Bárbara Tuchman é a historiadora
de maior sucesso nos Estados Unidos, duas vezes agraciada com o Prêmio
Pulitzer. Em seus textos e palestras, apresenta-nos lições sobre sua arte.
Vamos compilá-las, com propósito didático. Divulgar a arte de escrever é um
dever do ofício de professor e orientador.
Escrever história de modo a
encantar o leitor e a tornar um assunto tão cativante e emocionante para ele
quanto para ela tem sido seu objetivo, desde o fracasso inicial com sua tese.
Foi classificada como dotada de um “estilo medíocre”. Comentário dela sobre a
tese: “tão bela – na intenção – e tão mal escrita”... o entusiasmo não tinha
sido suficiente; era preciso saber também usar a língua.
Visão, conhecimento e experiência não fazem um grande escritor, só com o domínio da língua que se tornará a voz dessas virtudes.
Visão, conhecimento e experiência não fazem um grande escritor, só com o domínio da língua que se tornará a voz dessas virtudes.
Antes de mais nada, a paixão
pelo assunto é indispensável para se escrever bem. Mas não basta. Bárbara
descobriu que se aprende a escrever, escrevendo. Descobriu que um elemento
essencial para se escrever bem é um bom ouvido. Devemos ouvir o som de nossa
prosa. Em sua opinião, as palavras curtas são sempre preferíveis às longas.
Quanto menos sílabas, melhor! Os monossílabos... são os melhores de todos!
As palavras têm um poder
autônomo, quase atemorizador, de produzir na mente do leitor uma imagem ou
ideia que não estava na intenção do autor. O uso descuidado das palavras pode
deixar uma falsa impressão que não se pretendia.
Para Bárbara, o problema está no
fato de que a arte de escrever lhe interessa tanto quanto a arte da História.
Tuchman vê a História como arte, não como ciência.
Quando escreve, é seduzida pelo som das palavras e pela interação de som e sentido. As palavras constituem material sedutor e perigoso, a ser usado com cautela.
Tuchman vê a História como arte, não como ciência.
Quando escreve, é seduzida pelo som das palavras e pela interação de som e sentido. As palavras constituem material sedutor e perigoso, a ser usado com cautela.
Pergunta-se: – “Sou, em primeiro
lugar, escritora ou historiadora?” Ela mesma responde: – “As duas funções não
precisam estar, e de fato não devem estar, em guerra. A meta é a fusão".
"Em longo prazo, o melhor escritor é o melhor historiador”.
"Em longo prazo, o melhor escritor é o melhor historiador”.
A História é vista como
literatura, em oposição à História como ciência. Sua exposição deve ser feita
em todo o seu valor emocional e intelectual, a um amplo público, através da difícil
arte da literatura. Note-se: “amplo público”! a ênfase deve sempre ser dada à
escrita para o leitor comum, em contraposição à escrita apenas para os colegas
eruditos. Quando escrevemos para um público amplo, temos de ser claros e
interessantes. Esses são os critérios que determinam um bom texto.
O leitor é a pessoa que deve se
ter sempre presente. Escrevamos nossos textos com um cartaz pregado acima de
nossa mesa, perguntando: “Irá o leitor virar a página?”
O objetivo do autor é – ou
deveria ser – manter a atenção do leitor. Querer que o leitor vire a página e
continue a fazê-lo até o fim. Isso só acontece quando a narrativa avança com
firmeza, e não quando entra num impasse, sobrecarregada de todos os detalhes
descobertos na pesquisa, significativos ou não. Contra o texto tipo “rol de
roupa”, o lema: “a exclusão de tudo que é redundante e de nada do que é
significativo”!
O leitor é a outra metade
essencial do autor. Entre eles há uma ligação indissolúvel. São necessários
dois para cumprir a função da palavra escrita. Os escritos não nascem não têm
vida independente, enquanto não são lidos. Logo, primeiro é preciso prender o
leitor.
Bárbara é, em primeiro lugar,
uma escritora, cujo assunto é a história, e cujo objetivo é a comunicação. Tem
sempre presente o leitor como um ouvinte cuja atenção deve ser mantida, para
que não se vá embora.
Quem escreve tem várias
obrigações com o leitor, se quiser conservá-lo. A primeira é destilar. Deve
fazer o trabalho preliminar para o leitor: reunir as informações dar-lhes
sentido, selecionar o essencial, rejeitar o irrelevante – sobretudo rejeitar o
irrelevante – e colocar o restante de modo a formar uma narrativa dramática que
se desenvolve de modo a capturá-lo. Oferecer uma massa de fatos não digeridos é
inútil para o leitor. Constitui simples preguiça do autor ou pedantismo para
mostrar o quanto leu.
O produto final é resultado
daquilo que se escolheu para incluir, bem como daquilo que preferiu deixar de
lado. Colocar tudo, simplesmente, é fácil – e seguro – e resulta numa dessas
obras de 900 páginas, nas quais o autor abdicou e deixou a leitor todo o
trabalho.
Para eliminar o desnecessário, é
preciso coragem e também mais trabalho. Pascal terminou uma carta de 4 páginas
a um amigo dizendo: “desculpe-me tê-lo cansado com uma carta tão longa, mas não
tinha tempo para escrever-lhe uma carta breve”.
O leigo em geral subestima a
escrita e se impressiona demais com a pesquisa, como se essa fosse a parte
difícil. Não é.
Escrever, como um processo criativo, é muito mais difícil e leva duas vezes mais tempo.
Escrever, como um processo criativo, é muito mais difícil e leva duas vezes mais tempo.
O mais importante na pesquisa é
saber quando parar. Devemos parar antes de ter acabado. Sem isso, nunca paramos
e nunca acabamos.
Como copiar é um trabalho e um
aborrecimento, o uso de cartões – quanto menores, melhor –, para anotações,
força-nos a extrair o que é rigorosamente relevante, a destilar desde o começo.
A seleção é que determina o produto final. Por isso, é melhor usar apenas material das fontes primárias. As fontes secundárias são úteis, mas perniciosas. Use-as como guias no início de um projeto. Mas não acabe simplesmente reescrevendo o livro de algum outro autor. Além disso, os fatos apresentados por uma fonte secundária já sofreram uma seleção prévia, de modo que, ao usá-los, perdemos a oportunidade de fazer nossa própria seleção.
A seleção é que determina o produto final. Por isso, é melhor usar apenas material das fontes primárias. As fontes secundárias são úteis, mas perniciosas. Use-as como guias no início de um projeto. Mas não acabe simplesmente reescrevendo o livro de algum outro autor. Além disso, os fatos apresentados por uma fonte secundária já sofreram uma seleção prévia, de modo que, ao usá-los, perdemos a oportunidade de fazer nossa própria seleção.
A tarefa de reescrever o que já
é conhecido não encerra atrativos para Bárbara. Não sente estímulo para
escrever a menos que esteja aprendendo alguma coisa nova e contando ao leitor
algo de novo, no conteúdo ou na forma.
A arte de escrever – a prova do
artista – é resistir à atração de desvios fascinantes e apegar-se ao seu
assunto. São necessárias, simplesmente, coragem e confiança para fazer escolhas
e, acima de tudo, para deixar certas coisas de lado. O melhor quadro é aquele
que mostra as partes da verdade que melhor produzem o efeito do todo.
Outro princípio, sugerido por
Bárbara: não discutir as evidências, as fontes, as teorias, em frente ao
leitor. Os processos de raciocínio do autor não cabem numa narrativa. Devemos
resolver nossas dúvidas, examinar as provas conflitantes, determinar os motivos
atrás das cortinas e discutir nossas fontes nas notas de referências, e não no
texto.
Entre outras coisas, isso mantém o autor invisível, e quanto menos a sua presença for sentida, maior é a sensação de proximidade que o leitor tem com os acontecimentos.
Entre outras coisas, isso mantém o autor invisível, e quanto menos a sua presença for sentida, maior é a sensação de proximidade que o leitor tem com os acontecimentos.
Não esqueçamos do aforismo: “ser
academicista é acreditar que acúmulo é aprofundamento e que chatice é
precisão”.
Ler, como escrever, é o maior
dom com que o homem se dotou, por meio do qual podemos realizar viagens
ilimitadas. Ler possui uma sedução interminável. Escrever, pelo contrário, é um
trabalho pesado. É preciso sentar-se numa cadeira, pensar e transformar o
pensamento em frases legíveis, atraentes, interessantes, que tenham sentido e
que façam o leitor prosseguir. É trabalhoso, lento, por vezes penoso, por vezes
uma agonia. Significa reorganizar, rever, acrescentar, cortar, reescrever. Mas
provoca uma animação, quase um êxtase, um momento no Olimpo! Em suma, é um ato
de criação!
(A formatação e os negritos são deste Blog do Maffei)
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Professor Fernando Nogueira da Costa (UNICAMP/FAPESP)
Se quiser beber direto da fonte acesse:
CIDADANIA & CULTURA
Blog do Fernando Nogueira da Costa
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