sábado, 25 de fevereiro de 2017

O PAÍS MAIS JOVEM DO MUNDO - GUERRA E FOME! FRUTO AINDA DAS CONSEQUÊNCIAS DO IMPERIALISMO?

O imperialismo do século XIX que levou os países da Europa dividirem em 1884/1885 (Conferência de Berlim) a África tem consequências até os dias atuais!


Sudão do Sul: como o país mais novo do mundo mergulhou num caos de guerra e fome.
Independente desde 2011, com uma guerra civil iniciada em 2013, o país de 12,5 milhões de habitantes tem uma das piores situações humanitárias do mundo.

Situação humanitária desastrosa

Segundo a Agência da ONU para os Refugiados (Acnur), mais de 1,5 milhão de pessoas fugiram do país em busca de proteção desde que começou o conflito armado.
O Sudão do Sul se transformou "na maior crise de refugiados da África" e "na terceira do mundo" após as de Síria e Afeganistão, segundo a Acnur, que lembrou que, adicionalmente, 2,1 milhões de pessoas estão deslocadas dentro do país.
O Unicef, por sua vez, calcula que 270 mil crianças sul-sudanesas estão gravemente desnutridas.



Atrocidades


Um informe confidencial da ONU vazado este mês dá conta de que a guerra alcançou "proporções catastróficas para os civis" e que as milícias podem se tornar incontroláveis e alimentar os combates por vários anos.
O secretário-geral da ONU, Antônio Guterres, escreve nesse informe que os civis fogem das cidades e aldeias "em um número recorde" e que o risco de que se cometam atrocidades em massa "é real".
"Nossas visitas ao Sudão do Sul sugerem que está sendo levado a cabo no país um processo de limpeza étnica em várias regiões por meio do uso da fome, dos estupros coletivos e de incêndios", disse, no fim do ano passado, a presidente da Comissão de Direitos Humanos da ONU para o país, Yasmin Sooka.
Atrocidades como o assassinato de crianças, castrações, estupros e degolas são alguns exemplos do que ocorre na região.
Em maio de 2015, a Unicef denunciou o assassinato de 26 de crianças - algumas de apenas 7 anos - e o sequestro de dezenas de outras em ataques realizados por grupos armados, formados homens e meninos armados, vestidos de militares ou civis, no estado de Unidade.
A ONU ainda acusou militares do exército sul-sudanês de estuprar e queimar vivas mulheres e meninas que estavam em suas casas no mesmo estado, segundo depoimentos de vítimas e testemunhas.



Independência recente


O Sudão do Sul conquistou sua independência em relação ao Sudão em julho de 2011, depois que um referendo realizado em janeiro daquele ano aprovou a separação com 98,83% dos votos a favor. O referendo estava previsto em um acordo de paz de 2005 que encerrou décadas de guerra civil.
As diferenças étnicas e religiosas do que então era apenas um país foram o principal ponto de conflito entre os dois lados. A população do sul (hoje o Sudão do Sul), formada por diversos grupos étnicos de maioria cristã ou animista, se sentia discriminada pelo governo centralizado em Cartum (no Sudão), de maioria muçulmana, e que tentava impor a lei islâmica na região.
O governo de Cartum foi o primeiro a reconhecer a nova nação, num sinal de secessão tranquila.

 

Confronto de facções


Mas a aparente tranquilidade não durou. A guerra interna no Sudão do Sul começou em dezembro de 2013, com combates entre duas facções do exército, dividido pela rivalidade entre o presidente Salva Kiir e seu ex-vice Riek Machar. Diferentes milícias se uniram a cada um dos lados, com confrontos marcados por massacres de caráter étnico.
O confronto teve início quando Kiir destituiu Machar, acusando-o de tramar um golpe de Estado. Os dois políticos pertenciam ao mesmo partido -- o Exército de Libertação do Povo Sudanês.
"Algumas horas mais tarde, os militares se dividiram e começamos a escutar tiros em Juba (a capital)", contou à BBC Mundo o brasileiro Raimundo Rocha dos Santos, um padre brasileiro que trabalha como missionário Naquele país.
A disputa política somou-se à tensão étnica. O grupo dos dinka, ao qual pertence Salva Kiir, e que representa cerca de 15% da população do país, se opôs ao grupo dos nuer, do qual faz parte Machar e que equivale a cerca de 10% dos habitantes.



Economia em frangalhos


O fator econômico também é importante para entender o caos no país africano. Há uma inflação anual de 800%. Há um ano, US$ 1 valia cerca de 3 libras sudanesas. Atualmente, a proporção é de 1 para cerca de 120.
A economia no país piorou muito desde 2012, quando o governo decidiu fechar a produção de petróleo -- até então a commodity correspondia a 98% da receita pública do país -- após discordâncias com o Sudão, que tinha toda a infraestrutura para a sua comercialização, como oleodutos, refinarias e portos do Mar Vermelho. A maior parte do país vive em uma economia de subsistência.
Em 2015, as facções fizeram um acordo de paz que previa a volta de Machar ao governo, como vice de Kiir. Três meses depois, contudo, Machar foi novamente expulso do governo e o conflito foi retomado, em julho de 2016.



Fonte:



CANADÁ: UMA RICA HISTÓRIA DE CONVIVÊNCIA DOS DIFERENTES. A UNIDADE NA DIVERSIDADE.


A HISTÓRIA DO CANADÁ

        Acredita-se que os aborígenes tenham chegado da Ásia há 30 mil anos por uma faixa de terra entre a Sibéria e o Alasca pelo estreito de Bering. Alguns ficaram no Canadá, enquanto outros continuaram sua marcha em direção ao sul. Quando os exploradores europeus chegaram, o Canadá era povoado por uma série de povos aborígenes que, dependendo do meio ambiente, viviam de maneira nômade ou se assentavam e construíam um estilo de vida e se dedicavam à caça, pesca ou ao cultivo da terra.

         O primeiro contato entre os nativos e europeus provavelmente ocorreu há cerca de 1.000 anos, quando os Vikings da Islândia fixaram-se por pouco tempo na Ilha de Terra Nova. Mas só depois de outros 600 anos a exploração europeia efetivamente se iniciou.

As primeiras colônias

        Na procura de um novo caminho para os ricos mercados do oriente, os exploradores franceses e ingleses navegavam pelas águas da América do Norte. Construíram vários postos - os franceses ficavam, na sua maioria, às margens do Rio São Lourenço, Grandes Lagos e Rio Mississipi. Os ingleses, por sua vez, ficavam em torno da Baía de Hudson e na costa atlântica. Embora exploradores como Cabot, Cartier e Champlain jamais tenham encontrado o caminho para a China e para a Índia, encontraram algo tão valioso quanto o que procuravam: ricas águas piscosas e abundantes populações de castores, raposas e ursos, todos valiosos por sua pele.

         A colonização permanente dos franceses e ingleses começou no limiar dos anos 1600 e cresceu durante todo o século. Junto com os povoados veio a atividade econômica, mas as colônias de Nova França e Nova Inglaterra permaneciam economicamente dependentes do comércio de peles e política e militarmente dependentes de suas metrópoles.

         Inevitavelmente, a América do Norte tornou-se o foco de amargas rivalidades entre a Inglaterra e a França. Após a queda da Cidade de Quebec, em 1759, o Tratado de Paris concedeu à Inglaterra todo o território francês a leste do Mississípi, com exceção das ilhas de Saint Pierre e Miquelon, próximas à Ilha de Terra Nova. Sob o governo inglês, os 65 mil habitantes de língua francesa do Canadá tinham um único objetivo: guardar suas tradições, língua e cultura. Em 1774, a Grã-Bretanha aprovou o Ato de Quebec, que reconhecia oficialmente os direitos civis franceses e garantia liberdade religiosa e linguística.


         Um grande número de colonos de língua inglesa, chamados Legalistas porque queriam se manter fiéis à Coroa Britânica, procurou refúgio no Canadá, depois que os Estados Unidos da América tornaram-se independentes, em 1776. Estabeleceram-se principalmente nas colônias de Nova Escócia e Novo Brunswick e às margens dos Grandes Lagos.

         O aumento da população levou à criação, em 1791, do Alto e Baixo Canadá, hoje Ontário e Quebec, respectivamente. Ambos foram autorizados a ter suas próprias instituições governamentais representativas. As rebeliões no Alto e Baixo Canadá, em 1837 e 1838, levaram os ingleses a reunir as duas colônias, formando assim o Província do Canadá. Em 1848, a colônia unida foi autorizada a ter um governo autônomo, exceto no que se referia às questões de relações exteriores. O Canadá ganhava maior autonomia, mas continuava sendo parte do Império Britânico.

Nasce um país

         As colônias britânicas norte-americanas, Canadá, Nova Escócia, Novo Brunswick, Ilha do Príncipe Eduardo e Terra Nova, cresceram e prosperaram independentemente. Mas, com a ascensão dos Estados Unidos, agora mais poderosos com o fim da Guerra Civil, alguns políticos acharam que a união das colônias inglesas era o único modo de afastar eventuais possibilidade de anexação. Em 1º de julho de 1867, o Canadá Leste e o Canadá Oeste, a Nova Escócia e a Novo Brunswick uniram-se sob os termos do Ato da América do Norte Britânica e tornaram-se o Domínio do Canadá. 


       O governo do novo país baseava-se no sistema parlamentarista britânico, com um governador geral (representante da Coroa) e um Parlamento que consistia da Câmara dos Comuns e do Senado. O Parlamento recebia o poder de legislar sobre assuntos de interesse nacional (impostos e defesa nacional, por exemplo), enquanto que às províncias eram outorgados poderes sobre assuntos de interesse local (propriedade, direitos civis, educação).

A expansão para o oeste

         Logo após a Confederação, o Canadá começou a se expandir para o noroeste. A Terra de Rupert, uma área que se estendia pelo sul e oeste, por centenas de quilômetros a partir da Baía de Hudson, foi comprada pelo Canadá da Companhia da Baía de Hudson, que havia ganhado o vasto território do Rei Carlos da Inglaterra, em 1670.

         A expansão para o oeste não se deu sem dificuldades. Em 1869, Louis Riel liderou uma insurreição dos Métis na tentativa de defender seus direitos ancestrais pela terra. Chegou-se a um consenso em 1870 e uma nova província, Manitoba, foi delineada a partir da Terra de Rupert.

         A Colúmbia Britânica, colônia da Coroa desde 1858, decidiu juntar-se ao Domínio em 1871, com a promessa de uma ferrovia que a ligasse com o resto do país. Em 1873, foi a vez da Ilha do Príncipe Eduardo. Em 1898, o território de Yukon, ao norte, foi oficialmente estabelecido a fim de assegurar a jurisdição canadense sobre a área durante a corrida do ouro de Klondike. Em 1905, duas novas províncias se formaram a partir da Terra de Rupert: Alberta e Saskatchewan. O que sobrou tornaram-se os Territórios do Noroeste. Terra Nova preferiu continuar como colônia inglesa até 1949, quando se tornou a décima província do Canadá. 


        A criação de novas províncias coincidiu com um aumento na imigração do Canadá, em especial para o oeste e atingiu o seu pico em 1913, com 400 mil pessoas teriam vindo para o Canadá. Durante o período pré-guerra, o Canadá lucrou com a próspera economia mundial e se estabeleceu como uma potência industrial e agrícola.

A maturidade de uma nação

         A contribuição substancial do Canadá durante a Primeira Guerra Mundial fez com que recebesse uma representação distinta da Grã-Bretanha na Liga das Nações, após a guerra. A sua voz independente tornou-se cada vez mais articulada e, em 1931, a autonomia constitucional do Canadá foi confirmada com a aprovação do Estatuto de Westminster.

         No Canadá, como em qualquer outro lugar, as consequências da Grande Depressão de 1929 trouxeram tempos difíceis. Um em cada quatro trabalhadores estava desempregado e as províncias de Alberta, Saskatchewan e Manitoba estavam arrasadas pela seca. Ironicamente, foi a necessidade de servir às Forças Aliadas, durante a Segunda Guerra, que fez o Canadá sair da Depressão. O país emergiu da guerra como a quarta maior potência industrial.

         Desde a Segunda Guerra, a economia do Canadá tem se expandido. Este crescimento, combinado a programas sociais do governo, tais como ajuda de custo às famílias, aposentadoria, assistência e seguro- desemprego, tem dado aos canadenses um alto padrão de vida e uma qualidade de vida invejável.


         Mudanças visíveis têm ocorrido nas correntes de imigração do país. Antes da Segunda Guerra, a maioria dos imigrantes vinha das Ilhas Britânicas ou do leste europeu. Desde 1945, um número crescente de pessoas do sul da Europa, da Ásia, da América do Sul e também das ilhas do Caribe tem enriquecido o mosaico multicultural do Canadá.

         No cenário internacional, a reputação e a influência do Canadá acompanharam o seu desenvolvimento e maturidade. O Canadá tem participado das Nações Unidas desde a sua criação e é a única nação a participar das mais importantes operações da ONU em prol da paz mundial. É também membro da Comunidade Britânica, da la Francophonie, do Grupo dos Sete países industrializados, da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) e da Defesa Aeroespacial da América do Norte (NORAD).

Uma nova federação a caminho 

        O último quarto de século assiste ao país se debatendo novamente com questões sobre a sua identidade nacional. O descontentamento entre muitos quebequenses de língua francesa levou a província, em 1980, a um plebiscito. A questão era se Quebec deveria ou não tornar-se mais politicamente autônoma em relação ao Canadá. A maioria decidiu manter a atual situação da província.

         Em 1982, o processo sobre a reforma constitucional culminou na aprovação do Ato Constitucional. Segundo o Ato, o Ato da América do Norte Britânica, de 1867, e suas várias emendas tornaram-se os Atos Constitucionais 1867-1975. A Constituição, a sua Carta de Direitos e Liberdades e a sua fórmula geral de emendas estão redefinindo as funções e poderes dos governos federal e das províncias e estabelecem os direitos individuais e os dos grupos étnicos. 

        Dois grandes esforços foram feitos no sentido de se reformar o sistema constitucional: o Acordo do Lago Meech, de 1987, que não foi implementado por não obter anuência legislativa de todas as províncias e o Acordo de Charlottetown, de 1991. Este teria reformado o Senado e feito grandes mudanças na Constituição. Foi decisivamente rejeitado pelos canadenses em um plebiscito nacional em 26 de outubro de 1992.

         Por ter sido colonizado por dois povos rivais, enriquecido por várias culturas, línguas e religiões e marcado por uma geografia altamente diversificada, o Canadá não poderia deixar de ser uma terra de concessões. "Unidade na diversidade" poderia ser o seu lema. O espírito de modernização e tolerância caracterizam a federação canadense e asseguram a sua sobrevivência.

Fonte:

http://www.canadainternational.gc.ca/brazil-bresil/about_a-propos/history-histoire.aspx?lang=por   acessado em 24/02/2017



segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

ARTIGO SOBRE REFUGIADOS NO BRASIL E SEUS DIREITOS

Um interessante artigo sobre o direito dos refugiados africanos no Brasil.



Libertar-se (d)a África
Por Fabrício Toledo de Souza, advogado de direitos dos refugiados, doutorando em direito da PUC-Rio

“Há poucos meses, quando alguns poucos ganeses (cerca de 300) chegaram à cidade de Caxias do Sul (…) o mesmo tom alarmista usado quando vieram os primeiros grupos de haitianos. Exatamente a mesma palavra: invasão. Quando não é uma invasão, os africanos são uma epidemia. E quando não são uma epidemia, são um crime.”



Não há uma África, assim como não há uma história dos africanos e nem tampouco uma história de libertação dos africanos. A África é isso que (se) escreve sobre as epidemias mortais, os massacres e a exploração. É a história dos que afundaram no Mediterrâneo, dos que morreram sob o sol do deserto do Níger, ou daqueles extorquidos na travessia pela América do Sul, enquanto os homens (brancos) de bem decidiam as cotas de liberdade. É a história das guerras, genocídios e massacres, com todos os inacreditáveis detalhes que a modulação arcaica do capitalismo produz naquela parte contaminada do mundo: homens com facões, crianças soldados, mutilações, canibalismo forçado, estupros em massa, calabouços, perseguições políticas, enfim, histórias e mais histórias de absoluto terror. A África é o que se escreve do holocausto negro, aqui e agora, transmitido por telefones celulares que carregam os minerais extraídos da carne. É o que se diz sobre os trabalhadores imigrantes superexplorados, em tarefas degradantes, dentro de carvoarias ou frigoríficos, para pagar as dívidas com “coiotes”, subornos dos policiais e também para enviar dinheiro às famílias.
E a África é também a história cósmica de um continente cósmico, história das lutas por libertação, das diásporas e da globalização. História dos povos que se espalham pelo mundo, superando tragédias, sobrevivendo, lutando e desejando uma vida melhor para si e para os familiares que restaram na terra natal. A história dos deuses guerreiros e de pessoas que lutam pela sobrevivência e lutam por uma vida maior, mesmo que sejam condenados por isso: por querer. Sincretismo como estratégia, fuga como luta, tradição como resistência, música como tecnologia, dança como guerra, ainda que o mundo tenha acabado. É especialmente pela fuga que conhecemos as histórias: diásporas, ligações telefônicas internacionais, redes sociais, remessa de dinheiro (maior do que a ajuda humanitária internacional), blogs, notícias, enfim, sobre a paz. Está tudo sendo escrito.
A história da libertação dos africanos é a história de sua libertação da própria África, na forma de muitas e variadas diásporas, até que se torne impossível contar uma história de Uma África. Não é uma questão de culturas ou de múltiplas culturas, mas de resistências biopolíticas. Mesmo no Brasil, a libertação dos africanos se escreve sem parar, a todo o momento, uma sobre as outras; ou melhor, uma ao lado das outras, incluindo as que desistiram de se escrever. Mas estão todas por aí. Cotas raciais, quilombos, capoeira, candomblé, João Cândido, samba, Amarildo, haitianos, refugiados, Gilberto Gil. Escreve-se de muitas maneiras, com muitas palavras, ainda que existam sempre aqueles dispostos a expropria-las.
Hoje mesmo tentam falar da África como epidemia e dos imigrantes como vírus da morte. Há poucos meses, quando alguns poucos ganeses (cerca de 300) chegaram à cidade de Caxias do Sul, logo nos primeiros dias após o final da Copa do Mundo, os jornais falavam em “invasão”[1]. Antes dos ganeses, a cidade – pequena, mas economicamente muito forte — já havia seduzido os haitianos e senegaleses, que são agora parte de um contingente de pouco mais de dois mil migrantes. Era o mesmo tom alarmista usado quando vieram os primeiros grupos de haitianos. Exatamente a mesma palavra: invasão[2]. Quando não é uma invasão, os africanos são uma epidemia. E quando não são uma epidemia, são um crime.
Os haitianos, recebidos como vítimas de uma catástrofe natural (por causa do terremoto em 2010, que devastou o país), foram documentados e tratados como migrantes “humanitários”. Logo caíram nas graças da “opinião pública”, com a fama de “bons trabalhadores”. Quanto aos senegaleses, eles também receberam um tratamento especial por parte do governo brasileiro. Atendendo a uma demanda dos empresários de Caxias do Sul (onde agora estão os ganeses), o Conselho Nacional de Imigração (CNIG) regularizou a situação de um número determinado deles. E os migrantes que vieram depois — como solicitantes de refúgio – estão sendo paulatinamente documentados, graças a um acordo entre o Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE) e o CNIG.
A mídia corporativista usa a mesma retórica preconceituosa e securitária de sempre, atualizando o racismo estrutural e reproduzindo os discursos conservadores bastante comuns nos países do Norte. Aos ganeses, os jornais não deram a chance de falar, a não ser pelas poucas palavras entre “aspas” ou pela declaração oficial de um político do país. A mídia deu espaço ao Vice Ministro de Informação de Gana, para quem os pedidos de refúgio feito por seus conterrâneos “têm base completamente falsa”[3]. Os ganeses, segundo os jornais, apenas “alegam”: alegam que fogem de perseguição, alegam que fogem da violência, alegam que fogem da miséria… sempre entre aspas, alegam alguma coisa. As expressões das autoridades (brasileiras e ganesa), por sua vez, mesclam-se ao texto dos jornalistas. E todas as suas palavras ganham status de verdade.
A Polícia logo decidiu investigar o fluxo “anormal” de migrantes ganeses chegando ao Brasil. O delegado federal responsável pela investigação, atendendo aos jornalistas, culpou a embaixada brasileira em Acra (capital de Gana) pelo “erro grave” de conceder vistos sem adotar os cuidados “rotineiros”. A chegada dos ganeses, segundo o delegado, é parte de um “movimento organizado” e a concessão indiscriminada de vistos trouxe “consequências nefastas”[4]. A culpa também da Lei da Copa, que “flexibilizou” as regras para os vistos, geralmente negados aos ganeses (mais pobres).
A “flexibilização” da regra (da “normalidade”) aparece como problema somente agora quando os migrantes africanos negam-se a voltar ao seu país (exceção) de origem e pedem refúgio. E se isso não é suficiente para explicar o “erro”, é preciso então encontrar as “redes criminosas”, as “organizações”, os “coiotes”, as atividades escusas. E os jornais, afinal, fazem esquecer que solicitar refúgio é um direito acessível a qualquer estrangeiro, mesmo para os que entraram com visto de turista ou que entraram irregularmente. E que, eventualmente, migrar pode ser uma necessidade. Talvez até um direito, quem sabe?
Mesmo como vítimas, os africanos estão em categoria inferior. São vítimas de segunda categoria. Enquanto os sírios e palestinos conseguem a solidariedade quase unânime e ganham destaques na imprensa em todo o globo, os africanos que vivem as mais selvagens guerras de todos os tempos sobrevivem somente enquanto missões humanitárias são capazes de ajuda-los ou na medida em que são capazes de fugir com vida. Não se trata de medir a vida pela dor, nem a dor pelo número de vítimas, mas 200 mil mortos sírios valem mais do que os seis milhões de congoleses trucidados. E as mulheres congolesas valem menos ainda: a cada hora, naquele país africano, 48 mulheres são estupradas e tudo acontece como se fosse normal. E realmente se tornou normal, impune e aceitável.
Somente o sofrimento máximo pode expia-los da culpa e apenas a condescendência os libertará. Se são vítimas da guerra, como os congoleses, vítimas da miséria, como os haitianos e senegaleses, ou se são vítimas dos coiotes ou de falsos sonhos, os imigrantes africanos estão corrompidos pelo crime de migrar; isto é, por terem enfrentado obstáculos que normalmente muitos de nós não conseguiríamos superar. Se desejam mais do que sobreviver, serão acusados de (nos) enganar e de nos roubar. E, sobretudo, serão culpados por desejarem mais do que condescendência. São culpados por desejar uma vida melhor.
PS. Em julho de 2014, pela primeira vez, um refugiado participou de uma Plenária do Comitê Nacional para os Refugiados, desde sua fundação, em 1998. O congolês Charly Kongo falou longamente – mas menos do que gostaria – sobre o que acontece em seu país. Falou sobre os grupos rebeldes, sobre a tirania do atual governo, sobre a violência generalizada, sobre as infâncias destruídas e sobre o massacre das mulheres. Tudo parecia inacreditável, mas nada era realmente novidade. Todos já tínhamos lido sobre isso. Mas era a primeira vez que um refugiado falava e havia um enorme e doloroso silêncio. Era a primeira vez que um refugiado africano entrava naquela sala. E a primeira vez que um negro se sentava naquela mesa. Um dia histórico, graças à luta dos refugiados e à luta de Charly Kongo.

NOTAS
[1] “PF investiga ação de ‘coiotes’ em invasão de ganeses no Sul”. O Globo. 09/07/2014. http://oglobo.globo.com/brasil/pf-investiga-acao-de-coiotes-em-invasao-de-ganeses-no-sul-13201334
[2] “Acre sobre com invasão de imigrantes do Haiti”, O Globo, 01/01/2012. Disponível em http://oglobo.globo.com/brasil/acre-sofre-com-invasao-de-imigrantes-do-haiti-3549381.
[3] “Vice Ministro de Gana diz que pedidos de refúgio no RS têm base falsa”. Portal G1, 11/07/2014, disponível em http://g1.globo.com/mundo/noticia/2014/07/ministro-de-gana-diz-que-pedidos-de-asilo-no-rs-nao-tem-fundamento.html.
[4] As declarações do delegado foram publicadas, sem nenhum pudor, no jornal O Globo. “PF atribui a ‘erro grave’ do Itamaraty ingresso de ganeses no Brasil”. 10/07/2014. Disponível em http://oglobo.globo.com/brasil/pf-atribui-erro-grave-do-itamaraty-ingresso-de-ganeses-no-brasil-13213887#ixzz37HXF9nU1].











domingo, 19 de fevereiro de 2017

AUSTRÁLIA PERDE UMA PARTE DE SEU CONTINENTE PARA A NOVA ZELÂNDIA

CIENTISTAS PROPÕE UM NOVO CONTINENTE: a ZELÂNDIA




A história é parecida com a da Atlântida: um continente perdido debaixo de água. Só que este é real e tem o nome de Zelândia. O novo continente foi descoberto na zona Sudoeste do oceano Pacífico e tem 4,9 milhões de quilômetros quadrados. Num novo estudo da crosta terrestre, publicado no site da Sociedade Geológica da América (GSA), foi divulgada a existência de uma zona de crosta continental não fragmentada, com critérios que permitem que lhe seja atribuído o estatuto de continente.
O continente encontra-se 94% submerso e a Nova Zelândia corresponde aos picos mais altos deste continente, sendo uma das poucas partes que não se encontra submersa. Desta massa de terra também faz parte a Nova Caledônia e outros grupos de ilhas mais pequenos.
A existência deste continente já tinha sido proposta em 1995, por Bruce Luyendyk, ainda que, na altura, se pensasse estar-se na presença de vários fragmentos de crosta continental. “Esta não é uma descoberta súbita, mas uma percepção gradual” – escrevem os investigadores no artigo, acrescentando que há dez anos não teriam nem os dados nem a confiança necessários para publicar um trabalho sobre o tema.
Nas conclusões do estudo, é assegurado que a Zelândia não é um conjunto de fragmentos continentais mas sim de um só continente. “Que um continente possa estar tão submerso e, ainda assim, não estar fragmentado” torna-o muito útil no estudo das crostas continentais, lê-se no artigo.





Os cientistas acreditam que este continente, a Zelândia, fazia parte do antigo supercontinente Gonduana. À luz da teoria da tectônica de placas e da deriva continental, a desagregação do supercontinente Pangeia, que começou há cerca de 200 milhões de anos, levou à criação de outros dois outros supercontinentes: a Laurásia e a Gonduana, que depois se foram fragmentando até se chegar à atual configuração dos continentes. A Zelândia correspondia a aproximadamente 5% da área total da Gonduana, de que também fazia parte a Austrália, a Índia, a Antártida, a África e a América do Sul.

Os 4,9 milhões de quilômetros quadrados da Zelândia fazem com que tenha, aproximadamente, o mesmo tamanho da Índia e um terço do tamanho da Austrália, sendo ainda seis vezes maior do que Madagáscar. “A contagem correta dos continentes terrestres é importante para vários campos das ciências naturais”, referem os autores do estudo, assinado em primeiro lugar por Nick Mortimer, da GNS Science, empresa de consultoria em geociências na Nova Zelândia.

Excetuando a visibilidade, a Zelândia terá todas as características que permitem que seja considerada um continente: mais elevada relativamente à crosta oceânica, geologia distinta, uma área bem definida e uma crosta mais grossa e menos densa do que a crosta oceânica. De acordo com o estudo, a Zelândia passa agora a ser o continente mais recente e mais submerso de todos os conhecidos.

FONTES:
Acessado em 19/02/2017

Jornal Nacional

sábado, 18 de fevereiro de 2017

SIT DOWN MISTER TRUMP AND LISTEN

UMA AULA DE HISTÓRIA PARA MISTER TRUMP

 

         A polêmica e intempestiva decisão do senhor Donald Trump, atual presidente dos EUA, de erguer um muro entre o seu país e o México, precisa ser questionada historicamente com uma pequena lembrança sobre a expansão dos EUA no século XIX:

 

            Entende-se como a expansão territorial dos EUA aquele período que se estende praticamente durante todo o século XIX, onde o país aumenta de modo extraordinário as suas fronteiras, chegando ao fim do mesmo período com praticamente as dimensões continentais que hoje possui.

            Inicialmente constituído por treze estados (as antigas 13 colônias inglesas) alinhados ao longo da costa leste da América do Norte, a jovem nação constituía um pequeno país, estendendo-se do Maine à Flórida e horizontalmente entre a costa do Atlântico e o rio Mississípi.

            No século XIX, os norte-americanos acreditavam que haviam sido escolhidos por Deus para liderarem o mundo. Essa crença ficou conhecida como a Doutrina do Destino Manifesto. Essa doutrina foi a razão ideológica que moveu os americanos, no século XIX, a expandirem seu território na direção oeste.
            A Doutrina do Destino Manifesto serviu de impulso para que os norte-americanos saíssem de suas fronteiras, indo ocupar o vasto e quase inexplorado oeste.

A expansão territorial se deu basicamente de quatro formas:
1 - Compra de territórios - foi por este formato de expansão territorial que se deu os primeiros importantes avanços na linha fronteiriça norte-americana, com a compra da Luisiana à França de Napoleão Bonaparte em 1804 e a compra da Flórida em 1819 aos espanhóis. Importante lembrar que os 15 milhões de dólares gastos pelos EUA na compra do território denominado Luisiana à época fazia referência a uma faixa territorial muito maior que o atual estado da Luisiana, que se estendia do Golfo do México às fronteiras com o Canadá britânico.
2 - Diplomacia - é exemplo deste formato de expansão a anexação do Oregon aos ingleses, em 1846, a partir de compensações de natureza diversas pelo direito de soberania ao território.
3 - GUERRA - nesta categoria, o MÉXICO foi a maior vítima do expansionismo norte-americano, pois perdeu parte considerável de seu território original. Inicialmente, os colonos norte-americanos estabelecidos no Texas declararam a independência deste, logo depois aceitando sua incorporação aos Estados Unidos. Os conflitos iniciados com a ocupação de colonos dos EUA em várias partes de território pertencente ao México chegaria ao fim somente em 1845, através do tratado de Guadalupe-Hidalgo, que estabelecia a fronteira entre México e Texas, além de ceder aos norte-americanos as atuais Califórnia, Arizona, Novo México, Nevada, Utah e parte do Colorado por meio de uma indenização de 15 milhões de dólares.
4 - Guerras contra as nações indígenas - em sua marcha para o Oeste, expandindo o território dos EUA, era imprescindível aos colonos que "pacificassem" os povos indígenas estabelecidos ao longo de todos os novos territórios, ocupando suas terras efetivamente. Provavelmente foram os povos indígenas aqueles que mais perderam com a filosofia do Destino Manifesto, sendo muitos deles exterminados, outros depararam-se com uma quase-extinção, outros acabaram assimilados aos dominadores.

            Os Estados Unidos continuariam sua expansão durante o século XX, mas agora adquirindo territórios ultramarinos, espécie de "neocolônias", como por exemplo, Cuba, Porto Rico, Filipinas, a Samoa Americana ou as ilhas Marianas.

Veja também:

O NOME DA ROSA

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