quarta-feira, 20 de julho de 2022

STEPAN BANDERA – COLABORACIONISTA NAZISTA QUE SE TORNOU SÍMBOLO DA DIREITA UCRANIANA

 

Se você buscar por imagens de manifestações políticas na Ucrânia desde 2010 irá encontrar flâmulas e quadros de Stepan Bandera. Esse homem hoje é pintado como herói pela direita ucraniana e seu pensamento possui profunda influência na política do país e nos grupos paramilitares neonazistas como o Batalhão Azov. Para entender a figura de Stepan Bandera, conversamos com Rodrigo Ianhez, especialista no período soviético formado pela Universidade Estatal de Moscou.

Stepan Bandera nasceu em 1909 na região da Galícia[1], hoje um território pertencente à Ucrânia, mas que passou por períodos de dominação do Império Austro-Húngaro e da Polônia. No fim dos anos 20, ele ingressa na Organização dos Nacionalistas Ucranianos (OUN), uma organização ativista pela formação de um estado  independente.

A OUN e Bandera organizaram diversas ações contra os poloneses na região da Galícia, que à época estava sob controle da Polônia”, explica Rodrigo Ianhez. A região onde hoje fica Lviv – principal cidade do oeste ucraniano – fazia parte do território polonês.

Após o exército nazista invadir a Polônia e expandir suas operações militares a leste, quebrando o tratado Molotov-Ribbentrop, Bandera viu a oportunidade de conseguir apoio dos nazistas para conquistar a independência da Ucrânia.

Depois do avanço dos nazistas a leste, Bandera se tornou um colaboracionista do nazismo. Ele foi recrutado pela inteligência alemã para auxiliar na tomada da Galícia. Durante as primeiras semanas da ocupação, cerca de 7 mil judeus foram mortos apenas na cidade de Lvov. Bandera também foi o responsável pela criação de dois batalhões da SS”, afirma Rodrigo Ianhez.

Após apoiar os nazis e colaborar com a implantação do sistema de genocídio no território ucraniano, Bandera cresceu suas aspirações para tentar transformar seu país em uma república independente. “De orientação fascista, é claro”, pontua Rodrigo Ianhez. Mas a empreitada não deu muito certo. “Ele foi preso pelos nazistas e foi levado para campos de concentração. Seu tratamento não foi o mesmo dado para os outros presos”, afirmou.

Enquanto Bandera estava detido, os batalhões da SS e o exército insurgente ucraniano – ambos apoiados por Bandera e pelos nazistas – avançavam com as tropas e, em 1941, tomavam Kiev. Foram as forças inspiradas pela OUN e pelos nazistas que causaram o massacre de Babi Yar, onde 33 mil judeus foram assassinados em dois dias.

Após anos preso, Bandera retorna ao front. “Quando os soviéticos avançavam em direção a Oeste e começaram a libertar a Ucrânia, ele foi chamado novamente para colaborar com os nazistas e aceitou”, conta o historiador.

As tropas do Exército Vermelho ganham dos nazistas e Bandera se torna um foragido. De acordo com Rodrigo Ianhez, o nacionalista se esconde com apoio de seguranças da SS e existem até suspeitas de que ele teria recebido auxílio do serviço secreto britânico. “Esse período de sua vida é obscuro”, explica. Em 1959, Stepan é assassinado pela KGB.

Vale ressaltar que Bandera foi um dos agentes do Holocausto e seu pensamento era supremacista, contra os judeus, contra os moscovitas – como ele se referia aos russos -, contra os poloneses e até contra os húngaros”, pontua Rodrigo Ianhez.


A influência de Bandera na Ucrânia de hoje

O então presidente Volodymyr Zelensky anunciou a proibição de 11 partidos ucranianos por serem “pró-Rússia”. Entre eles, estavam diversas organizações de esquerda. Já partidos políticos com orientação pró-neonazista, como o Praviy Sektor – de extrema inspiração banderista – se mantiveram intactos dentro do estamento político ucraniano. Mas esse processo não começou agora.

Foi em 2010, no governo Yushchenko que esse processo começou. Ele decretou que Stepan Bandera ganhasse o título de Herói Nacional. A medida causou grande polarização na sociedade ucraniana, que não concordava com um colaboracionista do nazismo sendo alçado a esse posto”, segundo Rodrigo Ianhez.

Houve um processo de revisionismo e falsificação histórica. Hoje, os nacionalistas afirmam que a associação de Bandera ao nazismo foi ‘invenção soviética’ e que ele não colaborou com o nazismo, o que é mentira”, explica.

Desde então, a figura de Bandera começou a ser utilizada por nacionalistas ucranianos amplamente. No Euromaidan, sua imagem começou a ser mais replicada. “Os aniversários de Bandera começaram a se transformar em atos públicos. Uma estátua foi construída para ele Lviv, mas foi destruída pouco tempo depois”, afirma o historiador. E o apoio à figura também varia geograficamente.

Hoje, no Oeste da Ucrânia, ele se tornou uma figura realmente importante. Quadros com seu rosto estão em gabinetes de políticos, em prédios públicos. No Donbass e na Crimeia isso não ocorre”. Rodrigo Ianhez reforça que é importante mostrar que a influência de Bandera e do nazismo no nacionalismo ucraniano é crucial: “Não podemos não falar sobre o elefante na sala. Falar sobre isso não é ser pró-Kremlin”.

O historiador reforça o papel de Volodymyr Zelensky – que é judeu – nesse processo. “Zelensky é conhecido por fazer concessões à extrema-direita, mas tenta se afastar da figura de Bandera”. A comunidade judaica ucraniana denuncia a tempos e combate o revisionismo histórico sobre o colaboracionista e sobre a participação dos nacionalistas no Holocausto.

E com a invasão russa, a tendência é que a figura desse nazista ganhe ainda mais força nas mãos da direita ucraniana. “É certo que a guerra irá aumentar esse sentimento nacionalista e isso é preocupante”, conclui o historiador.

(Entrevista feita em 23 de março de 2022 por Yuri Ferreira)

Fonte: Hypeness. Disponível em: https://www.hypeness.com.br/2022/03/stepan-bandera-quem-foi-o-colaboracionista-nazista-que-se-tornou-simbolo-da-direita-ucraniana/. Acesso em 20 de jul. 2022.

 



[1] Galícia (Reino da Galícia e Lodoméria). Região histórica na Europa Oriental que nos dias atuais é dividida entre a Polônia e a Ucrânia. O núcleo da Galícia histórica consiste nas regiões modernas de Lviv, Ternopil e Ivano-Frankivsk na Ucrânia Ocidental. Não confundir com a Galícia espanhola que é uma comunidade autônoma no Noroeste da Espanha.


 

 

 

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