sábado, 23 de abril de 2022

CORTIÇOS OU FAVELAS? QUAL DOS MALES O MENOR?

 

       Ao reler “O Cortiço” de Aluísio Azevedo, veio-me a seguinte questão, o que é (era – será) melhor, morar num Cortiço ou numa Favela (já que tinha lido também Carolina Maria de Jesus – Quarto de Despejo – O Diário de uma Favelada)?

       Ao fazer uma rápida pesquisa encontrei um site denominado “Caos Planejado”, cujo artigo de Anthony Ling, me aclarou razoavelmente a questão.

       É óbvio que o ideal seria que todos os brasileiros tivessem sua moradia condignamente, e esta deve ser a utopia buscada com urgência.

       A utopia nos serve de orientação para o caminho a ser tomado, caminho este, que passa pelo conhecimento da realidade, e isso que vamos fazer agora.

 

Cortiços eram Melhores que as Favelas?!?

No imaginário popular, cortiços eram o que existia de pior como moradia nas cidades brasileiras. Como poderiam então ser melhores que as nossas favelas? (Anthony Ling).

       No imaginário popular, cortiços eram o que existia de pior como moradia nas cidades brasileiras. Enraizado na nossa cultura e registrado no clássico de Aluísio Azevedo, cortiços eram moradias insalubres e dilapidadas, onde doenças se proliferavam, onde habitava a escória da sociedade e de onde proprietários exploravam os moradores com aluguéis abusivos.

     Tão forte é esta noção que, historicamente, a solução simplista, de São Paulo a Recife, foi a proibição e a destruição dos cortiços como medida de “saúde pública”. No seu lugar, vias largas atravessaram os cortiços como na Reforma Passos[1], no Rio de Janeiro, abrindo caminho para uma cidade mais “arejada”, noção importante na saúde pública no passado, que acreditava que a aglomeração e os “ares ruins” do “miasma[2]” ajudavam a proliferar doenças.

 

Acesso à moradia

       Embora de má qualidade, cortiços providenciaram um primeiro passo no acesso à moradia em uma sociedade brasileira que ainda era muito pobre e mais desigual que hoje. Como relata o urbanista Nabil Bonduki, migrantes que chegavam a São Paulo no início do século XX tinham acesso a um mercado onde:

“Uma espécie de ‘rentiers[3] urbanos’ pôde produzir uma ampla diversidade de soluções habitacionais de aluguel para os diferentes segmentos sociais e faixas de renda, dando origem a uma gama variada de tipologias que marcaram a paisagem da cidade nas primeiras décadas do século, quando a moradia operária se localizava próxima à uma zona industrial”.

“Surgem, assim, inúmeras soluções habitacionais, a maior parte buscando economizar terrenos e materiais através da geminação e da inexistência de recuos laterais ou frontais, cada qual destinado a uma capacidade de pagamento de aluguel”.

“Do cortiço, moradia operária por excelência, sequência de pequenas moradias ou cômodos insalubres ao longo de um corredor, sem instalações hidráulicas, aos palacetes padronizados produzidos para uma classe média que enriquecia, passando por soluções pobres, mas decentes, de casas geminadas em vilas ou ruas particulares, que perfuravam quarteirões, para aumentar o aproveitamento de um solo caro e disputado pela especulação imobiliária.

“Superada a aguda carência de moradias que ocorreu no início da República (lembrar que São Paulo multiplicou por seis num espaço de catorze anos!), a produção de casa e cortiços atendeu, do ponto de vista quantitativo, às necessidades da população, com exceção dos períodos críticos da Primeira Guerra Mundial e da revolução de 1924. Este relativo equilíbrio entre oferta e procura de habitação, no entanto, era proporcionado graças à produção ou adaptação para moradia popular de pequenas células insalubres, da área reduzida e precárias condições habitacionais, genericamente denominadas ‘cortiços’, consideradas o inimigo número um da saúde pública”.

       O relato histórico de Bonduki mostra que o mercado habitacional, apesar de uma forma precária, conseguia atender a demanda por moradia, deixando claras as inegáveis más condições dos cortiços. Mas é preciso fazer uma análise considerando a perspectiva da época em contraponto com nossa situação de hoje. Como os insalubres cortiços poderiam ser melhores que as nossas favelas e porque compará-los? 

Cortiços

       Em primeiro lugar, é difícil apontar um único tipo ou qualidade de cortiço. Como diz o próprio relato de Bonduki, os tipos de cortiços eram vários e, comparando com o que vemos hoje, não existia uma distância gigantesca entre o que hoje chamamos de cidade formal e informal. Existiam várias opções de moradia para diferentes faixas de renda, sem o degrau praticamente inatingível para ascensão de qualidade como é a realidade de hoje. De qualquer forma, em grande parte, cortiços eram construções em alvenaria e, embora mal acabadas, resistiam às intempéries de forma superior aos barracos autoconstruídos, em sua maioria em madeira, que marcaram o surgimento das favelas e que ainda caracterizam muitas favelas de hoje. Ou seja, a função básica da construção de proteger o habitante de chuvas fortes, incêndios ou até deslizamentos estava mais bem assegurada. Esta diferença de qualidade é exacerbada quando comparamos uma tecnologia construtiva de cem anos atrás, quando os cortiços surgiam no Brasil, com as tecnologias construtivas de hoje. Provavelmente um “cortiço” considerando tecnologias atuais teria sido verticalizado, aproveitando melhor o espaço aumentando o tamanho da edificação ao invés de diminuir o tamanho dos cômodos. Este foi o resultado da evolução da moradia em Shenzhen[4] onde tais restrições não foram efetivadas da mesma forma.

       É importante destacar que, mesmo sendo um problema, o tamanho dos cômodos e a “falta de espaços arejados” não era questão principal na salubridade dos cortiços como se acreditava e como ainda se difunde até hoje. No Brasil, até o início do século XX, se acreditava que cortiços eram focos de “miasma” e que, na ausência de espaços arejados, poderiam levar à proliferação de doenças, inclusive da febre amarela. Mesmo após a desmistificação da teoria miasmática e da descoberta de que a febre amarela era transmitida através do mosquito Aedes, este pretexto continuou sendo usado para as políticas higienistas de destruição de regiões pobres das cidades, enraizando-se na percepção popular dos cortiços até hoje.

       A questão mais relevante para a salubridade é que cortiços recebiam menos investimentos na sua infraestrutura que áreas mais ricas da cidade. Assim, com um saneamento comprometido, tornava-se foco de proliferação de doenças através das redes de água e esgoto contaminadas e, potencialmente, até mesmo a geração de focos propícios para o mosquito Aedes e, então, da febre amarela. Considerando o conhecimento científico atual, é difícil argumentar que a construção privada do cortiço propriamente dito era, em si, um grande agressor à saúde pública ou até mesmo dos seus habitantes. Existem exemplos atuais em cidades desenvolvidas como Hong Kong ou Paris, onde é comum, habitantes morarem em cômodos de até 9 metros quadrados, com janelas pequenas ou inexistentes. Alguns estudos mostram possíveis relações de tamanhos habitacionais reduzidos com o aumento do stress, mas o impacto não é claro, e certamente muito menos exagerados das alegações do início do século XX.

       Cortiços, embora precários, também faziam parte de um mercado imobiliário formal, embora em fase prematura. Seus moradores eram pobres, mas não estavam às margens da lei no quesito moradia, o que é a regra em favelas. Assim, em teoria, haveria um incentivo maior à segurança jurídica e legal da sua habitação, eliminando a justificativa de derrubar suas casas por serem invasores ou moradores ilegais.

 

Demolições dos Cortiços e Surgimento das Favelas


  No entanto, infelizmente a história mostrou o contrário, e os cortiços sofreram demolições em massa por todo o Brasil. A reforma do prefeito Passos no Rio de Janeiro (considerado o “Haussman à la carioca” - Georges-Eugène Haussmann, prefeito de Paris entre 1853 e 1870), na transição entre o século XIX e XX, exemplifica o movimento de destruição dos cortiços e o surgimento das primeiras favelas no Brasil. Do livro “Evolução Urbana do Rio de Janeiro” de Maurício de A. Abreu (onde os comentários entre a colchetes são do autor Anthony Ling).

“(...) em nome da higiene e da estética, [Passos] declarou guerra aos quiosques da cidade e proibiu a venda de vários produtos por ambulantes, atingindo, por conseguinte, as fontes de renda de grande número de pessoas. Proibiu ainda o exercício de mendicância e demoliu uma série de cortiços, que já haviam sido proibidos de sofrer reparos por lei municipal em 10 de fevereiro de 1903”.

“A Reforma Passos (...) representa também o primeiro exemplo de intervenção estatal maciça sobre o urbano, reorganizado agora sob novas bases econômicas e ideológicas, que não mais condiziam com a presença de pobres na área mais valorizada da cidade. De fato, o alargamento das ruas centrais e abertura de novas artérias, que atravessaram preferencialmente as velhas freguesias artesanais e industriais, ‘destruiu quarteirões de cortiços, habitados pelos proletários, e os armazéns e trapiches dos bairros marítimos, numa extensão de aproximadamente 13 hectares’. Grande parte da população foi, então, forçada a morar com outras famílias, a pagar aluguéis altos (devido à diminuição da oferta de habitações) ou a mudar-se para os subúrbios, já que pouquíssimas foram as habitações populares construídas pelo Estado em substituição às que foram destruídas”.

“É a partir daí que os morros situados no centro da cidade (Providência São Carlos, Santo Antônio e outros), até então pouco habitados, passam a ser rapidamente ocupados, dando origem a uma forma de habitação popular que marcaria profundamente a feição da cidade neste século [XX] – a favela”.

       Flávio Villaça, no texto “O que todo cidadão precisa saber sobre habitação”, desenvolve exemplos semelhantes para a cidade de São Paulo, que proibiram os cortiços em diversas instâncias:

“O Código de Posturas Municipais do Município de São Paulo de 1886, por exemplo, contém uma série de dispositivos regulamentando os cortiços. Não só número e dimensões de cômodos, instalações sanitárias, ventilação e insolação, mas também suas localizações. A construção de cortiços era proibida ‘no perímetro do comércio’ e quando seus terrenos fossem contíguos a ‘casa de habitação’ deveriam ter no mínimo 15 metros de frente”

       Ainda, em 1894 foi elaborado o Código Sanitário do Estado de São Paulo, proibindo a construção de cortiços e “convidando a administração municipal a providenciar a destruição dos existentes”.

       Villaça continua:

“Vê-se que estas regulamentações nada tinham a ver com o combate a epidemia nem com a proteção da saúde pública, mas sim com o afastamento dos cortiços das áreas onde as camadas de mais alta renda residiam, circulavam e tinha seus imóveis mais nobres. A proteção dos valores imobiliários viria a ser nas décadas subsequentes, até os dias de hoje, uma das razões inconfessas de muitas leis urbanísticas nos municípios brasileiros.”

“Nessa mesma época e utilizando o mesmo discurso, teve início a longa aliança entre os interesses imobiliários e a legislação urbanística. A necessidade de demolição dos cortiços insalubres era sistematicamente invocada para a proteção da saúde pública, porém eles somente eram demolidos nas áreas mais centrais da cidade, especialmente para dar lugar as grandes avenidas que viriam para “embelezar e modernizar” nossas cidades (como se alegava na época), ou seja, abrir espaços para a frutificação do capital imobiliário (...) a demolição dos cortiços era exigida e saudada, porém, somente se concretizava quando eles se constituíam em obstáculos à renovação urbana nas direções ‘nobres’ da cidade”.

       Processo semelhante ocorreu em Recife com a destruição dos mocambos, construções típicas habitadas majoritariamente por escravizados libertos que tinham uma percepção pública semelhante aos cortiços. Segundo o blog Recifaces:

“Os governos estadual e municipal começaram a atestar que as comunidades mocambas eram insalubres e foco de imoralidades sociais, como prostituição e ‘bandidagem’, e que não permitiam ao trabalhador uma condição de vida digna. Ao mesmo tempo, o mercado imobiliário começava a crescer na capital pernambucana e o seu interesse era grande sobre as áreas onde os mocambos estavam alocados. Diante dessa pressão do governo e do forte interesse do mercado imobiliário sobre essas áreas, se iniciou uma ação por toda a cidade para a derrubada dos mocambos e a retirada das famílias que os habitavam, essa ação ficou conhecida como a ‘Liga Social contra o Mocambo’”.

“Se o objetivo era extinguir os mocambos, através da Liga Social, por que eles foram apenas removidos do centro urbano e tolerados em áreas periféricas do Recife? Esse é o ponto. O governo não estava preocupado com as condições de vida da população pobre do Recife e sim em limpar o centro da cidade da ‘praga visual’ que eram os mocambos, diz Thiago Pereira Francisco, especialista em história da favelização no Recife. A população expulsa do centro de Recife migrou para essas áreas remotas da cidade, onde começaram a se instalar se o mínimo apoio do governo. Na medida em que as famílias eram proibidas de habitar o centro, elas começaram a migrar para áreas que não tinham intervenções do governo”.

       A história mostra que as políticas de destruição das formas populares de moradia tinham uma motivação elitista sob falsas bases científicas. Caso não tivéssemos seguido por esse caminho, poderíamos ter desenvolvido de forma gradual a tipologia da moradia popular, utilizando novas tecnologias para melhorar a sua qualidade e torná-la cada vez mais acessível. No entanto, o caminho que seguimos foi o de tentar “legislar a riqueza”, criando políticas públicas que basicamente proibiram que o mercado de moradias populares existisse, deixando uma parcela significativa da população sem alternativa além de construir o seu próprio barraco de forma irregular.

Ver sobre o livro "O Cortiço" de Aluísio Azevedo clicando AQUI.

Fonte: Site Caos Planejado. Disponível em: https://caosplanejado.com/corticos-eram-melhores-que-favelas/. Acesso em 23 de abr. de 2022.




[1] Reforma Passos – Pereira Passos foi um famoso engenheiro brasileiro que estudou na Europa, tornou-se empresário na área da construção civil e por volta de 1887 fundou a serraria que se tornaria uma das maiores fornecedoras de madeira para a construção de mansões e palacetes no Rio de Janeiro. No final de 1902, foi convidado pelo presidente Rodrigues Alves (1902 -1906), recém-empossado, para assumir a prefeitura do Rio de Janeiro com a missão explícita de “consertar os defeitos da capital que afetam e perturbam todo o desenvolvimento nacional”, como consta da mensagem presidencial enviada ao Congresso Nacional em maio de 1903. Assim, incentivado pelo presidente, Pereira Passos começou as reformas já em 1903. O presidente levantou os recursos e o prefeito pôde realizar as obras, a higienização ficou nas mãos do médico Oswaldo Cruz, diretor do Serviço de Saúde Pública. A reforma urbana carioca foi inspirada na reforma feita em Paris no século XIX, entre 1853 e 1870. Em sua gestão, Passos modernizou a Zona Portuária, criou a Avenida Central, hoje Rio Branco, a Avenida Beira-Mar e a Avenida Maracanã. A Reforma Pereira Passos buscou adaptar a cidade também para os automóveis. É nesse período que o Rio de Janeiro vê a chegada da energia elétrica e a reorganização do espaço urbano carioca. O prefeito proibiu ainda a atuação de ambulantes e a derrubada dos cortiços que levou ao surgimento das favelas. 


[2] Miasmasubstantivo masculino. História da Medicina: Emanação a que se atribuía, antes das descobertas da microbiologia, a contaminação das doenças infecciosas e epidêmicas. Exalação pútrida que emana de animais ou vegetais em decomposição.

 


[3] Rentiers – do francês, sujeito masculino, plural de rentier que significa possuidor de rendimentos, capitalista, proprietário que aluga para um inquilino.

 


[4] Shenzhen – local na China, onde ex-agricultores tiveram suas terras expropriadas e estatizadas com casas mantidas, decidindo espontaneamente e coletivamente reestruturar por inteiro a área com a construção de vários edifícios de até cinco andares entre ruas de dois a três metros de largura, mostrando claramente a preferência por mais área habitável em detrimento a ruas mais largas. O entorno dessas comunidades é servido com avenidas que têm infraestrutura urbana completa, não ficando muito longe do próprio centro da cidade. O resultado é um aluguel mais barato, que atrai aqueles cuja alternativa seria morar longe da cidade e sem acesso a oportunidades.

 

sexta-feira, 22 de abril de 2022

NOVO INSTRUMENTO DO IMPERIALISMO ESTADO-UNIDENSE – COLÔMBIA É CONSIDERADA ALIADA EXTERNA DA OTAN!?!


       No dia 21 de abril de 2022, o presidente estado-unidense, Joe Biden, confirmou a designação da Colômbia como aliado externo da OTAN, que é formada por 30 países.

Notifico minha intenção de designar a Colômbia como aliada importante fora da OTAN. Faço esta designação em reconhecimento da importância da relação entre os EUA e a Colômbia e das contribuições cruciais da Colômbia à segurança regional e internacional”, escreveu Biden em carta enviada ao Capitólio.


       Dessa forma, os colombianos terão acesso ao material bélico estado-unidense e receber empréstimos para obter equipamento militar e pesquisa, bem como tecnologia espacial e participação em operações conjuntas com o Pentágono.

“Agora somos aliados oficiais, pois agora a Colômbia taambé é um Aliado Principal Não Membro da OTAN. Tudo isso indica que há uma aliança, uma amizade estratégica que segue e que queremos seguir no futuro” (US Embassy Bogota).

       Os EUA já vinham apoiando a Colômbia há tempos, inclusive tentando usar o país em sua “luta” contra a Venezuela.

       Recentemente, os estado-unidenses enviaram 40 blindados à Colômbia, para “fortalecer suas capacidades operacionais” e “reforçar os laços de cooperação” entre os dois países.

       Essa pode ser mais uma investida dos EUA em se aproximar e enviar armas para lutar contra a Venezuela, tal como tentou em um passado recente.

       Nicolás Maduro, presidente da Venezuela, acusou recentemente seu homólogo da Colômbia, Iván Duque, de planejar uma série de ataques contra seu país, durante um discurso no Primeiro Encontro Nacional de Ativistas do Movimento Somos Venezuela.

       Em fevereiro de 2020, o presidente venezuelano acusou os EUA e a Colômbia de ordenarem um “ataque terrorista” contra um armazém de empresas de telecomunicações estatais no estado de Carabobo, no centro da Venezuela. Em outubro de 2020, Nicolás Maduro culpou Duque e o ex-presidente colombiano Álvaro Uribe por um ataque à refinaria de Amuay, no noroeste venezuelano, o que qualificou como parte de uma “guerra suja” e “desprezível” contra as “indústrias fundamentais” do país.


       Já em março de 2021 o alto responsável da Venezuela pediu às Forças Armadas Nacionais Bolivarianas (FANB) para “ter cuidado” com operações realizadas na fronteira com a Colômbia contra grupos armados irregulares, declarando que Duque estava procurando gerar um conflito entre os dois países em aliança com o Comando Sul dos EUA.

 

Fonte: Site Sputinik Brasil. Disponível em: https://br.sputniknews.com/20220422/novo-instrumento-de-interesses-eua-oficializam-colombia-como-aliado-externo-da-otan-22369450.html. Acesso em: 22 de abr. 2022.

 

 

  

domingo, 17 de abril de 2022

UMA PARABOLA CHINESA

 

Sobre o conflito 

Rússia-Ucrânia

       Na China, a maioria das pessoas interessadas em política apóia instintivamente a Rússia, e Putin em particular, no conflito com a Ucrânia. Contudo, muitos não compreendem a essência e a profundidade dos acontecimentos. Assim, um analista chinês criou a sua própria explicação figurada sob a forma de parábola para tornar mais compreensível o que se passa.

         Há 20 anos, a Ucrânia divorciou-se do seu marido (a Rússia). Os filhos deste casamento ficaram com ela. O seu ex foi generoso e deixo-lhe muito dinheiro, propriedades e até reembolsou todas as suas dívidas num montante de 200 milhões de dólares! Depois de se separar do marido, a mulher começou imediatamente a namoriscar com o hooligan[1] da aldeia (EUA) e uma chusma de bandidos (Ocidente). Seja como for, ela começou a ouvir apenas as suas opiniões e, juntamente com eles começou a provocar e ameaçar o ex-marido. O ex zangou-se e tomou um dos filhos à força, a Criméia.

          A ex-mulher zangou-se e sonhou em casar-se para se aproximar do clã da OTAN, a fim de usar o seu poder para fazer pressão sobre o seu ex-marido. Mas o americano, o hooligan da aldeia, não tinha qualquer intenção em casar com ela, esperando apenas humilhar o seu antigo marido, a Rússia, com a sua ajuda. Ela não se importava com os seus outros filhos, Lugansk e Donetsk, os quais eram tratados cruelmente. Por vezes dava-lhes pontapés e esbofeteava-os. As crianças choravam, procuravam o seu pai e pediam ajuda. Durante todo este tempo, o principal hooligan continuava a alimentar as brigas dos ex e pouco a pouco fornecia bens obsoletos (equipamento militar) à sua amiguinha Ucrânia. A mulher sentiu que tinha alguém para apoiá-la no conflito e começou a provocar muito descaradamente o seu ex-marido zombando do que era sagrado para ele, os seus filhos e a memória dos seus antepassados. A sua paciência foi posta à prova.

         Acompanhado de parentes, foi à casa da sua ex a fim de proteger os dois pequenos. E depois ela e a sua chusma de bandidos ficaram todos acovardados quando o ex, pondo de lado a sua boa índole, começou a bater à sua porta!

       Foi então que os chineses compreenderam tudo.

6 de março de 2022.

 


O original encontra-se em politikus.ru/... e a versão em francês em reseauinternational.net/... Esta parábola encontra-se em resistir.info                                                                                                



[1] Hooligan – substantivo Masculino – desordeiro que se entrega a atos de violência e vandalismo, especialmente quando em competições esportivas; torcedor violento, arruaceiro, vândalo.

quinta-feira, 14 de abril de 2022

JOSÉ MARTÍ – “EL APÓSTOL”


 

"Se viene a la tierra como cera, – y el azar nos vacía en moldes prehechos. – Las convenciones creadas deforman la existência verdadera… Las redenciones han venido siendo formales: - es necesario que sean esenciales . La liberdad política no estará asegurada, mientras no se asegura la libertad espiritual. … La escuela y el hogar son las dos formidables cárceles del hombre".

José Martí

"Vem à terra como cera, - e o acaso nos esvazia em moldes pré-fabricados. As convenções criadas deformam a verdadeira existência... Os resgates foram formais: - é preciso que sejam essenciais. A liberdade política não estará assegurada, até que a liberdade espiritual o esteja... A escola e o lar são as duas formidáveis ​​prisões do homem".

José Martí

 


        Nascido em Havana (Cuba) no dia 28 de janeiro do ano de 1853, José Julián Martí Pérez foi uma poeta, jornalista, filósofo e político. Ligado à maçonaria, Martí teve sua iniciação em 1871 no Grande Oriente Lusitano. Além disso, criou o PRC - Partido Revolucionário Cubano - e planejou a Guerra Necessária (Guerra de 1895). Conhecido em Cuba como "El apóstol", José Martí foi um dos pensadores de maior influência em seu país de origem, mas suas ideias transcenderam as fronteiras cubanas e se espalharam por diversas outras nações com ideologias parecidas com a de seu país.

        A mãe de José Martí nasceu nas Ilhas Canárias e seu pai na Espanha. Peça fundamental no processo de independência cubana contra os colonizadores espanhóis, "El apóstol" é considerado um mártir em Cuba. Além de sua atuação política, foi um pensador prolífico e também poeta. Desde jovem, demonstrava inquietude no que se refere aos assuntos cívicos e simpatizava com os ideais revolucionários que começavam a ser introduzidos em Cuba.

        Uma grande influência na vida de José Martí foi Rafael Maria de Mendive, a quem conheceu em Havana enquanto frequentava a escola secundária. Mendive era mestre de Martí, que seguiu suas ideias e começou a participar da política cubana escrevendo manifestos e organizando a distribuição de publicações que continham ideias separatistas no começo da Guerra dos Dez Anos. Uma baixa na vida de Martí ocorreu quando Mendive foi preso e deportado. Porém, este episódio apenas aumentou sua rebeldia e canalizou suas ações no intuito de deter a dominação da Espanha.

        Ainda jovem, em 1869, José Martí publicou um panfleto de cunho separatista chamado El Diablo Cojuelo e o periódico La Patria Libre. Ainda naquele ano, distribuiu o manifesto El Siboney, que produzia de forma manuscrita. Pela disseminação deste tipo de material, Martí foi para a prisão e acabou sendo alvo de processos do governo. Ele ficou preso por 6 meses, mas sua pena o levou a prestar serviços obrigatórios. Sua família conseguiu o indulto em 1871, trocando sua pena inicial pela deportação à Espanha, país em que Martí publicou El Presidio Politico em Cuba, sua primeira denúncia de grande relevância que mostrava a crueldade com que os presos eram tratados nas prisões de Cuba. A partir deste momento, tornou-se conhecido entre os intelectuais da época e obteve, no ano de 1874, doutorado no curso de Leis, Filosofia e Letras pela Universidade de Saragoça.

        Ao comandar um contingente pequeno de cubanos patriotas em 1895, deparou-se de forma inesperada com soldados espanhóis nas cercanias de Dos Ríos. No confronto, acabou sendo atingido e faleceu. Teve o corpo esquartejado pelos soldados da Espanha, que exibiram seu cadáver à população. Ainda naquele ano, foi sepultado em Santiago no dia 27 de maio.

Infoescola. Disponível em: https://www.infoescola.com/biografias/jose-marti/. Acesso em 14 de abr.2022.






POR QUE A OTAN E OS ESTADOS UNIDOS NUNCA FORAM SANCIONADOS POR INICIAREM GUERRAS?


        A reação ao ataque da Rússia à Ucrânia revelou os padrões duplos do Ocidente.

Robert Bridge

31/03/2022



       O Ocidente tomou uma posição extrema contra a Rússia por causa de sua invasão na Ucrânia. Essa reação expõe um alto grau de hipocrisia, considerando que as guerras lideradas pelos EUA no exterior nunca receberam a resposta punitiva que mereciam.

       Se os eventos atuais na Ucrânia provaram alguma coisa, é que os Estados Unidos e seus parceiros transatlânticos são capazes de atropelar um planeta em estado de choque – no Afeganistão, Iraque, Líbia e Síria, para citar alguns dos pontos críticos – com impunidade quase total. Enquanto isso, a Rússia e Vladimir Putin estão sendo retratados, em quase todos os principais meios midiáticos, como a segunda vinda da Alemanha nazista por suas ações na Ucrânia.

       Em primeiro lugar, é necessário ser claro sobre algo: a hipocrisia e os padrões duplos por si só não justificam a abertura das hostilidades por nenhum país. Por outras palavras, só porque os países do bloco da OTAN vêm abrindo caminho de destruição arbitrária em todo o mundo desde 2001 se sérias consequências, isso não dá a Rússia ou a qualquer país, licença moral para se comportar de maneira semelhante. Deve haver uma razão convincente para um país autorizar o uso da força, comprometendo-se assim com o que poderia ser considerada “uma guerra justa”. Assim a pergunta: as ações da Rússia hoje podem ser consideradas “justas” ou, no mínimo compreensíveis? Deixarei essa resposta para o melhor julgamento do leitor, mas seria útil considerar alguns pormenores importantes.

       Só para os consumidores de fast food das mídias convencionais seria uma surpresa que Moscou vem alertando sobre a expansão da OTAN há mais de uma década. No seu, agora famoso discurso, na Conferência de Segurança de Munique em 2007, Vladimir Putin perguntou, à queima roupa, de modo pungente aos poderosos globais: “por que é necessário colocar infraestrutura militar junto de nossas fronteiras durante essa expansão (da OTAN)? Alguém pode responder a esta pergunta?” Mais adiante no discurso, ele disse que a expansão dos ativos militares até a fronteira russa “não está relacionada de forma alguma com as escolhas democráticas de estados individuais”.


       Não só as preocupações do líder russo foram recebidas com a quantidade previsível de desrespeito no meio do som ensurdecedor dos grilos, como a OTAN concedeu adesão a mais quatro países desde aquele dia (Albânia, Croácia, Montenegro e Macedônia do Norte). Como experiência mental que até um idiota poderia realizar, imagine a reação de Washington se Moscou estivesse construindo um bloco em expansão contínua na América do Sul, por exemplo.

       A verdadeira causa do alarme de Moscou, no entanto, veio quando os EUA e a OTAN começaram a inundar a vizinha Ucrânia com uma deslumbrante variedade de armas refinadas em meio a pedidos de adesão ao bloco militar. Que diabos poderia dar errado?

       Na cabeça de Moscou, a Ucrânia começava a representar uma ameaça existencial para a Rússia.

    Em dezembro, Moscou, rapidamente chegando ao fim de sua paciência, entregou rascunhos de tratados aos EUA e à OTAN, exigindo que eles interrompessem qualquer expansão militar para o leste, inclusive pela adesão da Ucrânia ou de quaisquer outros estados.

Tradução: Confie em mim! Eu não estou apontando para você.
       Incluiu a declaração explícita de que a OTAN “não realizará nenhuma atividade militar no território da Ucrânia ou outros estados da Europa Oriental, Sul do Cáucaso e Ásia Central”. Mais uma vez, as propostas da Rússia foram recebidas com arrogância e indiferença pelos líderes ocidentais.

       Embora as pessoas tenham opiniões diferentes sobre as ações chocantes que Moscou tomou a seguir, ninguém pode dizer que não foi avisado. Afinal, não é como se a Rússia acordasse em 24 de fevereiro e de repente decidisse que era um dia maravilhoso para iniciar uma operação militar no território da Ucrânia.

       Então, sim, pode-se argumentar que a Rússia se preocupava com sua própria segurança como justificativa para as suas ações. Infelizmente, a mesma coisa pode ser mais difícil de dizer para os Estados Unidos e seus subordinados da OTAN em relação ao seu comportamento beligerante ao longo das últimas duas décadas.

       Considere-se o exemplo mais notório, a invasão do Iraque em 2003. Essa guerra desastrosa, que as mídias ocidentais classificaram como uma infeliz “falha de inteligência” representa um dos atos mais flagrantes de agressão não provocada da memória recente.

       Sem se aprofundar nos pormenores obscuros, os Estados Unidos, tendo acabado de sofrer os ataques de 11 de setembro, acusaram Saddam Hussein do Iraque de abrigar armas de destruição em massa. No entanto, ao invés de trabalhar em estreita cooperação com os inspetores de armas da ONU, que estavam no Iraque tentando verificar as alegações, os EUA, juntamente com o Reino Unido, Austrália e Polônia, em 19 de março de 2003 lançaram uma campanha de bombardeio “Choque e Pavor” contra o Iraque. Num piscar de olhos, mais de um milhão de iraquianos inocentes sofreram morte, ferimentos ou deslocamentos por esta flagrante violação do direito internacional.  

    O Center for Public Integrity informou que o governo Bush, em seu esforço para aumentar o apoio público à carnificina iminente, fez mais de 900 declarações falsas entre 2001 e 2003 sobre a suposta ameaça do Iraque aos EUA e seus aliados. No entanto, de alguma forma, as agências de mídias ocidentais, que se tornaram a voz raivosa da agressão militar, não conseguiram encontrar qualquer falha no argumento a favor da guerra, isto é, até depois de as botas e o sangue estarem no terreno, é claro. 

      Pode-se esperar, num mundo mais justo, que os EUA e seus aliados fossem submetidos a algumas duras sanções após esse “erro” prolongado de oito anos contra inocentes. Na verdade, houve sanções, mas não contra os Estados Unidos. Ironicamente, as únicas sanções que resultaram dessa louca aventura militar foram contra a França, um membro da OTAN que recusou o convite, juntamente com a Alemanha, para participar do banho de sangue iraquiano. A hiperpotência global não está acostumada a tal rejeição, especialmente de seus supostos amigos.

    Os políticos americanos, confiantes no seu divino excepcionalismo, exigiram um boicote ao vinho francês e à água mineral engarrafada devido à oposição “ingrata” do governo francês à guerra no Iraque.

       Outros agitadores da guerra traíram sua falta de seriedade ao insistir que o popular item de menu conhecido como “French Fries” (batatas fritas) fosse substituído pelo nome “Freedom Fries”. Assim, a falta do Bordeaux francês, juntamente com a tediosa reformulação dos menus dos restaurantes, parece terem sido os únicos inconvenientes reais que os EUA e a OTAN sofreram por destruir indiscriminadamente milhões de vidas.


       Compare essa abordagem de luva de pelica para com os EUA e seus aliados com a situação atual envolvendo a Ucrânia, onde a balança da justiça está claramente pesando contra a Rússia, - apesar dos seus avisos não irracionais de que se sentia ameaçada pelos avanços da OTAN.

      O que quer que uma pessoa possa pensar sobre o conflito que agora ocorre entre a Rússia e a Ucrânia, não se pode negar que a hipocrisia e os padrões duplos que estão sendo levantados contra a Rússia por seus detratores perenes são tão chocantes quanto previsíveis. A diferença hoje, porém, é que as bombas estão explodindo.

       Além das severas sanções a indivíduos russos e à economia russa, talvez melhor resumida pelo ministro da economia francês, que disse que seu país está comprometido em travar “uma guerra econômica e financeira total contra a Rússia”, houve um esforço profundamente perturbador para silenciar notícias e informações vindas das fontes russas que possam dar ao público ocidental a opção de examinar as motivações de Moscou. Em 1.º de março de 2022, o Youtube decidiu bloquear os canais da RT e do Sputnik para todos os utilizadores europeus, permitindo assim que o mundo ocidental se apoderasse de outro pedaço da narrativa global.

       Considerando a maneira como a Rússia foi vilipendiada no “império da mentira”, como Vladimir Putin denominou a terra dos seus perseguidores politicamente motivados, alguns podem acreditar que a Rússia merece as ameaças ininterruptas que agora recebe. Na realidade, nada poderia estar mais longe da verdade. Esse tipo de arrogância global, que se assemelha a algum tipo de campanha irracional de sinalização de virtude agora tão popular nas capitais liberais, além de inflamar desnecessariamente uma situação já volátil, assume que a Rússia está totalmente errada, ponto final.

       Uma abordagem tão imprudente, que não deixa espaço para debate, sem espaço para discussão, sem espaço para ver o lado da Rússia nesta situação extremamente complexa, apenas garante mais impasses, se não uma guerra global completa, mais adiante. A menos que o Ocidente esteja buscando ativamente a eclosão da Terceira Guerra Mundial, seria aconselhável parar com a hipocrisia hedionda e os padrões duplos contra a Rússia e ouvir pacientemente suas opiniões e versões dos eventos (mesmo as apresentadas pelos meios midiáticos estrangeiros). Não é tão inacreditável como algumas pessoas podem querer acreditar.

Robert Bridge – Escritor e jornalista estado-unidense, autor de Midnight in the American Empire: How Corporations and Their Political Servants are Destroying the American Dream (Meia Noite no Império Americano: Como as Corporações e os seus Serviçais Políticos estão a Destruir o Sonho Americano)@Robert_Bridge www.rt.com/news/550990-us-nato-sanctions-wars/ (Censurado na Europa).



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