A EVOLUÇÃO DO METABOLISMO
As características fundamentais de um ser vivo é possuir
compostos orgânicos na constituição da sua estrutura (ou são formados por uma
célula – unicelulares, ou várias células – pluricelulares) e ter a capacidade
de reprodução.
Todo ser vivo precisa de alimentos, que são
degradados nos processos metabólicos para a liberação de energia e realização
de funções. Esses alimentos degradados também podem ser utilizados como
matéria-prima na síntese de outras substâncias orgânicas, possibilitando o
crescimento e a reposição de perdas.
Existem
duas hipóteses para explicar como os primeiros seres conseguiram obter e
degradar o alimento para sua sobrevivência: a hipótese heterotrófica e a hipótese
autotrófica.
HIPÓTESE HETEROTRÓFICA
Segundo essa hipótese, os primeiros organismos eram
estruturalmente muito simples, sendo de se supor que as reações químicas em
suas células também eram simples. Eles viviam em um ambiente aquático, rico em substâncias
nutritivas, mas provavelmente não havia oxigênio na atmosfera, nem dissolvido
na água dos mares. Nessas condições, é possível supor que, tendo alimento
abundante ao seu redor, esses primeiros seres teriam utilizado esse alimento já
pronto como fonte de energia e matéria-prima. Eles seriam Heterótrofos (hetero
= diferente, trofos = alimento): organismos que não são capazes de sintetizar
seus próprios alimentos a partir de compostos inorgânicos, obtendo-os prontos
do meio ambiente.
Os seres capazes de sintetizar seus próprios alimentos a
partir de substância inorgânicas simples são chamados autótrofos (auto =
próprio, trofos = alimento), como é o caso das plantas.
Uma vez dentro da célula, esse alimentos precisa ser
degradado. Nas condições da Terra atual, a via metabólica mais simples para se
degradar o alimento sem oxigênio é a fermentação, um processo anaeróbio (an =
sem, aero = ar, bio = vida). Um dos tipos mais comuns de fermentação é a
alcoólica. O açúcar glicose é degradado em álcool etílico (etanol) e gás
carbônico, liberando energia para as várias etapas do metabolismo celular.
Esses organismos começaram a aumentar em número por
reprodução. Paralelamente a isso, as condições climáticas da Terra também
estavam mudando a ponto de não mais ocorrer síntese pré-biótica da matéria
orgânica. Desse modo, o alimento dissolvido no meio teria começado a ficar
escasso.
Com o alimento reduzido e um grande número de indivíduos
nos mares, deve ter havido muita competição, e muitos organismos teriam morrido
por falta de alimento. Acredita-se que nesse novo cenário teria ocorrido o
surgimento de alguns seres capazes de captar a luz solar com o auxílio de
pigmentos como a clorofila. A energia da luz teria sido utilizada para a
síntese de seus próprios alimentos orgânicos, a partir de água e gás carbônico.
Teriam surgido assim os primeiros seres autótrofos: os seres fotossintetizantes
(foto = luz, síntese = em presença de luz), que não competiam com os
heterótrofos e proliferaram muito.
Esses primeiros seres fotossintetizantes foram
fundamentais na modificação da composição da atmosfera: eles introduziram o
oxigênio no ar, e a atmosfera teria passado de redutora a oxidante. Até os dias
de hoje, são principalmente os seres fotossintetizantes que mantêm os níveis de
oxigênio na atmosfera, o que é fundamental para a vida no nosso planeta.
Havendo disponibilidade de oxigênio, foi possível a
sobrevivência de seres que desenvolveram reações metabólicas complexas, capazes
de utilizar esse gás na degradação do alimento. Surgiram, então, os primeiros
seres aeróbios, que realizavam a respiração. Por meio da respiração, o
alimento, especialmente o açúcar glicose, é degradado em gás carbônico e água,
liberando muito mais energia para a realização das funções vitais do que na
fermentação.
A fermentação, a fotossíntese e a respiração permaneceram
ao longo do tempo e ocorrem nos organismos que vivem atualmente na Terra.
HIPÓTESE HETEROTRÓFICA
FERMENTAÇÃO à FOTOSSÍNTESE à RESPIRAÇÃO
HIPÓTESE AUTOTRÓFICA
Alguns cientistas têm argumentado que os seres vivos não
devem ter surgido em mares rasos e quentes, como proposto por Oparin e Haldane,
pois a superfície terrestre, na época em que a vida surgiu, era um ambiente
muito instável. Meteoritos e cometas atingiam essa superfície com muita
frequência, e a vida primitiva não poderia se manter em tais condições.
Logo no início da formação da Terra, meteoritos colidiam
fortemente com a superfície terrestre, e a energia dessas colisões era gasta no
derretimentos ou até mesmo na vaporização da superfície rochosa. Os meteoritos
fragmentavam-se e derretiam, contribuindo com sua substância para a Terra em
crescimento. Um impacto especialmente violento pode ter gerado a Lua, que
guarda até hoje em sua superfície o registro desse período, que na superfície
da Terra foi apagado, ao longo do tempo pela erosão.
A maioria dos meteoritos se queima até desaparecer quando
entra na atmosfera terrestre atual e brilha no céu como estrelas cadentes. Nos
primórdios da Terra, os meteoritos eram maiores, mais numerosos e mais
frequentes.
Alguns
cientistas especulam que os primeiros seres vivos não poderiam ter sobrevivido
a esse bombardeio cósmico, e propõem que a vida tenha surgido em locais mais
protegidos, como o assoalho dos mares primitivos.
Em
1977, foram descobertas nas profundezas oceânicas as chamadas fontes termais
submarinas, locais de onde emanam gases quentes e sulfurosos que saem de
aberturas no assoalho marinho. Nesses locais a vida é abundante. Muitas
bactérias que aí vivem são autótrofas, mas realizam um processo muito distinto
da fotossíntese. Onde essas bactérias vivem não há luz, e elas são a base de
uma cadeia alimenta peculiar. Elas servem de alimento para os animais ou então
são mantidas dentro dos tecidos deles. Nesse caso, tanto os animais como as
bactérias se beneficiam: elas têm proteção dentro do corpo dos animais, e estes
recebem alimentos produzidos pelas bactérias.
A
descoberta das fontes termais levantou a possibilidade de que a vida teria
surgido nesse tipo de ambiente protegido e de que a energia para o metabolismo
dos primeiros seres vivos teria ocorrido por um mecanismo autotrófico
denominado quimiossíntese. Alguns cientistas acreditam que os primeiros seres
vivos foram bactérias, que obtinham energia para o metabolismo a partir da
reação entre substâncias inorgânicas, como fazem as bactérias encontradas
atualmente nas fontes termais submarinas e em outros ambientes muito quentes
(com cerca de 60 a 105̕
) e sulfurosos. Segundo
essa hipótese que toda a vida que conhecemos descende desse tipo de bactéria
que devia ser autotrófica.
Os
que argumentam a favor dessa hipótese baseiam-se em evidências que sugerem
abundância de sulfeto de hidrogênio (gás sulfídrico, H2S que tem cheiro de ovo
podre) e compostos de ferro na Terra primitiva. As primeiras bactérias devem
ter obtido energia de reações que tenham envolvido esses compostos para a
síntese de seus compostos orgânicos.
Algumas
bactérias que vivem atualmente em fontes quentes e sulfurosas podem realizar a
reação química a seguir, que pode ter sido a reação fundamental fornecedora de
energia para os primeiros seres vivos:
FeS
|
+
|
H2S
|
à
|
FeS2
|
+
|
H2
|
+
|
Energia
|
Sulfato Ferroso
|
+
|
Gás Sulfídrico
|
à
|
Sulfeto Ferroso
|
+
|
Hidrogênio
|
+
|
Energia
|
A
energia liberada por essa reação pode ser usada pelas bactérias para quebrar o
CO2
do meio e aproveitar o carbono na produção de compostos orgânicos essenciais
para a vida.
Assim,
segundo essa hipótese, a quimiossíntese – um processo autotrófico – teria surgido
primeiro. Depois teriam surgido a fermentação, a fotossíntese e finalmente a
respiração.
Os
debates sobre a origem da vida são apaixonantes e existem opiniões diversas,
porém a hipótese mais aceita nos meios científicos é a do metabolismo pela via
heterotrófica, embora a hipótese autotrófica venha ganhando cada vez mais
adeptos.
Fonte: Sônia Lopes_Bio Volume Único, Editora Saraiva, 2004