A receptividade dos naturais de Cabo Verde tem sido tão grande, que cada dia, procuro estudar mais este povo irmão. E cada dia fico mais apaixonado. Tanto que vou colocar aqui uma linda lenda:
Rosa Alexandra
Fortes, natural da ilha de S. Antão, contou-me que sua avó “nha Zabel” lhe
narrara que “Mãe Joana” (bisavó de Rosinha) era parteira jurada de Sereias!
Foi chamada
muitas vezes, a prestar os seus serviços, por uma pessoa que vinha do mar com
aspecto de homem. Acompanhou-o sempre de boa vontade e sempre que chegavam à
beira de água o homem tirava uma vara da sua capa e com ela batia nas ondas e o
mar abria-se mostrando uma bela estrada seca e segura! Então o homem
desaparecia e só a sua voz se ouvia guiando os passos de “Mãe Joana”, até ao
Palácio onde se encontrava a Sereia parturiente.
Tudo era
maravilhoso, jardins com plantas desconhecidas bordavam a estrada e rodeavam o
palácio! Luzes de todas as cores iluminavam-no por fora e por dentro!
No quarto da Sereia, ouviam-se muitas vozes mas não se via
ninguém e a parteira só via a parte do corpo em que tinha que trabalhar, por
vezes uma perna, um braço, a barriga, alguns cabelos de outro, mas nunca a
forma completa! Depois do bebé-sereia ter nascido, ofereciam a “Mãe Joana” um
autêntico banquete, uma mesa com tudo o que havia de melhor, comidas raras e
saborosas, tudo isto acompanhado de risos e cantos, mas sem que ela conseguisse
ver alguém! De novo na presença da Sereia e do seu bebé, aquela oferecia-lhe
algumas pedrinhas do mar como recompensa, com a recomendação de, assim que
chegasse a casa, as guardar no canto da mala.
Vinham então trazê-la até à
praia pela mesma estrada, no meio do mar, e o homem aparecia só para se
despedir, agradecer-lhe a boa vontade e dar-lhe as ditas pedras. Logo despois
desaparecia e o mar fechava-se!
A mulher, assim que chegou
a casa, fez aquilo que sempre fazia, deitou fora as pedrinhas para o quintal,
nunca respeitando as recomendações da Sereia e ficando assim mais pobre mas de
coração contente por ter cumprido o seu dever humanitário.
Aqui termina a história da
Rosinha.
Mas !nha! Amélia que me
contara uma outra história e que também sabe esta, disse-me que a parteira, um
dia, por desfastio, trouxe duas das tais pedrinhas do mar que a Sereia lhe
ofertara, para casa e deitou-as no canto do quarto. No dia seguinte, as pedras
tinham-se transformado em duas bolas de ouro! A reacção de “Mãe Joana” foi de
alegria mas também de arrependimento por ter desperdiçado todas as outras
ofertas e não ter acreditado na palavra da amiga Sereia. Ainda correu à
beira-mar gritando pelos “encantados” para pedir perdão e também algumas
pedrinhas do mar. mas ninguém lhe respondeu e, pior ainda, nunca mais a
chamaram para ir ao fundo do mar ajudar bebés-sereias a nascer”.
Lenda (adaptada)
(do livro HISTÓRIAS DE
LONGE E DE PERTO, Sec. Coordenador dos Programas de Educação Multicultural,
Lisboa, 1997).
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