.º estado








A Revolução Francesa pode ser, também,
 esquematizada desta maneira:




terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

INTERESSANTE ARTIGO QUE EXPLICA AS DIFERENCIAÇÕES ENTRE OS SERES HUMANOS


Como surgiram as raças que constituem a humanidade?

por Roberto Navarro (Revista Mundo Estranho da Abril)

            Primeiro, é preciso deixar bem claro que a maioria dos cientistas rejeita o termo "raça" para se referir a seres humanos. Afinal, são insignificantes as variações genéticas entre um europeu e um africano, ou entre esse e um asiático. Por isso, só há sentido em falar de uma única raça humana. Mas também é verdade que entre esse mesmo europeu, o africano e o asiático existem diferenças físicas que qualquer um pode enxergar. Essa diversidade apareceu ao longo do tempo, à medida que o homem precisou se adaptar na marra aos diversos ambientes e regiões que foi ocupando no planeta. Ao chegar e se estabelecer num local mais frio e pouco ensolarado, por exemplo, uma pele mais clara ajudava a aproveitar melhor os raros raios solares - importantes, entre outras coisas, para o corpo produzir vitamina D. Dessa forma, toda essa população clareava sua pele de geração em geração, por meio da seleção natural.

            O antropólogo americano Eugene Harris, pesquisador visitante do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP), destaca que o isolamento foi um elemento importante nesse processo de diferenciação. Um grupo que não mantinha contato com outros arranjava soluções próprias para enfrentar os desafios do ambiente em que vivia. Dessa adaptação forçada nas andanças pela Terra, surgiram os três grandes grupos em que o ser humano tradicionalmente é dividido: negroides, caucasianos e mongoloides. Apesar das diferenças físicas, todos eles tiveram os mesmos ancestrais, que, provavelmente, viviam na África há, no mínimo, 150 mil anos. De lá, o homem começou a invadir outras regiões e continentes. Primeiro, o Oriente Médio. Depois, a Ásia, a Europa e a Oceania. Por último, chegou aqui na América, quando a variedade de tipos humanos já era um fato.

  1. Evidências arqueológicas indicam que o Homo sapiens surgiu na África há pelo menos 200 mil anos. Cem mil anos atrás, ele começou a se espalhar pelos outros continentes. O primeiro destino foi o Oriente Médio
  2. Entre 70 mil e 50 mil anos atrás, surgiram duas novas rotas de migração do Homo sapiens: uma população seguiu do Oriente Médio para o restante do continente asiático e a Austrália. O outro grupo rumou em direção à Europa
  3. No nordeste da Ásia começou a viagem que levaria o homem a ocupar a última região do planeta: a América. Estima-se que isso possa ter ocorrido até 30 mil anos atrás, embora os fósseis mais antigos achados no continente americano não ultrapassem 15 mil anos

Herança da migração

As andanças do ser humano deram origem a seus três principais grupos étnicos:

  • negroides - Grupo formado pelas populações que permaneceram no continente africano. A cor da pele, escura, é sua principal característica. Lábios grossos e narinas largas também são traços comuns

  • caucasoides - O nome refere-se à região do Cáucaso, no sul da Rússia, onde as primeiras populações desse grupo teriam vivido. Acabaram desenvolvendo uma pele mais clara porque se espalharam pela Europa, onde a pele escura prejudicava a absorção dos raios do Sol, bem mais raros que na África

  • mongoloides - Surgiram em regiões da Ásia de baixas temperaturas. Isso explicaria características físicas como o nariz mais achatado - adaptação adequada para evitar o congelamento que atinge principalmente as extremidades do corpo. A população humana que se espalhou pelo continente americano seria um subgrupo dos mongoloides

domingo, 17 de fevereiro de 2013

A REVOLUÇÃO BURGUESA NA FRANÇA












A REVOLUÇÃO FRANCESA


1)     A FRANÇA PRÉ-REVOLUCIONÁRIA


            A França nos fins do século XVIII era um país agrário. A introdução de novas técnicas de cultivo e de novos produtos permitiu a melhoria da alimentação, e com isso, o aumento da população. A industrialização incipiente nos grandes centros urbanos, como Paris, já era suficiente para reduzir o preço de alguns produtos, estimulando o consumo.


            O desenvolvimento econômico fortaleceu a burguesia, que passou a aspirar ao poder político e a discutir os privilégios da nobreza. Os camponeses possuidores de terras queriam, por sua vez, libertar-se das obrigações feudais que deviam aos senhores.


            A França tinha nessa época aproximadamente 25 milhões de habitantes, sendo que mais de 20 milhões viviam na zona rural. Essa população formava uma sociedade de estamentos - resquício da Idade Média -, mas já se percebia nela uma divisão de classes. O clero era composto por cerca de 120 mil religiosos, divididos em alto clero, bispos e abades que estavam ao nível da nobreza, e baixo clero, padres e vigários de baixa condição econômica e social; o conjunto do clero constituía o primeiro estado. A nobreza – o segundo estado – era formada de 350 mil membros; a nobreza palaciana vivia das pensões reais, usufruindo os cargos públicos; a nobreza provincial vivia no campo, em situação de penúria econômica. Havia ainda a chamada nobreza de toga, constituída por elementos oriundos da burguesia formada pelos profissionais liberais, que compravam seus cargos políticos e administrativos. O terceiro estado representava o restante da população, cerca de 98%: a alta burguesia composta por banqueiros, financistas e grandes empresários; a média burguesia formada pelos profissionais liberais – médicos, dentistas, professores, advogados, etc.; a pequena burguesia, os artesãos, os lojistas e o povo, os sans–culottes, a camada social heterogênea de artesãos, aprendizes e proletários. As classes populares rurais, que chegavam a 20 milhões, destacando-se os servos ainda em condição feudal (uns quatro milhões) e os camponeses livres e semilivres completavam o terceiro estado.


            Sobre a massa da população, o terceiro estado, pesava o ônus dos impostos e das contribuições para o rei, para o clero e nobreza. As outras duas ordens, as privilegiadas, tinham isenção tributária: não pagavam impostos e usufruíam as vantagens concedidas pela monarquia sobe a forma de pensões e cargos públicos. A principal reivindicação do terceiro estado era a abolição desses privilégios e a instauração da igualdade civil.


            No plano político, a revolução resultou do absolutismo monárquico e das injustiças decorrentes. O rei monopolizava a administração, concedia privilégios, esbanjava com o luxo da corte, controlava os tribunais e condenava à famigerada Bastilha, sem julgamento, através das Lettres de Cachet. Era incapaz de bem dirigir a economia do Estado, constituindo-se num entrave para o desenvolvimento do capitalismo na França.


            A arrecadação de impostos era precária. O Estado não tinha uma máquina administrativa para cobrar os impostos – a cobrança era feita por arrecadadores particulares, que se aproveitavam ao máximo, espoliando o terceiro estado. Como os gastos eram excessivos, o déficit orçamentário se avolumava. Na época da revolução, a dívida externa da França chegava a 5 bilhões de libras, enquanto todo seu meio circulante não passava de 2,5 bilhões. Essa situação foi denunciada pelos filósofos iluministas. Seus livros eram cada vez mais lidos: formavam-se clubes para sua leitura. A burguesia cada vez mais tomava consciência dos seus problemas e dos seus direitos, e procurava conscientizar a massa para obter o seu apoio.


            Existiam todas as condições necessárias para precipitar uma revolução. Faltava apenas o momento oportuno, uma conjuntura favorável.


2)     A REVOLTA ARISTOCRÁTICA


            A indústria na França sofreu séria crise a partir de 1786, quando foi feito um tratado comercial com a Inglaterra, pelo qual os produtos agrícolas franceses tinham plena liberdade na Inglaterra em troca da penetração dos produtos industriais ingleses na França. A incipiente indústria francesa não teve condições de agüentar a concorrência, entrando em crise.


            A grande seca do ano de 1788 diminuiu a produção de alimentos; os preços subiram violentamente e os camponeses começaram a passar fome. Na cidade a miséria não era menor. A situação do tesouro, que já não era favorável, tornou-se ainda pior depois que a França apoiou a Independência dos Estados Unidos, gastando na aventura 2 bilhões de libras.


            O descontentamento era geral. Urgia a necessidade de reformas que saneassem o caos econômico. Luís XVI incumbiu o ministro Turgot de realizar reformas tributárias, mas a oposição dos nobres foi muito grande e ele teve de se demitir.


             O rei então indicou Calonne para o Ministério, que imediatamente convocou uma reunião dos nobres e clérigos: a Assembléia dos Notáveis (1787). O ministro propôs que esses dois estados abdicassem dos seus privilégios tributários, pagando impostos para tirar o Estado da falência financeira. Os nobres recusaram-se a aceitar estas medidas, além de provocarem revoltas de protesto nas províncias em que seu poder era mais forte.


            O novo ministro Necker, com a conivência dos nobres, convenceu o rei a convocar a Assembléia dos Estados Gerais, que não se reunia desde 16     14. O que pretendia é que o terceiro estado pagasse os impostos que o clero e os nobres não queriam pagar. As eleições foram realizadas em abril de 1789, coincidindo com as revoltas geradas pela péssima colheita desse ano. Em Paris, os panfletos dos candidatos atacavam os erros do Antigo Regime e agitavam a massa urbana, os sans-culottes, cerca de 200 mil numa população de 600 mil habitantes.


            O primeiro impasse nas eleições surgiu quanto ao número de representantes de cada estado. Até a última reunião dos Estados Gerais (1614), cada estado tinha 300 deputados. Assim, clero e nobreza juntos teriam 600.


             O terceiro estado desejava um número igual de deputados, alegando que representava a maioria da população.

            Em maio de 1789 os Estados Gerais reuniram-se pela primeira vez no Palácio de Versalhes. Os deputados do terceiro estado foram informados que a votação dos projetos seria feita em separado, pro estado. Isto garantia a vitória do clero e da nobreza, que votariam juntos. O terceiro estado negou-se a aceitar esta condição: ele tinha 578 deputados, a nobreza 270 e o clero 291, ou seja, teria maioria absoluta, desde que a votação fosse individual.  Além disso, podia contar os votos de 90 deputados da nobreza esclarecida e 200 do clero, especialmente do baixo clero.




3)     A REVOLUÇÃO BURGUESA


            Reunindo-se em separado em 17 de junho de 1789, o terceiro estado se considerou Assembléia Nacional. O rei Luís XVI, pretextando uma reforma na sala de reuniões, dispersou a Assembléia. Os deputados do terceiro estado foram então para a sala de Jogo da Péla, onde receberam adesão de parte do clero e de nobres influenciados pelo Iluminismo. O rei não teve alternativa senão aceitar a situação de fato, dando validade à Assembléia Nacional, após uma frustrada tentativa de fechamento da Assembléia, a 23 de junho.


            Os fatos se desenrolaram com rapidez, como se algumas décadas fossem comprimidas em algumas semanas.


            No dia 9 de julho de 1789 deu-se a prloclamação da Assembléia Nacional Constituinte. Os deputados juraram só se dispersar depois de dar uma Constituição à França.


            Luís XVI procurava ganhar tempo, enquanto reunia tropas para conter os movimento revolucionário. Com a demissão do ministro Necker, a   12 de julho a tensão aumentou. A 13 de julho formou-se a milícia de Paris, organização militar-popular. Foram armazenadas armas e prepararam-se barricadas. A
14 de julho o povo tomou a Bastilha, fortaleza onde o rei encarcerava seus inimigos políticos. A explosão revolucionária em Paris alastrou-se por todo o país.


            No campo, a revolução adquiriu maior violência. Os camponeses procurando destruir o jugo feudal, saquearam propriedades da nobreza e invadiram cartórios e queimaram títulos de propriedade feudal. Ao mesmo tempo, generalizaram-se os boatos de que um grande número de bandidos,  aliciados pelos “senhores”, vinham para atacar os camponeses, gerando o famoso grande medo, que pode ser explicado pela enorme tensão coletiva existente.


            Para conter o movimento que se alastrava cada vez mais, os deputados da  Assembléia Constituinte, em reunião do dia 4 até o dia 26 de agosto, aprovaram a abolição dos direitos feudais: as obrigações devidas pelos camponeses ao rei e à Igreja foram suprimidas; as obrigações devidas aos nobres deveriam ser resgatadas monetariamente, em prazo e condições a serem estabelecidos posteriormente.

 

            A 26 de agosto foi aprovada a Declaração dos Diretos do Homem e do Cidadão. De inspiração iluminista, o documento defendia o direito à liberdade, à igualdade perante a lei, à inviolabilidade da propriedade e o direito de resistir à opressão.


            Como o rei se recusou a aprovar essa declaração da Assembléia, a massa parisiense revoltou-se novamente. Foram as jornadas de outubro: o Palácio de Versalhes foi invadido e o rei obrigado a morar em Paris no Palácio das Tulherias.


            Na sessão que votou o direito de veto (poder concedido ao rei de vetar decisões da Assembléia), os aristocratas sentam-se à direita do presidente; os democratas, à esquerda. Tal fato deu origem à separação que chega aos dias de hoje, entre direita e esquerda na política.


            No ano de 1790 foi aprovada a Constituição Civil do Clero, a qual estabelecia que os bens eclesiásticos seriam confiscados para servir de lastro à emissão dos assignats (bônus do Estado) e os padres passariam a ser funcionários civis do Estado. Muitos padres aceitaram a nova lei prestaram juramento de fidelidade à revolução, desobedecendo à orientação do papa, que já se manifestara contra a revolução. Outros, fiéis ao papa, reagiram e foram denomindos refratários. Grande número deles emigraram e deram início às agitações contra-revolucionárias nas províncias.


            Em 1791  ficou pronta a Constituição. O poder executivo caberia ao rei, e o legislativo, à Assembléia, que funcionaria regularmente.  O trono continuaria hereditário e os deputados teriam mandato por dois anos. Só seriam eleitores os que tivessem um mínimo de riqueza, segundo um critério censitário.  O feudalismo foi abolido, suprimindo-se as antigas ordens sociais, e os privilégios, com a proclamação da igualdade civil. Manteve-se a escravidão nas colonias, a administração foi reorganizada e descentralizada. A nacionalização dos bens eclesiásticos e a Constituição Civil do Clero foram confirmadas.


            O rei Luís XVI, que conspirava contra a revolução, mantendo contatos com outros soberanos absolutos da Europa principalmente da Austria,  julgou  que era o momento oportuno para fugir da França e começar do exterior a contra-revolução. Fugiu em julho de 1791, mas foi preso em Varennes, recambiado ao Palácio e mantido sob vigilância.


            O êxito da Revolução na França estimulou movimentos na Holanda, Bélgica e Suíça. Na Itália, Inglaterra, Irlanda, Alemanha e Áustria, simpatizantes organizaram demonstrações de apoio. Os déspotas esclarecidos, alarmados abandonaram   seus programas de reformas, reaproximando-se da aristocracia. Escritores reacionários defendiam a idéia de uma contra-revolução para restaurar a monarquia absoluta na França. Muitos franceses - nobres, clérigos e alta burguesia -  abandonaram o país, esperando obter auxílio das potências européias. Estas, a princípio, mantiveram-se indiferentes, mas quando perceberam que as idéias revolucionárias ameaçavam abalar o absolutismo em toda a Europa, uniram-se para evitar a difusão do movimento. A ameaça de invasão da França aumentou, o que tornou inevitável a radicalização interna da revolução.


            A unidade que havia entre os patriotas contra os aristocratas, no início da revolução, foi aos poucos desaparecendo, dando origem a uma composição político-partidária bastante complexa. Os girondinos – representantes da alta burguesia – procuravam defender as posições conquistadas e evitar a ascensão da massa; os jacobinos – representantes da pequena e média burguesia – constituíam o partido mais radical, ainda mais sobe a liderança de Robespierre, que procurava o apoio dos sans-culottes, a massa numerosa da cidade de Paris: os cordeliers, independentes, buscavam uma posição de centro, oscilando entre os deputados inscritos no clube dos feuillants, mais à direita, e os jacobinos, mais à esquerda. O líder dos cordelier era La Fayette.


            Os girondinos tinham maioria e o apoio do próprio rei, que neles confiava para conter os avanços da revolução. Graças a esse fato, o rei conseguiu maioria na Assembléia para vetar o projeto que deportava os padres refratários e convocava o exércio para fazer frente aos inimigos da revolução, cuja atividade aumentava fora da França.


            Finalmente os inimigos da revolução, representados pelo exército autro-prussiano e o exército dos emigrados, comandados pelo Duque prussiano Brunswick e apoiados secretamente por Luís XVI, invadiram a França.


             Quando a invasão estrangeira começou, radicalizou-se a posição contra os nobres, considerados traidores. A massa Parisiense que ganhava cada vez maior importancia politica, apoiando os jacobinos e liderada por Danton e Marat, atacou os aristocratas nas prisões. Foi o massacre de setembro. Medidas de carater excepcional foram tomadas para conter a invasão; o exercito nacional foi convocado, com apresentação obrigatória de todos os homens válidos.

            A 20 de setembro de 1792 o exercito autro-prussiano foi batido em Valmy. Na mesma noite, em Paris foi proclamada a Republica. O rei foi considerado prisioneiro e suspeito de traição, devendo ser julgado.






4)     A REVOLUÇÃO POPULAR


            Uma nova assembléia foi formada, a Convenção, que deveria preparar nova Constituição. Os girondinos perderam a maioria para os jacobinos, reforçados pelos montanheses, grupo mais radical. Robespierre e Saint-Just lideravam os jacobinos. O julgamento de Luís XVI abalou a opinião pública européia. Os girondinos trataram de defendê-lo. Saint-Just e Robespierre pediam a condenação. O rei acabou guilhotinado em 21 de janeiro de 1793.


            O primeiro ano da República, 1793, foi chamado Ano I, no novo calendário. Uma nova representação tomou posse, eleita por sufrágio universal masculino, o que acentuou seu caráter popular; saíram vitoriosos os jacobinos e a Montanha. Pela nova Constituição, os 750 deputados eleitos escolheriam a mesa dirigente, com funções executivas.


            Europa afora, coligavam-se forças absolutistas: Inglaterra, Holanda e Santo Império. A Convenção se defendeu, organizando uma série de instituições: Comitê de Salvação .Pública, encarregado de controlar o exército; Comitê de Segurança Nacional, para garantir a segurança interna; Tribunal Revolucionário, encarregado de julgar os contra-revolucionários. Os jacobinos controlavam a Convenção e os principais Comitês.


            Começa então o expurgo de adversários. Os girondinos são acusados de partidários do rei e vários vão para a guilhotina. A jovem Charlotte Corday se vinga assassinando o jacobino Marat. Também é guilhotinada. Entramos no período do Terror, que se estenderia de junho de 1793 a julho de 1794.


            A Montanha de Robespierre dirigia essa política. As perseguições se espalharam. Os indulgentes de Danton temiam que a onda os envolvesse. Protestavam e pediam o fim das perseguições. No extremo oposto, os hebertistas, seguidores de Hébert, pregavam mais violência.


            Robespierre tentava manter-se entre os extremistas da esquerda. Como a pressão popular era grande, fazia concessões: os preços foram tabelados; os exploradores, perseguidos; os impostos sobre os ricos, aumentados; pobres, velhos e desamparados, protegidos por leis especiais; a instrução tornou-se obrigatória; bens de nobres e emigrados foram vendidos para cobrir as despesas do Estado.


            As leis sociais provocaram ondas contra-revolucionárias. Sobrevieram medidas drásticas. O Tribunal Revolucionário prendeu mais de 300.000 pessoas e condenou à morte 17.000. Muitos morreram nas prisões esperando julgamento.


            O Terror chegou ao auge e atingiu a própria Convenção. Para se manter no poder, Robespierre precisava eliminar toda oposição. Condenou Danton à morte. O radicalismo dos hebertistas igualmente criava problemas, levando-os também à guilhotina.


            O sucesso militar diminuiu a tensão interna, e a população passou a desejar o afrouxamento da repressão. Os girondinos, que tinham se isolado durante o Terror para salvar suas cabeças, voltaram à carga. Robespierre não tinha mais a massa parisiense para apoiá-lo, pois havia liquidado seus líderes. Em julho de 1794, ou 9 Termidor pelo novo calendário, Robespierre e Saint-Just foram presos e guilhotinados em seguida. A alta burguesia voltava ao poder através dos girondinos.





5)     A CONTRA-REVOLUÇÃO BURGUESA


      O poder da Convenção caiu nas mãos do Pântano, movimento formado por elementos da alta burguesia, de duvidosa moralidade pública e grande oportunismo político. Ligados aos girondinos, instalaram a Reação Termidoriana. Os clubes jacobinos foram fechados. Preparou-se nova Constituição, a do ano III (1795), que estabelecia um executivo com cinco diretores eleitos pelo legislativo, o Diretório. Os deputados comporiam duas câmaras: o Conselho dos S00 e o Conselho dos Anciãos.


      A configuração política da Assembléia mudou: no centro, os girondinos, que tinham deposto Robespierre; à direita, os realistas, que pregavam a volta dos Bourbon ao poder; à esquerda, jacobinos e socialistas utópicos, que reclamavam medidas de caráter social.

 
      Os diretores equilibravam-se em meio a golpes, da esquerda e da direita. Em 1795, os realistas tentaram dar um golpe, abafado por um jovem oficial, Napoleão Bonaparte, presente em Paris por acaso. Como recompensa, ele recebeu dos diretores o comando do exército na Itália.


      Em 1796, estourou a conspiração jacobina do Clube de Atenas. No ano seguinte, foi a vez dos realistas, derrotados novamente, pelo general Augereau, enviado por Napoleão, que acabava de assinar uma paz vantajosa com a Áustria. Em 1798, os jacobinos venceram as eleições. A burguesia queria paz. Queria um governo forte que conduzisse a França à normalidade. Alguns diretores, como Sieyès e Ducos, prepararam o golpe que levaria Napoleão ao poder, em 9 de novembro de 1799 ou 18 Brumário. Napoleão evitaria as tentativas jacobinas de tomar o poder, consolidando o poder da burguesia no contexto da Revolução. Uma revolução cujos ideais não tardariam a repercutir em longínquas terras, inclusive no Brasil.

O PODER ABSOLUTO NA MÃO DA MONARQUIA








Absolutismo Monárquico


Luís XIV - o rei sol

Sistema de governo no qual o poder é concentrado nas mãos do monarca, característico dos regimes da maioria dos Estados europeus entre os séculos XVII e XVIII. Os reis controlam a administração do Estado, formam exércitos permanentes, dominam a padronização monetária e fiscal, procuram estabelecer as fronteiras de seus países e intervêm na economia nacional por meio de políticas mercantilistas e coloniais. Também criam uma organização judiciária nacional, a justiça real, que se sobrepõe ao fragmentado sistema feudal.


A centralização do poder desenvolve-se a partir da crise do feudalismo. Com o crescimento comercial, a burguesia tem interesse em disputar o domínio político com os nobres e apóia a concentração do poder. A Reforma Protestante do século XVI também colabora para o fortalecimento da autoridade monárquica, pois enfraquece o poder papal e coloca as igrejas nacionais sob o controle do soberano. Com a evolução das leis, com base no estudo do direito romano, surgem teorias que justificam o absolutismo, como as de Nicolau Maquiavel (1469-1527), Jean Bodin (1530-1595), Jacques Bossuet (1627-1704) e Thomas Hobbes (1588-1679).


O Estado absolutista típico é a França de Luís XIV (1638-1715). Conhecido como o Rei Sol, a ele é atribuída a frase que se torna o emblema do poder absoluto: "O Estado sou eu". Luís XIV atrai a nobreza para o Palácio de Versalhes, perto de Paris, onde vive em clima de luxo inédito na história do Ocidente. Na Inglaterra, no início do século XVI, Henrique VIII, segundo rei da dinastia Tudor, consegue impor sua autoridade aos nobres com o apoio da burguesia e assume também o poder religioso. O processo de centralização completa-se no reinado de sua filha Elizabeth I. No século XVIII surge o despotismo esclarecido, uma nova maneira de justificar o fortalecimento do poder real, apoiada pelos filósofos iluministas.


O processo de extinção do absolutismo na Europa começa na Inglaterra com a Revolução Gloriosa (1688), que limita a autoridade real com a Declaração de Direitos (Constituição), assinalando a ascensão da burguesia ao controle do Estado. Na França, o absolutismo termina com a Revolução Francesa (1789). Nos outros países europeus, ele vai sendo derrotado com as Revoluções Liberais do século XIX.

A CIDADANIA BURGUESA






CIDADANIA





O sentido moderno de cidadão nasce nos primeiros dias de outubro de 1774, na França, em discurso de Beaumarchais [1] (1732 –1799). A acepção atual de cidadania é, portanto, posterior ao século XVIII.



DEFINIÇÃO:

    Em sentido etimológico, cidadania define a condição daqueles que residem na cidade. Ao mesmo tempo, o termo se refere à condição de um indivíduo como membro de um Estado, como portado de direitos e obrigações. A associação entre esses dois significados deve-se a uma transformação histórica de grande alcance, fundamental ao mundo moderno: a formação dos Estados centralizados, impondo jurisdição uniforme sobre um território não limitado aos antigos burgos ou cidades medievais.

    O termo cidadão tornou-se sinônimo de homem livre, portador de direitos e obrigações a título individual, assegurados em lei. A associação não é espúria, pois evidentemente é nas cidades que originalmente se formam as forças sociais mais diretamente interessadas na individualização e na codificação uniforme desses direitos: a burguesia e a moderna economia capitalista.



    Em seus primórdios, a constituição do Estado moderno e da economia comercial capitalista representam uma grande força libertária, em primeiro lugar, pela dilatação dos horizontes, pela emancipação dos indivíduos ante o localismo, ante as convenções medievais que impediam ou dificultavam a escolha de uma ocupação diferente daquela transmitida como herança familiar; libertária, enfim, ante as tradições e crenças que se diluíam com a maior mobilidade geográfica e social. Mas libertária, sobretudo, pela imposição de uma jurisdição uniforme, quebrando o arbítrio dos senhores feudais e reconhecendo aos habitantes do território, independentemente de sua ocupação ou condição sócio-econômica, os mesmos direitos e obrigações.



    A cidadania tem um aspecto sociológico e um aspecto político. Nesse último sentido ela expressa aquela igualdade perante a lei – a égalité da Revolução Francesa – conquistada pelas grandes revoluções (inglesa, francesa e norte-americana), e posteriormente reconhecida em todo o mundo.



UM DIREITO DE BURGUÊS.

    É indiscutível que a cidadania é, na origem, um direito burguês, no sentido de que as novas relações sociais e políticas a que ela se refere interessavam de maneira mais real e direta à nova classe comercial e industrial das cidades. Ao mesmo tempo, sua reivindicação – por exemplo, na filosofia de Locke – como soma de direitos fundamentais do indivíduo, qualquer que fosse sua posição social ou ocupação (direitos anteriores à própria sociedade na ficção do ‘contrato social’), tornava-os logicamente independentes da estrutura social, isto é, neutros quanto aos seus beneficiários presentes e potenciais. É essa qualidade da teoria dos direitos naturais – o gato de se colocar como um padrão ou critério externo à sociedade existente, e a partir do qual ela deve ser julgada – que lhe confere caráter especificamente revolucionário.




(Retirado da Enciclopéia Mirador – 1993)




[1] Pierre-Augustin Caron de Beaumarchais (Paris, 24 de janeiro de 1732 – Paris, 18 de maio de 1799) foi um autor de teatro francês. Começou por exercer o ofício de relojoeiro, foi mestre de música das filhas de Luís XV, sendo seu secretário, diplomata de bastidores e agente secreto. Na infância, estudou violão, flauta e harpa.
Beaumarchais é o criador do personagem Fígaro, presente na trilogia constituída pelas comédias O Barbeiro de Sevilha ou A Precaução Inútil (no original em francês, Le barbier de Séville, 1775), As Bodas de Fígaro (no original, em francês, La Folle journée, ou le Mariage de Figaro, 1784), e pelo drama A mãe culpada (no original francês, L'Autre Tartuffe, ou la Mère coupable, 1789-1790). Todas as três peças foram transformadas em óperas - por Paisiello, Rossini (Il barbiere di Siviglia), Mozart (Le nozze di Figaro) e Milhaud (La Mère coupable).

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