sábado, 2 de março de 2013

CAPITULO XIII DA HISTÓRIA DA RIQUEZA DO HOMEM DE LÉO HUBERMAN, SOBRE A REVOLUÇÃO BURGUESA NA FRANÇA



(assunto: revolução francesa, revoluções burguesas)





CAPÍTULO XIII


"A Velha Ordem Mudou”...


QUE pensaria o leitor de um governo que taxasse os pobres, mas não os ricos? Totalmente louco, seria seu primeiro pensamento; refletindo, poderia ocorrer-lhe que, de certa forma, é o que o governo dos Estados Unidos está fazendo hoje. Haverá naturalmente muita gente para discordar disso - gente que procuraria provar que os ricos nos E. U. A. pagam uma proporção de impostos mais do que justa: Mas quanto ao fato de que o governo francês do século XVIII realmente cobrava impostos dos pobres, e não dos ricos, não pode haver discordância.

E não pode haver porque as próprias classes privilegiadas admitiam estarem isentas praticamente de todas as taxas da época. O clero e a nobreza julgavam que seria o fim do país se, como a gente comum, tivessem de pagar impostos. Quando o governo da França estava em má situação financeira, com as despesas se acumulando rapidamente e deixando muito longe a receita, ocorreu a alguns franceses que a única saída dessa dificuldade era cobrar impostos dos privilegiados. Turgot, Ministro das Finanças em 1776, tentou pôr em prática algumas reformas - muito necessárias - do sistema fiscal. Mas os privilegiados não queriam saber disso. Cerraram fileiras em torno do Parlamento de Paris, que assim definiu, claramente, sua posição: A primeira regra da justiça é preservar a alguém o que lhe pertence: essa regra consiste não apenas da preservação dos direitos de propriedade, mas ainda mais da preservação dos direitos da pessoa, oriundos de prerrogativas de nascimento e posição Dessa regra de lei e eqüidade segue-se que todo sistema que, sob a aparência de humanitário e beneficente, tenda a estabelecer uma igualdade de deveres e destruir as distinções necessárias levará dentro em pouco à desordem (resultado inevitável da igualdade) e provocará a derrubada da sociedade civil. A monarquia francesa, pela sua constituição, é formada de vários Estados distintos. O serviço pessoal do clero é atender às funções relacionadas com a instrução e o culto. Os nobres consagram seu sangue à defesa do Estado e ajudam o soberano com seus conselhos. A classe mais baixa da Nação, que não pode prestar ao rei serviços tão destacados, contribui com seus tributos, sua indústria e seu serviço corporal. Abolir essas distinções é derrubar toda a constituição francesa.

O clero e a nobreza eram as classes privilegiadas. Chamavam-se de Primeiro Estado e Segundo Estado, respectivamente. O clero tinha cerca de 130.000 membros, e a nobreza aproximadamente 140.000. Embora fossem as classes privilegiadas, nem sempre eram ricos ou viviam na ociosidade. Havia bispos muito ricos e nobres muito ricos. Havia sacerdotes que trabalhavam muito e nobres também. Como havia ociosos na Igreja e na nobreza. E, em meio destes, havia também outros grupos.

A classe sem privilégios era o povo, a gente comum, que tinha o nome de Terceiro Estado. Da população de 25 milhões de habitantes da França, representavam mais de 95%. E, tal como havia diferença de riqueza e modo de vida entre as classes privilegiadas, também havia diferença entre os sem privilégios. Cerca de 250.000 destes, constituindo a classe média superior, ou burguesa, estavam relativamente bem, em comparação com o restante dos membros do Terceiro Estado. Outro grupo consistia de artesãos vivendo em pequenas aldeias e cidades. Seu número se elevava a 2 milhões e meio. Todo o resto, cerca de 22 milhões, eram camponeses que trabalhavam na terra. Pagavam impostos aos Estados, dízimos ao clero e taxas feudais à nobreza.

Eu e o leitor organizamos nossa vida de modo que nossos gastos são determinados pela nossa renda. Os governos, de modo geral, procuram fazer o mesmo. Mas o governo da França no século XVIII agia de modo oposto. Gastava o dinheiro totalmente, extravagantemente, sem sistema, e corruptamente. Um exemplo mostrará isso. O Livre Rouge era um ,Livro Vermelho contendo a lista de todas as pessoas á quem o governo dava pensões. Entre elas estava o nome de Ducrest, um barbeiro. Por que tinha ele direito a uma pensão de 1.700 libras anuais? Porque havia sido o cabeleireiro da filha do Conde d'Artois. O fato de que essa filha tivesse morrido cedo, antes de ter cabelos para pentear, não tinha importância. Ducrest recebia sua pensão."

Esse é um exemplo da forma insensata pela qual as finanças francesas eram administradas. Há milhares de outros. Ao invés de regular a despesa pela receita, a receita era determinada pela despesa. Gastos ociosos, sem finalidades, significavam a necessidade de recolher maior quantidade de dinheiro com impostos. E como as classes privilegiadas não contribuíam com sua parte (pelo contrário, impunham aos plebeus taxas próprias), e como os membros mais ricos do Terceiro Estado conseguiam, por tortuosos caminhos, isentar-se dos impostos diretos, todo o peso recaía sobre os pobres. Era um peso difícil. Um quadro verdadeiro do período mostraria o camponês curvado carregando em suas costas o rei, o padre e o nobre.

Um francês famoso, De Tocqueville, mostrou o que representava esse peso dos impostos na vida diária do camponês: "Imagine o leitor um camponês francês do século XVIII... apaixonadamente enamorado da terra, ao ponto de gastar todas as suas economias para adquiri-la ... Para completar essa compra, ele tem primeiro de pagar um imposto... Finalmente, a terra é dele; seu coração nela está enterrado, com as sementes que semeia, mas novamente seus vizinhos o chamam do arado, obrigam-no a trabalhar para eles sem pagamento. Tenta defender sua nascente plantação contra as manobras dos senhores de terra; estes novamente o impedem. Quando ele cruza o rio, esperam-no para cobrar uma taxa. Encontra-os no mercado, onde lhe vendem o direito de vender seus produtos; e quando, de volta a casa, ele deseja usar o restante do trigo para sua própria alimentação não pode tocá-lo enquanto não o tiver moído no moinho e cozido no forno dos mesmos senhores de terras. Uma parte da renda de sua pequena propriedade é gasta em pagar taxas a esses senhores Tudo o que fizer, encontra sempre esses vizinhos em seu caminho.., e quando estes desaparecem, surgem outros com as negras vestes da Igreja, para levar o lucro líquido das colheitas... A destruição de parte das instituições da Idade Média tornou cem vezes mais odiosa a parte que ainda sobrevivia." 189 Isso parece a descrição do sistema feudal do século XI. Não houve, então, modificações nos sete séculos que se seguiram? Sim, houve. Dos 22 milhões de camponeses existentes na França na época de 1700, apenas 1 milhão era de servos, no sentido antigo. Os outros se haviam elevado na escala, desde a servidão até a liberdade completa. Mas isso não significava que as velhas taxas e serviços feudais tivessem desaparecido. Algumas foram-se, mas outras continuavam. Continuavam apesar de ter sido abolida há muito a causa de sua origem. Os nobres que recebiam taxas e serviços feudais pelo fato de darem proteção militar já não constituíam o exército real - sua função militar acabara. Não ajudavam o governo como um grupo - apenas individualmente - nem tinham qualquer função política ou administrativa. Não trabalhavam a terra, não se dedicavam aos negócios - não tinham função econômica. Recebiam sem dar. Na maioria dos casos, tornavam-se ociosos, parasitas, passando o tempo na corte, muito longe de suas propriedades. Não obstante, ainda exigiam e ainda recebiam pagamentos e serviços dos camponeses. Eram um peso morto que os camponeses carregavam. E como De Tocqueville mostra, na última frase da citação acima, o simples fato de que algumas das taxas existentes haviam desaparecido apenas tornava as remanescentes mais odiadas.

Qual, exatamente, a proporção de sua renda que o camponês pagava em impostos? A resposta surpreenderá. Calculou-se que nada menos de 80% dos seus ganhos eram pagos aos vários coletores de impostos! Dos 20% que restavam, ele tinha que alimentar, abrigar e vestir sua família. Não é de espantar que o camponês reclamasse. Não é de espantar que uma colheita má o deixasse à beira da fome. Nem que muitos de seus vizinhos vagassem pelas estradas como mendigos, famintos.

A Revolução Francesa estourou em 1789. Mas não se conclua com isso que os camponeses estivessem, no século XVIII, em pior situação do que no século XVII. Não estavam. Talvez estivessem até melhor. Na verdade, de uma forma ou de outra, os camponeses haviam poupado bastante de sua insignificante renda, depois de pagas as muitas taxas, para comprar a terra. Por cem anos ou mais antes da Revolução, os camponeses compraram propriedades, de forma que, quando o ano de 1789 chegou, cerca de um terço das terras da França estava em suas mãos. Isso, porém, apenas os deixou mais descontentes do que antes. Por quê?

Eram famintos de terra. Puderam satisfazer um pouco dessa fome. Que impedia seu avanço? O peso esmagador que lhes impunham o Estado e as classes privilegiadas. Passaram a ver, com maior clareza, que, se atirassem fora o fardo, poderiam ficar eretos - elevar-se da situação de animal para a de homem. O simples fato de ter sua posição melhorada um pouco abriu-lhes os olhos para o que poderiam ser, se... Isso não queria dizer que os camponeses da França (e de outros países da Europa ocidental) não tivessem pensado em acabar com os pagamentos e restrições feudais. Pensaram. Houve revoltas camponesas, antes. Embora não tivessem conseguido derrubar todas as regulamentações feudais, melhoraram a sorte dos camponeses. Mas para se libertarem totalmente, estes precisavam de auxílio e liderança.

Encontraram-nos na nascente classe média.

Foi essa classe média, a burguesia, que provocou a Revolução Francesa, e que mais lucrou com ela. A burguesia provocou a Revolução porque tinha de fazê-lo. Se não derrubasse seus opressores, teria sido por eles esmagada. Estava na mesma situação do pinto dentro do ovo que chega a um tamanho em que tem de romper a casca ou morrer. Para a crescente burguesia os regulamentos, restrições e contenções do comércio e indústria, a concessão de monopólios e privilégios a um pequeno grupo, os obstáculos ao progresso criados pelas obsoletas e retrógradas corporações, a distribuição desigual dos impostos, continuamente aumentados, a existência de leis antigas e a aprovação de novas sem que fosse ouvida, o grande enxame de funcionários governamentais bisbilhoteiros e o crescente volume da dívida governamental - toda essa sociedade feudal decadente e corrupta - era a casca que devia ser rompida. Não desejando ser asfixiada até morrer penosamente, a classe média burguesa que surgia tratou de fazer que a casca fosse rompida.

Quem era a burguesia? Eram os escritores, os doutores, os professores, os advogados, os juizes, os funcionários - as classes educadas; eram os mercadores, os fabricantes, os banqueiros - as classes abastadas, que já tinham direito e queriam mais. Acima de tudo, queriam - ou melhor, precisavam - lançar fora o jugo da lei feudal numa sociedade que realmente já não era feudal. Precisavam deitar fora o apertado gibão feudal e substituí-lo pelo folgado paletó capitalista. Encontraram a expressão de suas necessidades no campo econômico, nos escritos dos fisiocratas de Adam Smith; e a expressão de suas necessidades, no campo social, nos trabalhos de Voltaire, Diderot e dos enciclopedistas. Laissez-faire no comércio e indústria teve sua contrapartida no "domínio da razão" na religião e na ciência.

Nada mais enlouquecedor do que ver alguém que não dispõe de nossa capacidade de trabalho colher os frutos desse trabalho simplesmente porque teve um "impulso" qualquer. A burguesia estava mais ou menos nessa posição. Tinha o talento. Tinha a cultura. Tinha o dinheiro. Mas não tinha na sociedade a situação legal que tudo isso lhe devia conferir. "Bar-nave tornou-se revolucionário no dia em que sua mãe teve de deixar o camarote que ocupava no teatro em Grenoble para dar lugar a um nobre. Roland queixa-se de que ao ser convidada para jantar no Castelo de Fontenay com sua mãe, serviram-lhe a comida na mesa dos empregados. Quantos, se tornaram inimigos do velho regime por terem seu orgulho ferido"

A burguesia quase não possuía terras, mas tinha o capital. Emprestara dinheiro ao Estado. Queria-o, agora, de volta. Conhecia o bastante das questões do governo para ver que a estúpida e perdulária administração do dinheiro público poderia levar à bancarrota. Alarmava-se com a perspectiva de perder suas economias.

A burguesia desejava que seu poder político correspondesse ao poder econômico que já tinha. Era dona de propriedades - queria agora os privilégios. Queria ter certeza de que sua propriedade estaria livre das restrições aborrecidas a que estivera sujeita na decadente sociedade feudal. Queria ter certeza de que os empréstimos feitos ao governo seriam pagos. Para isso, tinha de conquistar não somente uma voz, mas a voz no governo. Sua oportunidade chegou - e ela soube aproveitá-la.

A oportunidade chegou porque a França estava em tamanho caos que já não era possível as coisas continuarem como antes. Com isso concordava até um membro da nobreza, o Conde de Calonne. Sua posição no importante posto de Ministro das Finanças permitia-lhe ver claramente a situação. "A França, é um reino composto de Estados e países separados com administrações mistas, cujas províncias nada sabem umas das outras, onde certos distritos estão completamente livres de fardos cujo peso total recai sobre outros, onde a classe mais rica é a que menos imposto paga, onde o privilégio perturbou todo o equilíbrio, onde é impossível ter um governo constante ou uma vontade unânime: necessariamente, é um reino muito imperfeito, cheio de abusos, e, na sua condição presente, impossível de governar." Observem-se particularmente as três últimas palavras. Um membro da classe dominante admite ser impossível continuar governando; acrescente-se a isso as massas descontentes, e ainda uma classe inteligente e em ascensão, ansiosa de tomar o poder, e teremos dessa mistura uma revolução, que rebentou em 1789. Seu nome: Revolução Francesa.

Uma descrição simples dos objetivos dos revolucionários foi feita por um de seus líderes, o Abbé Sieyès, num folheto popular intitulado O que é o Terceiro Estado?: "Devemos formular três perguntas:

Primeira: O que é o Terceiro Estado? Tudo.

Segunda: O que tem ele sido em nosso sistema político? Nada.

Terceira: O que pede ele? Ser alguma coisa.

Embora seja verdade que todos os membros do terceiro Estado, artesãos, camponeses e burguesia, estivessem tentando "ser alguma coisa", foi principalmente o último grupo que conseguiu 'o que queria. A burguesia forneceu a liderança, enquanto Os outros grupos realmente lutaram. E foi a burguesia quem mais lucrou. Durante o curso da revolução, teve várias oportunidades para enriquecer e fortalecer-se. Especulou nas terras tomadas da Igreja e da nobreza, e amontoou fortunas imensas através de contratos fraudulentos com o exército.

Marat, o porta-voz da classe trabalhadora mais pobre, descreveu o que ocorria durante a Revolução, com as seguintes palavras: "No momento da insurreição o povo abriu caminho por sobre todos os obstáculos pela força do número; mas, por muito poder que tenha conseguido inicialmente, foi por fim derrotado pelos conspiradores da classe superior, cheios de astúcia, artimanhas e habilidade. Os integrantes educados e sutis da classe superior a princípio se opuseram aos déspotas; mas isso apenas para voltar-se contra o povo, depois de se ter insinuado na confiança e usado seu poder, para se colocarem na posição privilegiada da qual os déspotas haviam sido expulsos. A revolução é feita e realizada por intermédio das camadas mais baixas da sociedade, pelos trabalhadores, artesãos, pequenos comerciantes, camponeses, pela plebe, pelos infelizes, a que os ricos desavergonhados chamam de canalha e a que os romanos desavergonhadamente chamavam de proletariado. Mas o que as classes superiores ocultam constantemente é o fato de que a Revolução acabou beneficiando somente os donos de terras, os advogados e os chicaneiros." É uma descrição exata do que ocorreu. Depois que a Revolução acabou, foi a burguesia quem ficou com o poder político na França. O privilégio de nascimento foi realmente derrubado, mas o privilégio do dinheiro tomou seu lugar. "Liberdade, igualdade, Fraternidade" foi uma frase popular gritada por todos os revolucionários, mas que coube principalmente à burguesia desfrutar.

O exame do Código Napoleônico deixa isso bem claro. Destinava-se evidentemente a proteger a propriedade - não a feudal, mas a burguesa. O Código tem cerca de 2.000 artigos, dos quais apenas 7 tratam do trabalho e cerca de 800 da propriedade privada. Os sindicatos e, as greves são proibidas, mas as associações de empregadores permitidas. Numa disputa judicial sobre salários, o Código determina que o depoimento do patrão, e não do empregado, é que deve ser levado em conta O Código foi feito pela burguesia e para a burguesia: foi feito pelos donos da propriedade para a proteção da propriedade.

Quando o fumo da batalha se dissipou, viu-se que a burguesia conquistara o direito de comprar e vender o que lhe agradasse, como, quando, e onde quisesse. O feudalismo estava morto.

E morto não só na França, mas em todos os países conquistados pelo exército de Napoleão. Este levou consigo o mercado livre (e os princípios do Código Napoleônico) em suas marchas vitoriosas. Não é de surpreender que fosse bem recebido pela burguesia das nações conquistadas! Nesses países, a servidão foi abolida, as obrigações e pagamentos feudais foram eliminados, e o direito dos camponeses proprietários, dos comerciantes e industriais, de comprar e vender sem restrições, regulamentos ou contenções, se estabeleceu definitivamente.

Um excelente sumário dessa fase da Revolução Francesa foi escrito por Karl Marx em 1852, no Dezoito de Brumário de Luis Bonaparte: "Desmoulins, Danton, Robespierre, Saint-Just, Napoleão, os heróis e os partidos e massas da grande Revolução Francesa terminaram a tarefa da época - que foi a libertação da burguesia e o estabelecimento da moderna sociedade burguesa. Os jacobinos revolveram o terreno no qual o feudalismo tinha raízes, e abalaram a estabilidade dos magnatas feudais que nelas se apoiavam. Napoleão estabeleceu por toda a França as condições que tornaram possível o desenvolvimento da livre concorrência, a exploração das terras depois da divisão das grandes propriedades, e a plena utilização da capacidade de produção industrial do país. Através das fronteiras, por toda parte, fez uma derrubada das instituições feudais.. ."

As revoluções são geralmente sangrentas. Muita gente se choca com a violência e o terror do modelo francês. É interessante que os mais fortes adversários da Revolução Francesa fossem os ingleses. O fato é especialmente notável porque a luta da burguesia inglesa para conquistar o poder político correspondente ao seu poder econômico ocorrera um século antes da Revolução Francesa, e a violência que a acompanhara já fora esquecida. Houve, porém, uma diferença. Enquanto na França o Comércio teve de dar no Nascimento um violento golpe, do qual este jamais se recobrou, na Inglaterra a vitória foi conquistada por uma decisão, e não com luta. Parece que na Inglaterra, Comércio e Nascimento se conheciam bem e se entendiam melhor do que nos outros países. A burguesia inglesa pode tornar-se uma aristocracia rural, e a aristocracia rural dedicou-se aos Negócios sem se preocupar muito com o preconceito de "estar acima dessas coisas. Não obstante, os anos de 1640-1688 marcam, na história inglesa, um período de luta - que se cessou quando a burguesia conquistou o direito de participar do governo.

O leitor se lembrará do nome de Edmund Burke, o grande estadista britânico que tão habilidosamente defendeu os colonos americanos na questão da "taxação sem representação". Quando escreveu uma série de artigos condenando amargamente os revolucionários franceses, outro inglês lembrou-lhe a "Gloriosa Revolução" da própria Inglaterra, cem anos antes: "Em nome da humanidade, em nome do homem, em nome do bom, qual a ofensa irremediável, o crime imperdoável, que o povo da França cometeu contra este país? Terá sido pela modificação feita em seu governo pela Revolução de 1789? Ele difere de nós nessa questão apenas pelo fato de estar com um século de atraso. Será por sujeitarem o monarca ao controle? A nação britânica deu o exemplo.”

Na Inglaterra, em 1689, e na França, em 1789, a luta pela liberdade do mercado resultou numa vitória da classe média. O ano de 1789 bem pode ser considerado como o fim da Idade Média, pois foi nele que a Revolução Francesa deu o golpe mortal no feudalismo. Dentro da estrutura da sociedade feudal de sacerdotes, guerreiros e trabalhadores, surgira um grupo da classe média. Através dos anos, ela foi ganhando força. Havia empreendido uma luta longa e dura contra o feudalismo, marcada particularmente por três batalhas decisivas. A primeira foi a Reforma Protestante; a segunda foi a Gloriosa Revolução na Inglaterra, e a terceira, a Revolução Francesa. No fim do século XVIII era pelo menos bastante forte para destruir a velha ordem feudal. Em lugar do feudalismo, um sistema social diferente, baseado na livre troca de mercadorias com o objetivo primordial de obter lucro, foi introduzido pela burguesia.

A esse sistema chamamos - capitalismo.

2 comentários:

  1. Professor, alí dizia "toda essa sociedade feudal decadente e corrupta" mas essa sociedade nao era absolutista?

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  2. O absolutismo monarquico é um período de transição quando os reis se aliam a burguesia (quem tinha dinheiro) para promover o comércio e também centralizar o poder, tirando-o da mão dos diversos senhores feudais. Ótima observação e ótima pergunta, com ela ganhou seu ponto de participação.

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